249- LUIZ ROGÉRIO DE SOUZA
LUIZ ROGÉRIO DE SOUZA
*
Nasceu em Salvador, Bahia, em 8 de agosto de 1906, sendo seus pais Augusto Celestino de Souza e Adelaide Bloxhan de Souza.
Cursou o Primário no Colégio Marista em Esplanada, Bahia e o Secundário no Colégio Nossa Senhora da Vitória, dos Irmãos Maristas, em Salvador.
Ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia no ano de 1922, diplomando-se em Medicina em 1927.
Seus colegas de turma tornaram-se médicos notáveis, muitos deles Professores Catedráticos da velha Faculdade do Terreiro de Jesus.
Foi médico da Secretaria de Saúde Pública, em Salvador, Alagoinhas e Serrinha. Redator-chefe do Seminário “A Notícia”, secretário Municipal de Educação e Saúde da Bahia (1959-1964), diretor do Departamento Social de Vida Universitária da Universidade Federal da Bahia (1961-1965), diretor do Serviço Médico da mesma universidade (1962), presidente do Movimento Brasileiro de Alfabetização-MOBRAL, coordenador da Campanha Nacional de Educação Rural, presidente da Campanha Nacional das Escolas da Comunidade-CNEC (1956-1975), professor da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública e da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, Presidente da Associação Baiana de Medicina (1953-1954), Membro do Conselho do Instituto de Pesquisa e Treinamento de Artesanato e do Conselho Regional de Medicina da Bahia, Presidente da Associação dos Municípios da Bahia (1952-1953) e Presidente do Conselho Estadual de Educação da Bahia (1968-1971).
Foi Vereador do município da Barra, Bahia (1932-1936), Deputado Estadual Constituinte (1947-1951), suplente de deputado estadual (1951-1955).
Foi 1º Secretário da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa (1950), titular das Comissões de Administração Municipal (1947-1949), Finança, Orçamento e Contas (1947-1949), Indústria e Comércio (19470, Constituição e Justiça (1948).
Títulos e Condecorações: Educador Emérito da Bahia, Cidadão Honorário dos municípios de Esplanada e Barra., Medalha de Prata do Mérito Educacional do Governo da Bahia, etc.
Faleceu em 1º de agosto de 1981.
FONTE BIBLIOGRÁFICA:
Luiz Rogério de Souza, Dados Pessoais. Disponível em http://www.alba.ba.gov.br/biografia. cfm?var Codigo=494. Acesso em 1º de outubro de 2010.
APÊNDICE I
DEPOIMENTO DE EDIVALDO MACHADO BOAVENTEURA
(Boaventura,Edivaldo Machado- Papéis e Personalidades de Baianos. Resumo- Coleção Caminhos Brasileiros, n. 7 –Bahia, 1985)
EDIVALDO MACHADO BOAVENTURA
*
“UM MÉDICO QUE FEZ O SERTÃO
José Silveira, seu colega de Faculdade, em artigo para A Tarde, em 8 de agosto de 1981, depõe sobre o estudante de medicina:
“Conheci-o, nos bancos acadêmicos, com feitio ainda de simples colegial: pequenino, pobre, de origem modesta, não aparecia, entretanto, como um calouro, humilde e tímido, um manso cordeiro. Vivo, atilado, senhor de si mesmo, ao contrário, não se deixava levar pelas aparências. Sua independência intelectual – que o acompanharia até a morte – não lhe permitia aceitar conceitos ão lhe permitia aceitar conceitos e doutrinas que lhe pareciam errôneas: expostas que fossem por mestres consagrados. Submetia-os todos ao crivo severo do seu aguçado e precoce senso crítico, para anular o erro ou descobrir o correto. Foi, assim, que, por várias vezes, desde então identificados e irmanados, peregrinamos pelas bibliotecas e arquivos, na ânsia incontida de novas e seguras verdades”.
Começa Luiz Rogério o curso médico sem possuir livros e amigos, mas inteligente e operoso, logo inicia o trabalho no Hospital de Isolamento, sob as ordens de Couto Maia. Anos depois, por ocasião do centenário, faz uma bela conferência no Conselho Estadual de Cultura, onde retrata a vida do conceituado higienista. O estágio com Couto Maia é decisivo para a sua opção de médico da saúde pública, como també, os contatos com Barros Barreto, tudo perfeitamente de acordo com a política de saúde do Governo Góes Calmon. Completa o curso médico na famosa turma de 1927, com Thales de Azevedo, Hosanah de Oliveira, José Silveira e outros. Cursos, professores e vivências estão relatados em outro livro de memórias, Vela Acesa,, do mestre Silveira, um verdadeiro depoimento sobre o ensino superior na década de vinte.
Gradua-se in absentia e enfrenta o sertão, começando por Serrinha. Tenta a clínica em encruzilhada, onde o trabalho era rendoso, mas a vida tremendamente monótona. Quarenta anos depois volta àquela cidade, nas aventuras cenecistas. Indagado das saudades que teria curtido, responde que de Encruzilhada “!eu não tinha saudade, pois ali não tivera nenhum amor”:
Eis uma grande verdade,
que aprendi desde criança:
Só o amor deixa saudade
Tudo o mas deixa lembrança...
LA FORCE DE CHOSE
Qualquer coisa de forte, de impulsivo, o impele e o atrai para o sertão, mais precisamente, para são Francisco.
Segue para o Velho Chico com a missão de combater a malária, segundo convênio entre o Estado e os municípios. Instala-se na Barra e inicia, no consultório e no Posto de Saúde, o exercício profissional. Recebe como companheiro de trabalho o jovem e desventuroso Renato Medrado. Rogério cobre de cuidados a estada desse aliancista em Carinhanha e conta como se deu a sua morte:
“Ao romper do dia, todos retomam a viagem, salvo os dois presos (Renato Medrado e um mineiro caixeiro-viajante, Moacir Leão) que ficaram com um sargento e quatro ou cinco soldados. Em vez de embarcarem na canoa, que jaz encostada, vão-se internando na caatinga. Renato percebeu todo o sentido da manobra:
-- Para onde estão nos levando, Sargento?
E avança sobre o fuzil de um dos soldados,
Cai, ali mesmo, fuzilado”.
Os depoimentos de Luiz Rogério irão servir, sobretuto, para se perceber as conseqüências e repercussões da Aliança Liberal e da Revolução de 30 no interior sanfranciscano. Ele é, a um só tempo, participante e testemunha, principalmente quando observa a falta de entrosamento entre os dois grupos revolucionários – “o nordestino e o mineiro – não tinham qualquer coordenação militar, nem mesmo sabiam da existência um do outro”. A vinculação com o jovem Luiz Viana Filho começa em 1932, quando o atual senador se apresenta como candidato avulso à Assembléia Nacional Constituinte. Luiz Rogério, premido pelas questões da política municipal, alinha-se às forças que se opõem à política da interventoria Juracy Magalhães.
COISAS DA MEDICINA
No contexto político, social e profissional, pratica Luiz Rogério a medicina. Para um bom aluno como ele fora, longe dos mestres e dos recursos da capital, a arte médica foi, antes de tudo, uma adaptação do que aprendera e do que vai criando. Dois ou três casos dão a medida do seu trabalho. O velho Agenor é uma ilustração, com noventa e dois anos, sofria de insuficiência cardíaca. O medicamento mais indicado era a digital, segundo a lei imposta pelo grande Huchard, “nem muito, nem muito pouco, nem durante muito tempo, nem muitas vezes”. A regra era uma cura em cinco dias. Depois de três meses, é de novo chamado para ver o cliente idoso e é informado que, durante todo esse tempo, o doente não deixara de tomar o remédio. Tendo melhorado com as capsulas, mal terminava uma dose, encomendava outra. Contrariava toda sabedoria – pas très longtemps – o medicamento continuava sendo tomado sem nenhum contratempo, o qual, naquele momento, só ocorreu a suspensão do seu uso. Diante da evidência empírica, Luiz Rogério manda repetir a medicação que tão bons resultados dera.
Outro caso reportado que fornece a medica da capacidade de adaptação de conhecimento foi com o rapaz de Burititama:
“Trabalhando na moenda de rapadura, a rede pegara-lhe o braço esquerdo, provocando uma fratura exposta, com larga destruição de tecidos. O pai, o ferreiro Atanásio, o trouxera, montados em jumentos pelas 20 léguas que separam Buritirama da Barra. Não sei se foram quatro ou cinco dias de viagem, mas o braço era um “mar de supuração”... O úmero estava fraturado no terço inferior, as “carnes” esfaceladas, só otríceps mantinha-se íntegro. Fui franco com o pai do rapaz:
-- A solução correta, neste caso, seria a desarticulação do ombro. É uma operação que exige um cirurgião especializado, local e adequado material. Para tentar, eu vejo duas grandes dificuldades: primeiro, não restou, no ombro, pele que permita recobrir o coto depois de desarticulado; segundo, qualquer trabalho cirúrgico vai abrir os vasos e este pus vai provocar um septicemia”.
Em pleno sertão, qual a solução dada pelo Dr. Luiz Rogério?
“Mandei vir uma “tala” da carnaubeira, que usei como goteira para acomodar o braço do paciente; fiz preparar, em abundância, uma solução de aniodol externo e, com uma seringa de borracha, irrigava a ferida para retirar o pus; o líquido purulento escoava pela goteira, de onde outra seringa o aspirava para ser respejado. Era um trabalho de paciência, que eu repetia pela manhã e à tarde; depois de bem limpa a ferida, era untada com pomada de Reclus (iodofórmio) e, por fim, coberta com gaze, pois não havia possibilidade de um penso convencional”.
Era um trabalho de paciência, sim, mas também de criatividade. Conclui Luiz Rogério, tendo notícia depois que o rapaz salvou o braço – “Se eu fosse cirurgião, teria tirado o braço do rapaz... Foi uma sorte não o ser”
CABO ELEITORAL
Se inúmeros são os casos médicos, outros tantos são os políticos. Exemplo típico são as peripécias que enfrentou para o alistamento das senhoras que costumavam sair às ruas apenas para os acontecimentos religiosos ou sociais e bem assim a dificuldade que criavam em declarar a idade. E como superar tais vexatórios problemas? Luiz Rogério doutrina que o código eleitoral não distingue homem de mulher. Mas as mulheres reagiam alegando que eleição era negócio para homem, mulher era para cuidar da casa. Ele contra-argumenta: “Se a questão é não declarar a sua idade, fique tranqüila, porque eu já tirei a certidão do registro, que está aqui...” A adesão era pronta: “Esse Doutor Rogério tem cada uma... Dê cá o papel, para eu fazer a petição”.
Às voltas com os recursos pós-eleitorais, observa: “Uma eleição é quase como uma novela de TV. Quando a gente pensa que está terminando é que surgem os grandes episódios”.
Caso de necessidade de valorização pessoal era o daquele eleitor que queria ser importante. Em noite de eleição sai Luiz Rogério para um bordejo a ver como iam as coisas. Encontra um eleitor recostado na calçada a cochilar, não tendo ainda votado. Pergunta-lhe se precisava de alguma ajuda e por que não tinha pressa em votar, preferindo deixar para tão tarde. A resposta foi psicológica:
“Enquanto eu não votar, toda gente passa por mim e procura saber de minha vida, qual é a minha seção, se já voltei, se quero votar. Mas depois que eu votar, ninguém mais me conhece. Passam por mim e não me ligam. Já viu por que é Doutor? Enquanto eu não votar, sou uma pessoa importante”
Assim a vida de Luiz Rogério é plena de participação, na profissão, na políítica e, depois, no ensino:
“Eu tinha uma vida cheia. Eram doentes, sem mãos a medir, no consultório, das sete às dez, e a seguir em domicílio; eram os trabalhos na Câmara Municipal; era o jornalzinho, com suas exigências, inclusive de tipografia; era o alistamento eleitoral; era a supervisão da farmácia”.
Os anos de vida no sertão são quase uma epopéia e gosta de contar prazerosamente as suas estórias. Thales de Azevedo, ao prefaciar as memórias, comenta:
“Em suas estórias – que serão preciosos capítulos da nossa história, em particular do exercício da medicina no sertão e da militância política – Rogério aparece, sem se mostrar ou exibir, como um caráter, não apenas um homem de caráter reto, honesto, íntegro, porém, uma personalidade sob muitos aspectos marcante”.
ENTRE A MEDICINA E A POLÍTICA
Depois de dez anos na Barra, retorna a Salvador e retoma a “estrada perdida”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário