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By Ferramentas Blog

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

278- OTTO EDWARD HENRY WUCHERER (CRIADOR DA HELMINTOLOGIA BRASILEIRA)

OTTO EDWARD HENRY WUCHERER
(O CRIADOR DA HELMINTOLOGIA
BRASILEIRA)
OTTO WUCHERER
*
Nasceu na cidade do Porto, em 7 de julho de 1820, sendo seu pai alemão e sua mãe brasileira.
Na capital baiana passou parte de sua infância. Ao completar 7 anos de idade, foi enviado para um colégio na  Alemanha, onde permaneceu até os completar 15 anos. Com a morte de seu pai, cessaram os recursos  para a manutenção do jovem estudante.
Otto Wucherer , empregou-se como praticante de farmácia e conseguiu  seu ingresso na Universidade de Tubingem, onde recebeu o grau de doutor em Medicina.
Estagiou em Londres e foi eleito membro da Sociedade de Cirurgiões da capital inglesa.
Assim preparado, regressou para Lisboa, onde, desde a morte do seu pai,  vivia sua família.
Logo depois, mudou-se  para a  Bahia, onde iniciou o exercício da medicina. Clinicou, inicialmente, em Nazareth, depois em Cachoeira.
A partir de 1847, fixou residência em Salvador, onde, ao longo de vinte e seis anos, foi um médico dedicado e um cientista de renome.
Simples e amável, extremamente culto e versado em diversas línguas, tornou-se, com o decorrer do tempo, uma personalidade  estimada pela sociedade local.
“Não obstante o excessivo trabalho duma extensa clientela, o Dr. Wucherer passava todos os dias algumas horas em seu gabinete, exclusivamente entregue ao estudo, procurando, principalmente com o microscópio que ele manejava com perícia, resolver alguns dos problemas da nossa nosologia, sobre os quais ele ia de dia em dia acumulando os fatos que deveriam servir de base a suas investigações” (Gazeta).
Contribuiu, de maneira extraordinária, para a elucidação da etiologia e da patogenia de várias doenças regionais, principalmente da  ancilostomose e da  filariose  de Bancroft.
Em sua homenagem, foi criado o gênio Wuchereria. Daí o nome Wuchereria bancrofti.
Trabalhou denodadamente para debelar as epidemias de cólera e de febre amarela que assolam a Bahia.
Foi um dos fundadores da “Gazeta Médica da Bahia” primeiro periódico médico do Brasil.
Com Paterson e Silva Lima constituiu a  “Escola Tropicalista da Bahia”.
Dedicou-se às ciências naturais, descrevendo novas espécies zoológicas, especialmente serpentes (E.scalaris, G. guntheri, etc.).
Publicou numerosos trabalhos e ofereceu à Faculdade de Medicina da Bahia uma coleção de ofídios, cuidadosamente preparados e classificados.
Em 1871, partiu para a Alemanha. Permaneceu algum tempo em Stuttgart e Tubingen, regressando à Bahia em janeiro de 1873.
Faleceu quatro anos depois, em 7 de maio de 1973.
“Depois de passar uma noite de vigília e incessantes cuidados à cabeceira dum enfermo, o Dr. Wucherer foi chamado para prestar auxílio a uma parturiente. O parto começava apenas, dava-lhe o tempo necessário para ir à casa, reparar-se um pouco das fadigas duma noite inteira de vigília e de assíduos esforços. O médico solícito não queria faltar com seus cuidados a est´outra paciente que os reclamava, e mal chegou à casa, procurou estimular as forças prostradas com um banho frio.
Fatal imprudência ! ali mesmo foi atacado duma apoplexia que em 24 horas reduziu-o a cadáver !” (Ibidem).



FONTES BIBLIOGRÁFICAS:
1.       Casa de Oswaldo Cruz – Otto Wucherer. Disponível em http//mvida.re
defiocruz.fiocruz.br/publique/cgi/cgilna.exe/sys/start.htm?sid=38&infoi. Acesso em 23 de novembro de 2009.
2.       Coni, Antônio Caldas – A Escola Tropicalista Bahiana. Salvador, 1952.
3.       Pacífico Pereira – Esboço biográfico do Dr. Otto Wucherer . Gazeta Mé dica da Bahia, Ano VI,n. 140. Salvador, 31 de maio de 1873.
4.       Silva Lima, J.F. da – Traços biográficos do dr. Otto Wucherer. Bahia, 1905.
5.       Torres, Otávio – Esboço histórico dos acontecimentos mais   importantes da vida da Faculdade de Medicina da Bahia. Salvador, 1905.

APÊNDICE I
UM ENFERMEIRO IMPROVIDADO
SILVA MELO, JOSÉ FRANCISCO DA – Gazeta Médica da
 Bahia,novembro
*
“Durante a epidemia de cólera, o Dr. Wucherer teve na sua própria casa, em um cômodo pouco espaçoso, uma pequena enfermaria para mar inheiros afetados da moléstia, e como morressem quase todos, sinão todos, e ainda a sua primeira esposa, resolveu não receber mais doente algum e ir tratá-los a bordo dos navios. Mas, a instâncias da colônia alemão, accedeu abrir, em melhores condições e comodidades, uma nova E, a propósito, deu-se um incidente um tanto cômico que Wucherer me contou com aquela graça que lhe era habitual. Desejando ter um enfermeiro que falasse alemão, lembrou-se de um velho patrício, taverneiro desocupado, chamado Addler. No primeiro dia em que o novo enfermeiro entrou de serviço, Wucherer convidou-o a tomar com toda a atenção, por escrito as notas do dia, que constaram de óleo de rícino a uns, sudoríferos e água sedativa de Raspall a outros, sinapismo a estes, mistura salina simples aqueles, etc. No dia seguinte ficou Wucherer surpreendido de ver que o bom enfermeiro tinha aplicado tudo aquilo a todos e a cada um deles ! Censurado por isso, o velho Addler respondeu ingenuamente que, sendo a moléstia a mesma em todos, entendeu que para todos deveriam também ser os remedos... Wucherer não esteve pela lógica mássica do seu auxiliar, e substituiu-o por outro menos lógico e mais atento”
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APÊNDICE II
 AS COBRAS DE WUCHERER
 (SILVA LIMA, JOSÉ FRANCISCO DA - Gazeta Médica da Bahia,
 novembro de 1905)
*
“Sobre os nossos ofídios venenosos Wucherer publicou na Gazeta Médica da Bahia de 1866 interessantes artigos, sendo um acompanhado de gravuras. Forneceu ao Museu Britânico e ao Soological Gardens, de Londres algumas espécies da fauna brasileira, e sobre estes assuntos correspondia-se com diversos naturalistas ingleses, alemães e norte-americanos. Durante estes estudos pôde colecionar grande número de cobras, que, depois de bem preparadas e classificadas, ofereceu à Faculdade de Medicina da Bahia. Tinha quase sempre cobras em casa à espera do destino que lhes pretendia dar; e a este propósito contou-me o seguinte caso interessante, que, aliás, não é único; depois disso já vi narrados em jornais dois casos semelhantes. Guardara ele em uma gaiola duas cobras pequenas, sendo uma de estimação pela raridade, e outra indiferente. Dava-lhes ratinhos para alimento de tempos em tempos. Uma vez não dispondo sinão de um destes minúsculos roedores, introduziu-o na gaiola. Cada uma das cobras abocou-o por uma das extremidades e foram-no engulindo lentamente até se encontrarem, sucedendo que a cobra de estimação, mais pequena do que a outra, ia já sendo em parte engolida com rato e tudo; querendo salvá-la, Wucherer não teve outro recurso sinão agarrar com uma longa pinça, a certa distância da cabeça, a cobra deglutante e cortá-la de modo que não corresse o risco de dividir as duas com o mesmo golpe. O resultado da operação foi a deglutida sair triunfante do tronco cefálico da sua competidora”.

APÊNDICE III
“A ESCOLA TROPICALISTA BAIANA: UM MITO DE ORIGEM DA MEDICINA TROPICAL NO BRASIL”
(EDLER, F. C.: A Escola Tropicalista Baiana: um mito de origem da medicina Tropical no Brasil'.História, Ciências, Saúde — Manguinhos, Rio de Janeiro, vol. 9(2):357-85, maio-ago. 2002.)
SALVADOR, BAHIA - INÍCIO DO SÉCULO XX
*
“Vejamos com mais atenção o importante estudo de Julyan Peard (1990), que, partindo de um questionamento semelhante ao nosso sobre a periodização clássica, emite opiniões e conclusões que, em parte, contrariam nosso ponto de vista. A opção de apresentar detalhadamente os principais argumentos de Peard deve-se ao fato de ser o seu o mais completo e exaustivo estudo histórico a respeito dos médicos que se organizaram em torno da Gazeta Médica da Bahia, núcleo original das pesquisas em helmintologia médica. Neste artigo nos restringiremos a abordar sua tese central que sintetiza e atualiza a visão da historiografia já referida. Deixaremos de comentar outros aspectos extremamente inovadores de seu estudo, como as relações da medicina acadêmica com as mulheres, com as redes clientelistas e filantrópicas e com questões raciais.
O primeiro ponto a ser ressaltado se refere à sua desconfiança diante da imagem amplamente aceita pela historiografia, que apresenta os médicos brasileiros daquela época como reprodutores passivos da medicina européia e lentos em abraçar os modelos médicos que se encontravam no front da ciência. Tal imagem, argumenta a autora, teria sido sedimentada ainda nas primeiras décadas do século XX, quando se procurou criteriosamente "esconder os episódios precedentes", voltados para a construção de tradições médicas locais. Seu trabalho teve por objetivo desvelar uma história deliberadamente encoberta pela geração de Oswaldo Cruz, revendo a interpretação, promulgada por esse grupo, de que o período anterior pertenceria à "idade das trevas" da medicina (Peard, 19970). Outro  mérito  inegável  de  seu  trabalho  é  o    de  inverter  o  sentido  do  caminho  geralmente  trilhado pelos  historiadores  que  analisam  a   constituição   da medicina  tropical  a  partir  do  ponto  de  vista europeu. Ao  focalizar  os interesses  dos  médicos   que   viviam   num  país  tropical,  o problema da gênese dessa disciplina tornou-se mais complexo e ambíguo.
Para comprovar suas hipóteses, Julian Peard desenvolve um estudo aprofundado sobre um grupo de médicos baianos que, na segunda metade do século XIX, "inicialmente fora do ambiente institucional", ajudou a disseminar "novas idéias sobre saúde e doença no Brasil". A Escola Tropicalista Baiana, como tal grupo ficou conhecido, notabilizou-se por seus trabalhos sobre beribéri, ancilostomíase, filariose e ainhum — doenças associadas ao clima tropical. Peard postula ainda que, em contraste com as idéias de medicina tropical desenvolvidas pelas potências coloniais européias, os tropicalistas teriam forjado sua própria definição de medicina tropical, baseados na crença otimista sobre a possibilidade de se construir um lugar para o Brasil ao lado das nações civilizadas, apesar de seu clima e do povo miscigenado. Desse modo, ela privilegia dois ângulos de análise. Primeiramente, o processo de constituição da base institucional, isto é, a trajetória que conduziu esse grupo da posição inicial de outsiders, críticos ao ambiente médico baiano, até sua total assimilação pela comunidade médica. Em seguida, num patamar mais próximo da história cultural, ela examina como as idéias médicas européias de cunho raciológico e climatológico foram adaptadas ao contexto social do império brasileiro.
Esticando seu argumento, ela assinala que a recusa do estereótipo dos trópicos como região deletéria para o europeu, "bastante disseminada desde o século XVIII", conduziu à produção de um conhecimento original por parte desses médicos organizados em torno da Gazeta Médica da Bahia, em bases não formalmente institucionalizadas, bem antes do advento dos institutos de medicina tropical. Teorias raciais, como o poligenismo, bastante vulgarizado nos Estados Unidos, foram rejeitadas por uma sociedade miscigenada, em que muitos médicos eram mulatos ou negros (Peard, 1990). Por outro lado, "ainda que não declaradamente lamarckistas", os médicos da Bahia valorizavam a maleabilidade e adaptabilidade dos seres humanos, em contraposição ao determinismo climático amplo. "Esta concepção da natureza humana possibilitava que os tropicalistas desenvolvessem um modelo etiológico flexível que punha ênfase no papel dos médicos na preservação e recuperação da saúde de seus pacientes." Em contraste com as conclusões anteriores de Goodyear (1982), Peard demonstra inequivocamente que a etiologia ambientalista não conduzia necessariamente a um determinismo pessimista sobre o clima tropical por parte daqueles médicos brasileiros. Ao investigar as doenças típicas do meio tropical, os tropicalistas da Bahia utilizaram os mais avançados instrumentos da medicina européia, tal como a "estatística médica, os novos métodos clínicos baseados na medição e na fisiologia aplicada, o uso da química na análise das partes fluidas do corpo, particularmente no campo da hematologia, a nascente parasitologia e, sobretudo, a microscopia, cuja utilização foi pioneira na Bahia". Cada um desses instrumentos, ela argumenta, os diferenciava da medicina vigente. Os tropicalistas teriam rejeitado o antigo modo de interpretar as doenças tropicais a partir de difusos fatores ambientais, "impondo um novo modelo científico, o qual mudava o foco de suas pesquisas do meio ambiente para doenças individuais e específicas". Teria sido essa nova orientação de seus trabalhos que os levou a serem aclamados internacionalmente e imprimiu a eles uma identidade mais vigorosa como movimento médico (Peard, 1997).
 Desvendando os "mistérios" que envolviam doenças como a hipoemia intertropical e a elefantíase-dos-árabes, relacionando-as a parasitas e provando que era possível "fazer boa ciência nos trópicos", eles teriam demonstrado que "a ameaça ubíqua da zona tórrida" era um preconceito que poderia "ser conhecido racionalmente, decifrado e combatido". Ela não nega, entretanto, que os escritos dos tropicalistas expressavam "uma constante tensão entre as novas e as antigas abordagens e o papel dos médicos nelas". Os tropicalistas seriam "ecléticos" por mesclarem "as novas idéias médicas européias com outras mais antigas que se enraizavam na cultura médica local" (idem, ibidem).
O aspecto mais problemático da tese de Peard reside no argumento da originalidade do enfoque global dos tropicalistas, em contraste com o meio médico brasileiro. Segundo ela, quando John L. Paterson (1820-82), José Francisco da Silva Lima (1826-1910) e, principalmente, Otto E. H. Wucherer (1820-73), além de um punhado de outros médicos, resolveram esclarecer e desenvolver o estudo da medicina brasileira através de encontros para discutir observações locais e pesquisas, eles estariam "se rebelando contra uma tradição na qual as idéias e práticas médicas eram marcadas pela conformidade e repetição da medicina ocidental européia, particularmente francesa" (Peard,op.cit.).
Embora pretendesse contestar a "noção generalizada" de que os médicos latino-americanos fossem "agentes secundários e passivos" do conhecimento médico europeu, o fato de ter apresentado os médicos da Escola Tropicalista como única "força dinâmica" em oposição ao pano de fundo da medicina brasileira do século XIX, levou Julyan Peard a reforçar ainda mais o estigma que pesava em relação a seus contemporâneos. A nosso ver, sua preocupação em caracterizar a singularidade daquela comunidade de médicos organizada em torno de um periódico, designando-os muito abusivamente como escola, levou-a a corroborar a visão dicotômica que ela parecia disposta a rejeitar. De fato, todas as tentativas de particularizar aquele movimento científico e corporativo dos médicos organizados em torno da Gazeta Médica da Bahia pecaram por atribuir-lhe um sentido inovador radical, tanto em sua relação com o passado médico nacional, quanto diante do movimento médico e científico que lhe foi contemporâneo (Barros, 1997; Coni, 1952; Luz, 1982).
Não queremos com isso negar àquele grupo outros méritos, particularidades e inovações teóricas, além do impacto positivo no cotidiano das instituições médicas brasileiras. Apenas entendemos que a designação de escola, tal como sugerida por Coni (op. cit.) e reconstruída por meio de diferentes enfoques pela historiografia posterior, em vez de contribuir, veio dificultar o entendimento de algumas características da medicina brasileira naquele período. Não é possível apresentar, nos estreitos limites deste artigo, o conjunto de argumentos que conduzem a tal avaliação (Edler, 1999). Um dos motivos mais relevantes, que não discutiremos aqui, refere-se à analise que fizemos, apoiados na metodologia desenvolvida pela sociologia das controvérsias, sobre a polêmica entre a AIM e os defensores da teoria parasitológica da hipoemia intertropical. Tal estudo, além de tornar evidente que jamais houve uma votação condenando os trabalhos de Wucherer sobre a etiologia parasitária da hipoemia, revelou a impossibilidade de se decidir, naquele contexto, tanto por um critério racional, quanto por meio de uma prova empírica, qual das crenças científicas deveria prevalecer. Ambas as teorias eram, então, bem amparadas pelas evidências empíricas, embora apresentassem aspectos reconhecidamente problemáticos, mesmo para os seus defensores.
Nos próximos tópicos, nos empenharemos em tornar evidentes outros aspectos falaciosos que dão suporte às interpretações negativas sobre o ambiente médico nacional onde atuava o grupo da Gazeta Médica da Bahia. Nos restringiremos, desse modo, a uma apreciação da tradição médica estabelecida, cuja instituição mais proeminente, até a década de 1860, era a Academia Imperial de Medicina. Uma série de atributos que Peard imputa exclusivamente à Escola Tropicalista da Bahia são perfeitamente aplicáveis não só a outros movimentos médicos contemporâneos, mas à própria Academia, cuja finalidade seria, segundo seus criadores, "promover a ilustração, o progresso e a propagação das ciências médicas", zelando pela produção e controle do conhecimento médico local, patrimônio dos médicos que aqui
praticavam. Como discutiremos adiante, a valorização da singularidade da manifestação dos fenômenos mórbidos nacionais criava, de acordo com o paradigma climatológico então vigente, como que um virtual monopólio sobre esse saber, obrigando, outrossim, a uma espécie de aclimatação do conhecimento e da prática médica importados da Europa. Apesar de conhecer o livro de Sigaud e valorizá-lo como o mais inovador trabalho médico escrito no Brasil até o advento da Gazeta Médica, Peard (1997) descreve-o como um caso isolado, sem perceber seu vínculo estreito com um movimento mais amplo voltado para a produção de um saber médico original sobre a nosologia brasileira.”







APÊNDICE IV
OS ÚLTIMOS MOMENTOS DE WUCHERER

(SILVA LIMA, JOSÉ FRANCISCO DA- Gazeta Médica da Bahia, novembro, 1905)

AS PARCAS
(QUADRO DE Sebastiano Mazzoni)

*
“Depois de 24 anos de residência na Bahia, e dos afanosos trabalhos a que sem interrupção se dedicou, o Dr. Wucherer resolveu voltar à Alemamha e gozar de algum descanço no seio de sua família, aque  ali o precedera. Na véspera de sua partida,, 27 de outubro de 1871, foi-lhe oferecido por despedida, e em testemunho de apreço, pela classe médica baiana, um banquete em que tomaram parte muitos colegas, amigos e professores da Faculdade, sobre a presidência do Conselheiro Aranha Dantas, como sincera demonstração de estima confraternal, e de reconhecimento pelos seus importantes serviços à população desta cidade, à ciência e a literatura médica brasileira. Foi com destino ao Rio de Janeiro, e de lá para a Europa.
Na pátria de seu pai, cuja nacionalidade adotou, residiu por algum tempo em Stuttgart, onde se achava a sua esposa e o seu filho único. Visitou por vezes a Faculdade de Tubingem, a sua alma mater, que lhe dera a sua educação profissional, e onde floresciam mestres como Liebermeister, Bruns,, Luschka e outros de não menos prestígio e saber.
Pouco tempo durou aquela felicidade no lar da família, e o descanço a que lhe davam direito os incessantes trabalhos de 24 anos. Revezes da fortuna obrigaram-no a voltar à Bahia, onde chegou em Janeiro de 1873, estregando-se aos árduos labores da vida clínica, para assegurar o futuro dos entes queridos que deixara na Alemanha. Malograda esperança ! Foi, talvez, essa atividade, que de novo desenvolveu, e a dedicação aos seus clientes, que concorreram para o golpe fatal que lhe cortou a vida em poucas  horas, na noite de 7 de Maio de 1873, na idade ainda vigorosa de 53 anos. Passara grande parte da noite anterior à cabeceira de um doente, e, chamado pela madrugada para assistir a uma parturiente, e verificando haver ainda tempo de esperar, voltou a pé da cidade baixa ao hotel dos Estrangeiros, no Campo Grande, onde residia e teve a imprudência de se meter em um banho frio de tina. Ai mesmo foi acometido de um ataque apoplético e perda dos sentidos. Assim foi encontrado na própria tina, caído para um lado, quando se arrombou a porta do quarto, por ele não responder ao chamado para a  primeira refeição do dia, que ele pedira com alguma urgência.
Assim o encontramos, horas depois, já deitado e inconsciente, o Dr. Alexandre Patteron e eu; mas de nada valeram os nossos esforços e assíduos cuidados. Às 10 horas da noite falecia o Dr. Wucherer, sem nunca mais ter aberto os olhos nem proferido uma palavara.
Acompanhei, entristecido, o seu féretro até o cemitério Alemão, e aí lancei piedosamente uma pá de terra e um punhado de flores na sepultura do dedicado amigo e companheiro de trabalho por mais de 20 anos”.


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