224- JOÃO BAPTISTA DOS ANJOS
(Conferência pronunciada pelo Prof. Antônio Carlos Brito, na Sociedade Brasileira de História da Medicina)
MEDALHA COMEMORATIVA DA VISITA DE
D. PEDRO II À BAHIA (1859/1860)
*
Introdução
Biografia do conselheiro doutor João Baptista dos Anjos (1799-1871), apresentada pelo autor em sessão de 11 de maio de 1995, perante o colendo Instituto Bahiano de História da Medicina e Ciências Afins, fundado em 29 de novembro de 1946, a qual foi realizada na Sala dos Lentes da Faculdade de Medicina da Bahia, no Terreiro de Jesus, ao tomar posse como membro titular da cadeira nº 6, que tem como patrono o ilustre e ilustrado conselheiro.
A dita biografia, saga épica e de exaltação panegírica, foi elaborada mercê de exaustiva pesquisa em catadupas de documentos manuscritos, originais e inéditos.
Advertência
Apenas o conselheiro doutor Domingos Rodrigues Seixas (1830-1890), lente proprietário de Higiene e História da Medicina de 1858 e lente jubilado em 1881, biografou, em 1871, o conselheiro João Baptista dos Anjos. Nem mesmo o ilustrado amanuense Sr. Anselmo Pires de Albuquerque, arquivista da Faculdade de Medicina da Bahia desde 1896, biógrafo de 32 antigos lentes e destacados funcionários da Faculdade; nem sequer o afamado Augusto Victorino Alves Sacramento Blake, autor do notável "Diccionario bibliographico brazileiro - 1883-1902".
Creio que sou o segundo a biografá-lo.
Proximamente ao termo da segunda década dos oitocentos, já era quase manhã a noite morta na extensa costa da Mina, na África Ocidental, que ia desde o cabo das Palmas até o rio Gabão, estendendo-se em pouco mais ou menos 426 léguas.
A começar do romper d'alva, perto do golfo de Benim, o vento enfuriava e ululava nas cordagens de uma bela escuna brasileira, de 220 toneladas, fundeada no meio da barra, de propriedade de rico negociante da cidade da Bahia. Ao depois, plúmbeas e pesadas nuvens cerraram, escurecendo e toldando o horizonte.
Por volta das 6 horas da manhã, chegada a tormenta, vagas formidandas saltavam raivosas e bramantes sobre o tombadilho do veleiro e invadiam, com ímpeto, as escotilhas.
Ao meio dia, acalentada a procela, fugace, o sol resplandeceu no zênite e fartou de claridade a costa da Mina, no golfo de Benim, e as brumas do horizonte foram dissipadas.
Na escuna, os mareantes, postados no castelo de proa, trovavam com voz de peito, timbrada, plangentes cantilenas, aguardando a ordem do capitão para seguirem viagem e arribarem no Brasil.
Aparelhada em 2 mastros, com um farto velame de caranguejas, bujarronas, balestilhas e traquete de gávea, as marinhagens esperavam o momento de levantar ferro e desfraldar as velas, para o vento impelir a embarcação afora da baía.
A sua amarra rangia através dos escovens. Finalmente, a âncora foi puxada com o cabrestante, iniciando a escuna a sua derrota para o Brasil.
O capitão indicou o rumo a percorrer e a embarcação foi empurrada pelo traquete e bujarronas, com as velas já desferradas e içadas.
O navio estivado corria vento feito, com todos os seus panos, navegando à bolina e partindo os mares, visto que o tempo estava muito veleiro.
Ao apequenar-se o tórrido e tropical litoral africano, conservava-se no tombadilho, de pé, à proa, segurando, com mãos firmes, o cordeame, um moço de nome João Baptista dos Anjos, natural da cidade da Bahia.
Cismento, contemplava as formas do litoral, que enfumavam ao longe, confusamente e, voltando-se, mirou, agoniado, para a linha do horizonte, e a escuna apartou veloz.
O rapazo, de cabelos castanhos corredios, acariciados e osculados pelo vento ponteiro, sorvia o hálito que exalava do mar marulhado, num grande hausto. O seu rosto juvenil, comprido e magro, e olhos pardos, de olhar penetrante, retratavam a personalidade forte que a natureza o prendou desde a parvulice. Sempre se lhe galopou o desejo de sedar a dor, como médico, não lhe carecendo, para o seu "desideratum" ser cumprido, os necessários denodos e empenhos.
O moço retornava à pátria, estigmatizado por sucesso assaz invulgar. Há pouco, não se lhe afigurando, acreditava, ter cometido infração da lei, estava metido a ferros, padecente, em sombria e úmida masmorra, e réu de morte, condenado por tribo d'África, pelo delito de ter privado a vida de um abutre. Sempre crendo ser incapaz de faltar aos preceitos da probidade e não aceitando que se lhe impusesse qualquer labéu, foi posto em salvo da devoção fanática dos senhores do baraço e cutelo, mercê dos piedosos bons ofícios de negociantes da cidade da Bahia, que satisfizeram a respectiva pena pecuniária, libertando-o das manoplas do algoz.
João Baptista dos Anjos, se chamou no mundo aquele que foi uma das mais notáveis personalidades da medicina da Bahia no século XIX.
De berço humilde, de família carente de posses e privada de influência social, e reduzida, João Baptista dos Anjos, em virtude da sua inteligência acrisolada, aliada ao excepcional talento, que transformaram em fascinante realidade os altos ideais que perseguia, conheceu a deliciosa embriaguez do triunfo e do sucesso, cativando a sociedade e fazendo-se respeitar no vasto mundo da ciência e da profissão médica. Em torno dele criou-se uma atmosfera de glória e admiração, impregnada do mais puro incenso lisongeiro.
O panegírico e estudo biográfico em derredor da vida do conselheiro João Baptista dos Anjos, lavorados em ático estilo pelo lente doutor Domingos Rodrigues Seixas, dados a lume em 30 de setembro de 1871 na "Gazeta Medica da Bahia", emitem conceitos laudatórios tais como: "Um vulto eminente, um dos grande convivas da terra...". "O ilustre finado tão digno de respeito, quão merecedor da geral estima, deixou na sua vida uma aureola de luz brilhante, que illuminará para sempre o seo nome, que já não pode morrer esquecido".
"A Faculdade de Medicina desta Provincia, onde luzirão, por tanto tempo, o talento e a illustração desse venerando Mestre, lembrou-se de erigir um padrão immoredouro, um quadro biographico, no qual se estampase, com traços vivos os actos mais salientes da vida de seo irmão de lettras"...
"Ao modo da crysalida, de que falla Rebello da Silva, a qual sentindo, um dia, o raio do sol que a chamava à vida, rompeo o involucro, e lançou-se intrepida das trevas do casullo humilde para os espaços luminosos do seo destino, o Doutor João Baptista dos Anjos desejou ser grande e embarcou-se na difficil empreza das sciencias, de cujo cultivo esperava bonançoso porvir"...(1).
Continuando sua obra biográfica na edição do subseqüente mês de outubro de 1871, datada do dia 15, assim escreveu o doutor Seixas: "Illustrando a sociedade em que viveo, gosou sempre dos fóros de homem honesto e intelligente".
"A classe medica respeitava suas luzes, e a Faculdade de Medicina, tributando respeito á sua idade e a seo saber, ha de sempre prestar em seo culto posthumo, uma homenagem sincera de além tumulo, que servirá de echo perenne de sua eterna saudade". (2).
Já o conselheiro doutor Elias José Pedrosa, lente de anatomia geral e patológica, na Memória Histórica da Faculdade de Médica referente ao ano de 1871, de sua autoria, apresentada à respectiva congregação e publicada na "Gazeta Medica da Bahia", com data de 30 de setembro de 1872, assim se refere ao conselheiro João Baptista dos Anjos: "A 4 de Janeiro de 1871 perdeu ella (a Faculdade) um dos seus mais brilhantes luzeiros. Seu digno director o lente jubilado da cadeira de hygiene e historia da medicina, Conselheiro Dr. João Baptista dos Anjos, desceu a sepultura n'aquelle infausto dia, depois de uma molestia que prostou-o no leito da dôr desde o principio de novembro d'aquelle anno; por cujo motivo assumira a directoria o vide-director, nosso eximio collega, o honrado Conselheiro Sr. Dr. Vicente Ferreira de Magalhães".
"Uma febre de mau caracter com affecção gastrica, não recente, roubou a Faculdade o seu desvelado director, ao Estado um empregado exemplar, a sociedade um cidadão prestante, um amigo dedicado, um clinico consummado, e a familia um consorte fiel e um pai extremoso. Tão excellentes qualidades não podiam deixar de ser apreciadas na vida de tão conspicuo varão por quantos o communicaram, e particularmente por aquelles que, como nós, tiveram de sentar-se ao seu lado nos bancos da antiga Academia Medico-cirurgica. O digno professor, Sr. Dr. Domingos Rodrigues Seixas, que succedeu-lhe na cadeira, já bem eloquentemente as descreveu no seu discurso necrologico, apresentado a Faculdade em sessão de 9 de setembro do anno findo.
"A 3 do mesmo mez, reunida a Congregação para diversos outros negocios, requereu o Sr. Dr. Bomfim que se suspendessem os trabalhos e se constituisse em sessão especial, em cuja acta manifestasse a Faculdade o seu pezar pelo passamento do seu director: o que se fez com aceitação unanime. Tocando-me d'esta vez a triste missão de relatar incidente tão lugubre, peço-vos que me ajudeis a render n'esta occasiao um preito de triste saudade ao illustre finado, e a derramar uma lagrima de pungente dôr sobre a lousa do nunca assaz chorado collega". (3).
Consoante o necrológico e dados biográficos apresentados pelo lente doutor Domingos Rodrigues Seixas, "o finado Conselheiro João Baptista dos Anjos, foi um dos raros cidadãos, que se pode considerar feituras de si proprios".
"Seo nascimento não tinha tradições gloriosas: seo berço foi pobre e modesto; seus paes sem grandes recursos: sua familia reduzida e sem valimento. Mas, a maneira dos rios, que antes de serem caudalosos, começão por tenues regatos, o illustre finado, apesar dessa origem humilde de parentes desconhecidos, creou um futuro certo e honroso".
E continua o doutor Seixas, reportando-se à dificil e penosa puerícia do conselheiro João Batista dos Anjos: "seo pae João Baptista dos Anjos, casado com D. Thomazia Leonel dos Anjos, antigo portuguez, a quem faltava a intelligencia precisa para bem aquilatar as aptidões e o merecimento de seu filho, reagio muitas vezes, e oppoz os maiores obstaculos aos desejos do menor, que aspirava estudar as humanidades".
Detectei, no parágrafo acima, discordância a respeito do nome do pai do biografado. O lente doutor Seixas registra como homônimo o genitor do conselheiro diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, muito embora o doutor Rodrigues Seixas tenha sido colega de congregação e ilustre coevo do doutor João Baptista dos Anjos.
Foram por mim vistos documentos manuscritos originais que consignam o nome do pai do doutor João Baptista dos Anjos como Pedro de Jesus Stokler, conforme se pode conferir no expediente com data de 22 de outubro de 1823, comunicando a baixa do Serviço Militar referente ao jovem João Baptista dos Anjos, (4) segundo consta nos "Termos de Exames e Actas-Collegio medicocirurgico", quando o então estudante de medicina, João Baptista dos Anjos, foi examinado e aprovado, cursando o 6º ano, na data de 20 de dezembro de 1828 e na oportunidade em que foi aprovado nos exames para obter o grau de Formado em Cirurgia. (5).
Da mesma maneira, no assentamento do casamento do doutor João Baptista dos Anjos e D. Maria Magdalena Alvares, por mim examinado no competente livro de registro de casamentos celebrados na freguesia de Santo Antonio Além do Carmo, realizado a 6 de fevereiro de 1830, está registrado: "...João Baptista dos Anjos filho legitimo de Pedro de Jesus e Thomazia Leonel dos Anjos já fallecidos..."(6).
Um episódio assaz invulgar, que certamente estigmatizou o adolescente João Baptista dos Anjos foi narrado da seguinte maneira pelo conselheiro Seixas: "Arreigado á consideraçao de que só pelo commercio se poderia ser feliz, entendia dever levar sua resistencia até a imposição e a luta, ao ponto de coagir o filho a embarcar para a Costa d'Africa, onde passou elle pelo mais peniveis incommodos, sendo até perseguido pelos maioraes da terra, miseros ignorantes, que impuserão-lhe a pena de morte pelo facto de matar um urubú".
"O moço João Baptista, inexperiente, commeteo essa grande falta, e dentro em breve, achou-se na dura contingencia de ver annunciada a sua hora ultima!".
"Felizmente, alguns brazileiros reunidos em seo apoio, com pedidos e rogos, mediante a cotisação para o pagamento de uma multa, poderão salvar o jovem bahiano, victima da estupidez daquelle povo brutal".
"Com auxilio desses brazileiros, conseguio João Baptista regressar à terra natal onde, contra a vontade e somente por obedecer a seu pae, então modificado de ideas, porem ainda austero por genio, acceitou o lugar de sachristão da Cathedral, logar em que não permaneceo, por que era contrario a sua vocação".
Batinas e vistosas sobrepelizes roxas e escarlates; o ciciar de orações; odores que impregnavam as ventas dos devotos e circunstantes, evolados das velas de estearina, que se consumiam e do incenso turibulado ante os altares e buriéis; clérigos hissopando o finado em ofício de corpo presente e garganteando responso em torno da essa; o sino tocando, a intervalos, triste dobre de defuntos; as amiudadas genuflexões ao beijocar as mãos de eclesiásticos, de fácies tartufizadas; o fedor nauseabundo e miasmático que emanava das catacumbas, foram as razões que anunciaram não estar o moço João Baptista dos Anjos vocacionado para acolitar os homens de Deus no divino ofício na catedral, antiga igreja dos padres da Companhia de Jesus, onde tinha o ofício de sacristão, para obter o parco, porém necessário, estipêndio para estudar medicina, ao retornar da sua dramática viagem à costa d'África.
Continuou o lente Dr. Seixas: "Todo o intuito, toda a attenção do moço Baptista era ser medico; porem baldo de meios, e sem o favor paterno, obteve no antigo Collegio Medicocirurgico, um lugar de porteiro, emprego cujos rendimentos erão applicados aos estudos que fazia no mesmo Collegio".
"Essa tentativa nobre, esse pertinaz empenho de elevar-se por seus esforços e recursos, é sem duvida alguma uma das mais brilhantes virtudes do jovem estudante de medicina".
Ao retornar da sua atribulada viagem a Costa d'Africa, muito provavelmente a região chamada de "Costa do leste do Castelo de São Jorge de Mina" ou simplesmente "Costa da Mina", região do Golfo de Benim (7), a bordo de um patacho ou brigue, certamente a serviço do tráfico de escravos, o jovem Baptista, vocacionado para abraçar a sublime missão de sedar a dor, empreendeu comovente e fascinante porfia para concretizar seu grandiosos ideal, conforme foi narrado pelo professor Seixas.
Ao consultar manuscritos originais inéditos relativos ao conselheiro João Baptista dos Anjos, caiu-se o véu sobre pontos escuros e desconhecidos de sua vida, da sua juventude até sua morte, desvendando, de vez, as circunstâncias em que estava envolvida a existência do insigne conselheiro, dissipando quase por completo as névoas cobrindo a sua ilustre existência desde o início do século XIX.
Destarte, os ditos manuscritos farão fixar e cristalizar nestas páginas a fulgurosa e heróica saga, que foi a vida do conselheiro João Baptista dos Anjos, vida que a ação deletéria do tempo ia consumindo e diluindo no passado, mas que foi, em parte, resgatada por meio da presente pesquisa.
Documentos pesquisados permitem detalhar parte do capítulo inicial do desafio do moço Baptista, idealista, para alcançar seu desiderato.
Tendo se matriculado no Colégio Médico-Cirúrgico no ano de 1822, quando foi aprovado plenamente ao final do dito ano, o jovem João Baptista, imbuído de inexcedível sentimento de patriotismo, interrompeu os estudos para lutar no Recôncavo, ingressando no exército pacificador para lutar pela independência da Bahia e do Brasil contra as tropas lusas, conforme se lê no seguinte documento:
"Attesto que João Baptista dos Anjos, que actualmente he soldado da 2.ª Comp.ª do B.am n.º 2 desta Cidade, foi Escolar da Aula do Collegio Medico-Cirurgico, tendo-se Matriculado nella no anno de 1822; fez o 1º acto de Exame com plena approvação no fim do mesmo anno; e deixou de prosseguir naquelles Estudos por ter emigrado para o Reconcavo: e por ser verdade todo o expendido, e me ser pedido esta attestação, a dei e firmo com o juramento do meu gráo.
Bahia 12 de Setembro de 1823
José Soares de Castro
Lente do 1º anno". (8)
Como se observa, o jovem patriota ainda não tinha sido desmobilizado no mês de setembro, após a entrada, a 2 de julho de 1823, na cidade da Bahia, do exército pacificador, que resultou no fim da luta, pela independência do Brasil, com a partida do general Madeira de Mello para a Europa.
Finalmente, o denodado rapaz teve baixa do serviço militar a 22 de outubro de 1823, por despacho do Conselho interino do governo da Bahia, cuja sede era na vila de Cachoeira. Tinha então 21 anos de idade, cabelos castanhos e olhos "pardos".
Pode-se inferir pelo ano constante no sobredito documento, 1823, e pela idade registrada, 21 anos, que J.º Bap.ta dos Anjos nasceu no ano de 1802 ou 1803. Infelizmente quase todas as páginas dos livros de assentos de batizados de diversas freguesias da capital, estavam assaz corrompidas pela ação do tempo, impedindo-me, por conseguinte, de localizar o assentamento do batizado do conselheiro Baptista e identificar o dia, mês e ano do seu nascimento. Da mesma forma, tal documentação não foi encontrada no Memorial da Medicina da Bahia.
Segue-se a transcrição, na íntegra, do manuscrito em referência:
"Alexandre Gomes d'Argollo Ferrao~
Sargento Mor Command.e do Batalhão
de Caçadores N.º 2 da Cid.e
da Bahia por S.M.I. e Snr' D.
Pedro 1.º que Deos G.e e V. ª
Por despacho dos Ill.mos eEx.mos Snr.es do Governo desta Provincia de 21 do Corrente mez, e anno, teve baixa do Serviço Militar, em 22 o Sold.º Voluntario da 2.ª Comp.a do Batalhão de Caçadôres N.º 2 domeu Comando João Baptista dos Anjos filho de Pedro de Jesus Stokler, com 21 annos deid.e prezente, Cabellos Castanhos, Olhos pardos, natural da Bahia
E para assim constar aonde lheconvier mandei passar aprezente Escuza que vai por mim asignado. Bahia 22 de Outubro de 1823.
Alexandre Gomes de Arg.º Ferrao~". (9).
Documentos manuscritos revelam, com riqueza de detalhes, o intento do jovem João Baptista dos Anjos para ser admitido como porteiro do Colégio Médico-Cirúrgico:
"Diz João Baptista dos Anjos, que tendo seguido com boa applicação as materias que faziam o objecto dos estudos do 1.º anno do Curso da Academia Medico-cirurgica desta cidade, e que tendo interceptado esta carreira por emigrar para o Reconcavo, onde como bom Brazileiro, e com as armas na mao defendeo sua amada Patria, o que se vê do Documento junto; porque se acha vago o lugar de Porteiro da mesma Academia de q.e era Proprietario Manoel Antonio Pires, Portuguez tão desafeto á causa do Brazil, que além de outras provas se retirou p.ª Portugal, deixando o cuidado de seu Ministerio a hum seu Cunhado o que he inadmissivel, o Supp.e porque he Alumno daq.la Academia, e tem proporções necessarias p.ª satisfazer os deveres do mencionado lugar.
P. a V. Ex.ª digne-se attender
seus serviços prestados á Nação e
a vista do supra expend.e provello
no mencionado lugar
E R Mce
João Baptista dos Anjos". (10).
É deveras assaz singular o estilo redacional do suplicante que, valendo-se da animosidade ainda reinante em relação aos lusos, utilizou-se da condição de heróico combatente nas fileiras do exército pacificador, na guerra pela independência do Brasil, terminada a 2 de julho de 1823 com o general Madeira de Mello fazendo de vela para a Europa, com a esquadra portuguesa composta de 84 navios.
E mais curiosa torna-se ainda a petição quando o idealista suplicante ressalta o tíbio caráter, a patente irresponsabilidade funcional e a condição de inimigo do Brasil, atributos desabonadores do lusitano porteiro do Colégio Médico-Cirúrgico.
No frontispício do invulgar requerimento estava exarado o despacho: "Informem os Lentes do Collegio Medico-Cyrurgico. Pal.º do Governo da B.ª 23 de janr.º de 1824
(assinatura ilegível)"
Eis a resposta:
"Ill.mo e Ex.mo Senhor
Em virtude do Despacho de V. Ex.ia que nos manda informar o requerimento de João Baptista dos Anjos, no qual de ser provido no lugar de Porteiro desta Eschola, vaga pela auzencia de Manuel Antonio Pires, cumpre-nos levar ao conhecimento de V. Ex.ia l.º que o Suppl.e he estudante approvado nas materias do Primeiro anno do Curso cirurgico, de m.to bôa conducta moral, de intelligencia, e aceito em suas obrigaçõens escholares. 2.º que o ditto Manuel Antonio Pires em consequencia de suas longas e teimozas queixas alcançou licença de um anno para ir á Portugal usar das aguas thermicas, d'onde não tem regressado, e nem sollicitado prorogação da licença, como devêra, visto ter espirado o anno concedido pela Junta Provisoria do Governo de 1822. 3.º que Joaquim Pereira de (corrompido) já anteriormente nomeado para servir nos impedimentos do ditto Pires, ficou por ordem da mesma Junta no lugar sem ordenado algum, em cujo exercicio tem continuado a estar; porem que achando-se com praça de Furriel do l.º batalhão de Caçadores, não será possivel cumprir as duas, e incompativeis obrigações de militar, e Porteiro da Eschola — Deus G.e a V. Ex.ª m.to a.os Bahia em Collegio 24 de Fevr.º 1824
D.r Jozé Avellino Barboza
Manoel Jozé Estrella
Jozé Alvares do Amaral" (11).
A propósito da tenacíssima luta do jovem estudante de medicina para receber o laurel de "cirurgião formado", sem a ajuda paterna, mercê do seu emprego como porteiro do Colégio Médico-Cirúrgico, que lhe facultou precisos, porém parcos recursos financeiros, mereceu do lente doutor Seixas a seguinte citação: "É occasiao de reproduzir o que disse um literato brazileiro: - É mais para invejar o varão que se faz grande e famoso pelo engenho e pelos actos, do que o homem que já nasceu entre os brazões herdados".
E acrescenta, referindo-se à vitória alcançada, quando recebeu o diploma de cirurgião formado: "Sem pertencer por tanto o jovem aspirante á essa raça privilegiada da sociedade, a orgulhosa aristocracia, que firma, nos foros da nobreza o grande futuro, que a sociedade viciosa lhe aponta com segurança, sabia elle marchar corajoso na mesma senda, até que por fim, enthesourando um cabedal scientífico sufficiente á merecer fama entre os seus companheiros, alcançou o diploma de Cirurgião formado, título tanto mais honroso, quanto foi conquistado com os olhos fitos no quadro pungente das privações e dos trabalhos".
Farta fonte primária revelou minudentes detalhes da trajetória da vida estudantil no Colégio Médico-Cirúrgico, desde o primeiro ano, conforme está assentado no precioso livro "Termos de Exames e Actas - 1816-1847 - do Collegio Medico cirurgico".
Eis o seu tirocínio acadêmico:
"Primeiro anno
(Página 36 - V)
Aos seis dias do mez de Dezembro de mil oitocentos e vinte e dous compareceo na sala dos Exames o Estudante do Primeiro anno João Baptista dos Anjos para ser examinado no ponto theorico das materias de seu curso que havia tirado de vespera; e sendo perguntado pelo lente Examinador José Avelino Barbosa e Manuel da Silveira Rodrigues debaixo da Presidencia do Lente Substituto José Alvares do Amaral foi por elles Approvado Nemine Discrepante e em que igualmente sou Secretario fiz este termo, que assignará os lentes acima mencionados.
Bahia 6 de Dezembro 1822
Dr. Jozé Avelino Barboza
Dr. Manoel da Silveira Rodrigues
Jozé Alvares do Amaral" (12).
"Segundo anno
(Página 42)
Aos vinte dias do mes de Maio de mil oitocentos e vinte e cinco compareceo na salla dos exames João Baptista dos Anjos Estudante do segundo anno para fazer exame das suas respectivas doutrinas, pelo não ter feito em tempo competente por adoecer, obtendo dispensa do lapso de tempo do Ex.mo Senhor Presidente da Provincia: e depois de ser perguntado pelos Lentes Examinadores Antonio Ferreira França, e Manuel Joaquim Henrique de Paiva debaixo da prezidencia do Lente Francisco de Paula de Araujo, foi por elles Approvado Nemine Discrepante. Emfé do que eu Secretario do Collegio fiz este termo assignado pelos dittos lentes. Bahia 20 de Maio de 1825
Dr. Francisco de Paula de Araujo e Almeida
Antonio Ferreira França
Dr. Manoel Joaquim Henrique de Paiva
José Alvares do Amaral" (13).
"3.º anno
(Página 45)
Aos dezasete dias do mez de Dezembro do anno mil e oitocentos e vinte e cinco compareceo o Estudante do terceiro anno João Baptista dos Anjos, para ser examinado no ponto que havia tirado no dia antecedente: e tendo sido perguntado pelos Lentes Examinadores Antonio Ferreira França e Manoel Jozé Estrella debaixo da prezidencia do Lente Jozé Lino Coutinho foi por elles Approvado Nemine Discrepante. Eu Francisco de Paula de Araujo e Almeida secretario interino do Collegio fiz este termo que assignarão os referidos Lentes. Bahia 17 de Dezembro de 1825
Jozé Lino Coutinho
Antonio Ferreira França
Dr. Francisco de Paula de Araujo e Almeida" (14).
"Chimica
(Página 44 - V)
Aos quatorze dias do mez de Dezembro de mil oitocentos e vinte e cinco compareceo o estudante do terceiro anno João Baptista dos Anjos e os estudantes do segundo anno Vicente Ferreira de Magalhães e Elias Jozé Pedroza para serem examinados no ponto que havião tirado no dia antecedente: e tendo sido perguntado pelos Lentes Examinadores Jozé Avelino Barboza e Manoel Jozé Estrella debaixo da prezidencia do Lente Substituto Francisco de Paula de Araujo e Almeida foram por elles approvados Nemine Discrepante. Eu Francisco de Paula de Araujo e Almeida fiz este termo assignado pelos Lentes referidos.
Bahia 14 de Dezembro de 1825
Dr. Francisco de Paula de Araujo e Almeida
Dr. Jozé Avellino Barboza
Manoel Jozé Estrella" (15).
"4.º anno
(Página 49 - V)
Aos treze dias do mez de Dezembro de mil oitocentos e vinte e seis compareceo o Estudante João Baptista dos Anjos para ser examinado no ponto de Partos que havia tirado no dia antecedente; e tendo sido perguntado pelos Lentes Examinadores o Doutor Antonio Ferreira França e José Soares de Castro debaixo da Prezidencia do Doutor Antonio Torquato Pires foi por elles Approvado Nemine Discrepante. Em fé do que eu Francisco Magalhães Gesteira Secretario interino fiz este termo que assignarão os Lentes.
Bahia 13 de Dzbro 1826
Antonio Ferreira França
Jozé Soares de Castro
Antonio Torquato Pires de Figueiredo" (16).
"4.º anno
(Página 49 - V)
Aos quinze dias do mez de Dezembro de mil oitocentos e vinte seis compareceo o Estudante João Baptista dos Anjos para ser examinado no ponto de Materia Medica e Pharmacia que havia tirado no dia antecedente e tinha sido perguntado pelos Lentes Examinadores os Doutores Francisco de Paula e Araujo e Antonio Torquato Pires de baixo da Prezidencia do Doutor Jozé Lino Coutinho foi por elles Approvado Nemine Discrepante. Em fé do que eu Francisco Marcellino Gesteira fiz este termo que assignarão os ditos Examinadores. Bahia 15 de Dzbro 1826
Jozé Lino Coutinho
Francisco de Paula de Araujo e Almeida
Antonio Torquato Pires de Figueiredo" (17).
"Pratica de operações
(Página 52)
Aos dezasete dias do mez de Dezembro de mil oito centos e vinte sete comparecerão no Theatro Anatomico os Estudantes João Baptista dos Anjos, Elias José Pedrosa, Vicente Ferreira de Mag.es e Antonio Guilherme e Muniz para faserem exame practico de operações no Cadaver segundo o ponto que no mesmo dia havião tirado em presença dos Lentes do Collegio Manoel Joaquim Henrique de Paiva, Jozé Soares de Castro, Manoel Jozé Estrella e Francisco de Paula de Araujo e Almeida, os quaes os derão por Approvados Nemine Discrepante, e para constar fiz este termo em que assignarão os d.os Lentes. Bahia, 17 de Dezembro de 1827.
Jozé Soares de Castro M.el Jozé Estrella
Francisco de Paula de Araujo e Almeida" (18).
"Anatomia pratica
(Página 52 - V)
No mesmo dia forão approvados no exame pratico de Anatomia, na presença dos M.mo Lentes acima os Estudantes João Baptista dos Anjos, o Senhor Marcellino Antonio de Mello e Albuquerque, Antonio Manoel de Souza Esequiel Francisco das Neves, João Felipe Rastelli, e para constar fiz este termo em que assignarão os Lentes. Bahia 17 de Dezembro de 1827
Jozé Soares de Castro Manoel Jozé Estrella
Francisco de Paula Araujo e Almeida" (19).
"Quarto anno de Repetição
(Página 53 - V)
Aos quatro dias do mez de Dezembro de mil oito centos e vinte e oito, compareceo o Estudante do Sexto anno João Baptista dos Anjos para faser exame theorico das materias do quarto anno; e depois de defender huma dissertação e de ser perguntado pelos Lentes Examinadores o D.r Francisco de Paula de Araujo e Almeida, Jozé Soares de Castro e Manoel Jozé Estrella de baixo da Prezidencia do D.r Jozé Lino Coutinho foi por elles approvado Nemine Discrepante. Em fé do que Eu Secretario interino fiz este termo em que assignarão os d.es Lentes.
Bahia 4 de Dezembro de 1828
Jozé Lino Coutinho
Manoel Jozé Estrella
Jozé Soares de Castro
Francisco de Paula Araujo e Almeida" (20).
"Quinto dias Septo annu
(Página 57 - V)
Aos vinte dias do mes de Dezembro de mil oito centos e vinte oito na Salla dos Exames da congregação os Lentes do Collegio Medico Cirurgico Antonio Ferreira França, José Lino Coutinho, Francisco de Paula Araujo e Almeida, Manoel José Estrella, e José Soares de Castro para votarem sobre omerecimento do Estudante do sexto anno João Baptista dos Anjos natural da Cidade da Bahia filho de Pedro de Jezus Stokler a vista dos Diarios de cincodoentes de medicina e cirurgia, presentes os Lentes, e que deverão por espaço de onze dias, segundo a ultima resolução do Collegio de 27 de Novembro do m.mo anno, e corrido o Escrutinio foi por elles Approvado Nemine Discrepante nos exames que fez theorico constante do termo antecedente e pratico no mesmo dia de hoje fica condecorado com o gráo de Formado em cirurgia egosando de todos os atributos que lhe são concedidos pelo Plano da Escolla e Lei Novissima. Em fé do que Eu Francisco Marcellino Gesteira secretario interino fiz este termo assignado por todos.
Bahia 20 de Dezembro de 1828
Antonio Ferreira França
Jozé Lino Coutinho
Manoel Jozé Estrella
Jozé Soares de Castro
Francisco de Paula Araujo e Almeida" (21).
Destarte, no dia 20 de dezembro de 1828, o denodado e idealista João Baptista dos Anjos, ao concluir o seu tirocínio acadêmico, deu o primeiro passo que o levaria a trilhar uma fulgurante trajetória no âmbito da medicina, levando a sociedade de então a contribuir com pedras preciosas para o pedestal da fama, pelo reconhecimento do valor e talento do notável médico, escrevendo o lente doutor Domingos Rodrigues Seixas um justíssimo panegírico, celebrando o seu mérito com páginas encomiásticas e laudatórias.
Tão logo foi premiado com o grau de formado em cirurgia, mercê do seu avultado talento, já no ano seguinte, em dezembro de 1829, sentava-se o humilde porteiro do Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia ao lado dos seus eminentes professores, já na qualidade de "Lente Examinador", quando avaliou antigos colegas do Colégio, avultando-se os estudantes Elias José Pedroza e Vicente Ferreira de Magalhães, aquele, futuro lente de Anatomia Geral e Patológica e, este, lente, por concurso, de Física Médica e vice-diretor interino da Faculdade de Medicina da Bahia e diretor interino, com o falecimento do conselheiro João Baptista dos Anjos, de 1871 a 1874.
Vejamos:
"Quarto anno de Repetição
(Página 58)
Aos quatro dias do mez de Dezembro de mil oitocentos, e vinte, e nove na Salla dos Exames compareceo o Estudante do sexto anno Elias José Pedroza, para fazer exame theorico das materias do quarto anno, e depois de defender sua "Dissertação", e de ser perguntado pelos Lentes Examinadores p D.r Antonio Ferreira França, Fortunato Candido da Costa Dormund, João Baptista dos Anjos e João Antunes d'Azevedo Chaves, debaixo da Prezidencia do D.r Francisco Marcellino Gesteira, foi por elles Approvado =Nemine Discrepante=. E eu João Antunes d'Azevedo Chaves, nomeado para servir de secretario, fiz este termo, que assignei com os Lentes acima referidos. Bahia e Salla dos Exames do Collegio Medico Chirurgico 4 de Dezembro de 1829
Francisco Marcellino Gesteira
Antonio Ferreira França" (22).
"Quarto anno de Repetição
(Página 58 - V)
Aos cinco dias do mez de Dezembro de mil oito centos, e vinte, e nove, compareceo o Estudante repetente Vicente Ferreira de Magalhães, para fazer o exame Theorico das materias do quarto anno, que faz parte do de Dissertação, sobre o ponto, que tirar de vespera, e sendo perguntado pelos Lentes Examinadores Manoel José Estrella, Jonathas Abbott, João Baptista dos Anjos e João Antunes D'Azevedo Chaves, de baixo da Prezidencia do d.r Francisco Marcellino Gesteira, depois de defender sua Dissertação sobre Obstetricia, foi por elles Approvado Nemine Discrepante. E eu João Antunes D'Azevedo Chaves, nomeado para servir de secretario, fiz este termo, que assignei com os referidos Lentes. Bahia, e Salla dos Exames do Collegio Medico-Chirurgico 5 de Dezembro de 1829
Francisco Marcellino Gesteira
Manoel Jozé Estrella
Jonathas Abbott
João Baptista dos Anjos
João Antunes D'Azevedo Chaves" (23).
Em 1829, envolveu-se o conselheiro João Baptista em acirrada polêmica devido a nomeação, "ob e subrepticiamente", para a cadeira de Fisiologia do Colégio Médico-Cirúrgico, do lente Constantino Tavares de Macedo, indicação que violou os "incontractaveis Direitos" do conselheiro, o que o levou a pedir embargo à posse do sobredito lente.
Também solicitou embargo o lente João Antunes de Azevedo Chaves.
Para alcançarem o desiderato, firmaram a procuração cujo teor é o seguinte:
"João Baptista dos Anjos, e João Antunes de Azevedo Chaves, Formados em Cirurgia pela Escola Médico Cirurgica desta Cidade, Lentes Substitutos da mesma Escola
Para esta causa e suas dependencias constituimos por nossos bastantes Procuradores aos Senhores Advogados Pedro Baptista do Nascimento, José Joaquim Pires, e Manoel Marques de Souza Porto, e Requerentes os Senhores Joaquim José de Santa Anna Gesteira, Luiz Ramos d'Oliveira, e Pedro Alexandrino de Andrade, para que todos juntos, e cada hum de per si, possão requerer todo o nosso direito e justiça, appelar, embargar, aggravar, jurar em nossas almas dicisoria, e suppletoriamente oppor embargos de qual quer natureza que sejão, ver com excepçoens, offerecer suspeiçoens, appresentar e contraditar testemunhas, e obrar tudo o mais, que aqui não especificamos, pois havemos por declarados todos os cumpridos e especiais poderes, para por nós obrarem, como se presentes fossemos. Bahia 15 de Desembro de 1829, João Baptista dos Anjos, João Antunes de Azevedo Chaves". (24).
Firmaram o seguinte expediente respeitante ao caso, endereçado aos lentes do Colégio Médico-Cirúrgico:
"Ill.mo Snres Lentes do Collegio Medico Cirurgico -
Dizem os abaixo assignados, Lentes Substitutos da Eschola, que havendo Constantino Tavares de Macedo alcançado ob e subrepticiamente a Cadeira de Phisiologia da mesma Eschola, e vindo em consequencia á ser violados com tal nomeação os incontractaveis Direitos dos Supplicantes, tem estes que oppor Embargos á posse, que pretende o Supplicado, para o effeito de serem remettidos ao Tribunal, d'onde emanou o Decreto, em virtude da ord. L.º2.º tit. 43, e 44; e como esta mesma Ord. authorisa á este Collegio para deferir aos Supplicantes, requerem, e Pedem a V. S.as se dignem haver por bem, que appresentados os mesmos Embargos para serem remettidos, se officie ao Ex.mo V. Presidente da Provincia, para por seo intermedio tornar effectiva a mesma remessa, lavrando-se de tudo os competentes assentamentos no L.º do registro deste Collegio para a todo tempo constar. E.R.M. João Antunes de Azevedo Chaves, João Baptista dos Anjos. Como requerem. Bahia 16 de Dezembro de 1829. Lino Coutinho, Estrella. França. Abbott. Dormund. Gesteira —" (25).
E prosseguem:
"Com o devido respeito, João Baptista dos Anjos Substituto das Cadeiras do Collegio Medico Cirurgico, e João Antunes de Azevedo Chaves Substituto da Cadeira de Operaçoens e Partos do mesmo Collegio, tem legitimos e relevantes Embargos d'ob e subrepção a Carta que obteve Constantino Tavares de Macedo para servir de Lente da Cadeira de Fisiologia do referido Collegio, havendo-se por apposentado o Lente Manoel José Estrella, que a serve; e propondo-os, disem contra o Embargado pela maneira melhor de Direito. P. ha de constar da Carta embargada, que o Embargado fora nomeado Lente da indicada Cadeira de Fisiologia do Collegio Medico Cirurgico desta Provincia, julgando-se vaga em consequencia de ser aposentado o Lente actual Manoel José Estrella; e que para obter huma tal nomeação allegara concorrerem em sua pessoa todos os requisitos necessarios, deixando ao mesmo tempo de referir a Lei em favor dos Embargados, e mesmo dos oppositores, e mais filhos do Collegio. E como similhante impetra, e o seu deferimento laborão em ob e subrepção esperão os Embargantes, que guardada a Lei, assim se lhes defina; por quanto. P. e he de Direito expresso, que toda e qual quer Carta, Provisão e Nomeação, Graça ou Mercê, que se haja impetrado callada a verdade ou contra Direito, he nulla, e necessariamente inesequivel - Ord. L.º 2 tit 43. Alv. De 30 de Outubro de 1751. P. que ainda considerando-se vagas a sobremencionada Cadeira de Fisiologia, não fora jamais para que a occupasse o Embargado, quer em rasão de lhe não concorrerem os requisitos necessarios, quer em rasão do Direito dos Embargantes - Em quanto a 1.ª por que. P. que as Cadeiras do Collegio Medico Cirurgico devem ser providas em filhos da Casa, que tenhão dado provas decisivas do seu merecimento a aptidão, assim por escripto, como de palavra, de maneira que tenhão verdadeiramente grangeado credito e reputação da sua capacidade e merecimento literario no juizo da Faculdade e Corpo academico L. de 11 de Dezembro de 1823 § 20 Art 179.
P. que ao Embargado nenhuma das ditas qualidades assiste, não só por que não he filho de Collegio, como porque não tem dado aquellas provas de sua capacidade literaria, não constando até com a necessaria authenticidade, que seja Graduado D.or em alguma Universidade estrangeira; o que he tanto mais de accreditar a vista do Aviso do Ex.mo Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio dirigido ao Presidente desta Provincia, em data de trez de Novembro em quanto que ali o Embargado não he nomeado com Gráo algum. Em quanto a 2.ª, por que. P. que pelos Estatutos do Collegio Medico Cirurgico desta Provincia, confirmadas pela Carta Regia de 29 de Desembro de 1815, são oppositores natos ás Cadeiras do mesmo Collegio os Cirurgioens ali formados, e que estes prefirão aos que o não forem Art. 16. Preferirão em todas os Partidos aos que não tiverem esta Condecoração. Serão desde logo Membros do Collegio Cirurgico, e Oppositores as Cadeiras deste Curso e das estabelecidas nesta Cid.e, e das que se hão de estabelecer em Maranhão e Portugal, e assim o confirmou a Lei de 9 de Setembro de 1820. P. que os Embargantes não só são Oppositores natos, como Substitutos 1.º em geral das Cadeiras do Collegio Medico Cirurgico, e o 2.º da de Opperaçoens e partos. Por conseguinte. P. quese o Embargado em sua impetra expossesse a verdade a seu respeito, e a respeito dos Embargantes com referencia a Lei, provavelmente não obteria a Nomeação embargada, por não ser crivel que lhe fosse conferida manifestamente contra a Lei, e os direitos dos Embargantes immediatamente, como mediatamente de todos os Filhos do Collegio. P. que a nomeação do Embargado ob e subrepticiamente impetrada, alem do mal, que em si enserra por isso mesmo que imposta inobservancia e infração notoria da Lei, e manifesta a injustiça e espolio aos Embargantes certamente contra todas as Intençoens de hum Governo Constitucional he de mais a mais perniciosa e nociva a Prosperidade do Estabelecimento, ajudando os Alumnos no progresso da sua carreira literaria por isso mesmo que lhes falta o melhor estimulo na espectativa de encontrarem no provimento das Cadeiras que vagarem no seu Collegio a recompensa do merecimento, serviços e trabalhos literarios. P. que os Embargantes são com effeito filhos do Collegio, Substitutos, como tem indicado as Cadeiras em geral o 1.º, e o 2.º de Opperaçoens e Partos, de capacidade e merecimento reconhecido; e ao mesmo tempo incapases de allegarem de falso. Nestes termos. P. e por se identificarem aos de Direito, embargada a Carta, que o Embargado impetrara, hão de indusir a sua nullidade, declarando-se ob e subrepticia, com todas as pronunciaçoens justas e consentaneas a litteral execução da Lei: Com ... Saudaveis. Pedro Baptista Nascimento". (26).
A propósito da demanda, os lentes do Colégio Médico-Cirúrgico enviam o Presidente da província o expediente seguinte:
"Ill.mo e Ex.mo Senhor
Tendo sido appresentado a este Collegio Medico Cirurgico o Decreto pelo qual fora Sua Magestade Imperial Servido nomear a Constantino Tavares de Macedo para a Cadeira de Fisiologia pela Jubilação do Lente Proprietario Manoel José Estrella e conjunctivamente apparecendo embargos ao Cumprimento do ditto Decreto, e posse do referido agraciado pelos dous Substitutos do Collegio, que se julgão gravemente lezados em seu Direito, esta Escola dirige a V. Ex.ca como primeira Autoridade da Provincia o requerimento dos dous Substitutos, seus embargos e o Decreto da Graça concedida afim de tudo ser levado a Presença do Governo de Sua Magestade Imperial donde tal Decreto emanou, não podendo ella dar posse, e nem fazer obra alguma, como bem determinão as Ordenaçoes do Reino de Portugal, que ainda hoje nos regem. Liv. 2.º Tit. 43, e 44, e o Alvará de 30 de 8br.º de 1751. Deos G.e a VEx.ca Bahia em Collegio 17 de Debr.º 1829
Ill.mo e Ex.mo Senhor Visconde de Camamú
Presidente desta Provincia
Manoel Jozé Estrella
José Lino Coutinho
Antonio Ferreira França
Jonathas Abbott
Fortunato Candido da Costa Dormund
Francisco Marcellino Gesteira
João Antunes d'Azevedo Chaves
João Baptista dos Anjos". (27).
Cópia de documento original, manuscrito, emitido pelo Colégio Médico-Cirúrgico, que faz parte do meu acervo particular de reprodução de fontes manuscritas originais, mostra que o conselheiro Batista era regente da cadeira de fisiologia e substituto da cadeira de cirurgia, consoante o seguinte documento datado de 29 de julho de 1830:
"Illmo e Exmo Senhor Presidente
O Collegio Medico-Cirurgico recebeo o Officio de 15 do Corrente em que V. Exª participa que Sua Magestade o Imperador Houve por bem conceder a Jonathas Abbott, Lente da Cadeira de Anatomia deste Collegio, licença por dous annos por o custo de seo Ordenado hir frequentar algumas Escholas da Europa, e augmentar poe essa forma os seos conhecimentos, sendo porem obrigado a reger a ditta Cadeira na sua ausencia hum dos respectivos Oppositores, em conformidade do que o mesmo Collegio tem nomeado o Oppositor e Substituto do quinto anno João Antunes de Azevedo Chaves para reger a ditta Cadeira; por se achar regendo a de Fisiologia João Baptista dos Anjos das Cadeiras Cirurgicas.
Deos Guarde a V. Ex.ª por delatados annos
Bahia 29 de Julho de 1830
Illmo e Exmo Senhor
Presidente da Provincia
D.r Jozé Avelino Barboza
Fortunato Candido da Costa Dormund
D.r Francisco Marcellino Gesteira" (28).
No início da sua extraordinária carreira no mundo da ciência médica, o jovem doutor João Baptista dos Anjos enamorou a virtuosa senhorinha D. Maria Magdalena Alvares, paixão que o levou a um afortunado himeneu em 1830.
A esse assunto, assim manifestou-se o doutor Seixas: "E pois, o Dr. João Baptista dos Anjos, entrou no grande mundo da sciencia e da profissão medica, airoso da sua victoria, e dominado profundamente do sentimento de gratidão para com seo tio Sebastião José dos Anjos, homem de bom coração, que muito o ajudou a chegar ao extremo da jornada, desposou a filha deste, D. Maria Magdalena Alves Baptista, sua prima, com quem viveo muitos annos, na mais estreita harmonia, e de cujo casamento teve dous filhos.
Esse consorcio traçou o caminho mais feliz, a primavera mais ditosa da existencia do Dr. João Baptista dos Anjos.
Preferindo a independencia de um viver modesto a todas as glorias, cerrava os olhos ao mundo, e concentrava-se na familia. Sua mulher, e seos filhos formavão toda a sua ventura".
"Há para o homem alguma cousa, que lhe serve ao mesmo tempo de berço e de azylo, onde elle nasce, se eleva e se desemvolve; que é o seo santuario, o inviolavel confidente de seos praseres e de suas dores — a familia".
Muito embora o ilustrado biógrafo tenha covivido com o doutor João Baptista dos Anjos, como condiscípulo, colega de profissão e na condição de lente e de membro da congregação da Faculdade de Medicina da Bahia, privando, por conseguinte, da sua familiaridade e intimidade, comete o provecto doutor Seixas, enganos no que diz respeito aos nomes das pessoas por ele citadas no magnífico panegírico.
Assim é que, mergulhando no fascinante passado para conhecer de perto a luzidia vida do conselheiro João Baptista dos Anjos, tive a fortuna de, decorridos 192 anos, conhecer, na sua intimidade, o conselheiro João Baptista dos Anjos, o seu caráter e personalidade, com mais agudeza de percepção do que os seus ilustres coevos, mercê de perspicaz e exaustiva pesquisa em livros de assentamentos de batizados, casamentos e óbitos, testamentos e inventários, termos de exames e atas da Faculdade de Medicina, atas da congregação da Faculdade, memórias históricas da Faculdade, além de consultar correspondências oficiais em catadupas.
Verifiquei, destarte, que o nome do sogro, Sebastião José dos Anjos, não está em correspondência com o nome consignado no assentamento do casamento do conselheiro, ressaltando-se, por oportuno, o engano, já por mim esclarecido, a respeito do seu genitor.
Eis, na íntegra, o teor dos termos do casamento do conselheiro João Baptista dos Anjos:
"Aos seis dias do mes de Fevereiro de mil oitocentos etrinta, nesta Matris de Santo Antonio Alem do Carmo, com despença de banhos e igualmente puder se cazar depois de Ave Marias, por despacho de Sua Excellencia Reverendissima, datado em doze de janeiro corrente anno, o que fica em meu poder, tendo prestado juramento de estillo, e não resultando impedimento algum canonico, justa Tridentinum, com palavras de presente, e mutuo consentimento, em minha prezença; Celebrarão o Sacramento do Matrimonio João Baptista dos Anjos, filho legitimo de Pedro de Jesus; e Thomazia Leonel dos Anjos, já fallecidos, e Dona Maria Magdalena Alvares, filha legitima de Sebastião José de Santa Anna e Gertrudes Valerianna de Almeida, o contrahente, natural e baptizado na Freguezia da Sé e a contrahente na de Santo Antonio Alem do Carmo: Presidirão por testemunhas o Cirurgião formado Vicente Ferreira de Magalhans, e Sebastião Jozé de Santa Anna; Receberão as benções nupciais na forma do Ritual Romano e Constituições do Arcebispado; epara constar se fes este assento em que me assigno com as sobreditas testemunhas = Era ut supra. O Vig.ro Joaq.m Manoel Guerr.º Vicente Ferreira de Magalhães -
Sebastião Jozé de S.ta Anna
N.B. a Prim.ª test.ª moradora na Freg.ª de Santa Anna do Sacram.to e a 2.ª nesta Freg.ª" (29).
Cf. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador — Livro de assentamento de casamentos - Freguesia de Santo Antonio Além do Carmo — Período de 1816 a 1840 - Fls. 117/117 - V.
E prossegue o lente Seixas: "Nos risos desse ditoso hymenêo, o Dr. Baptista dos Anjos ainda colhêo duas flores, que mais perfumarão o jardim dessa sua primeira felicidade.
Seos dous filhos, por elle encaminhados seguirão o exemplo de seo pae. Ambos forão doutores em Medicina".
Pesquisando os livros de registros de batizados, encontrei o seguinte assentamento:
"Aos dezaceis de Janeiro de mil Oito centos etrinta ehum Baptizou solennimente, apos os Santos Oleos oReverendo Conego Cura Faustino Jozé de Araujo á João branco nascido avinte de Novembro de mil oito centos e trinta; filho legitimo de João Baptista dos Anjos, e Dona Maria Magdalena Alvares. Padrinho oReverendo Vigario de Santo Antonio Alem do Carmo Joaq.m Manoel Guerreiro. Tocou a Coroa de Nossa Senhora o Ajudante Manoel Francisco Serapião. Do que fiz este assento, que assignei.
O Coad.or João Thomaz de Souza" (30).
Cf. Arquivo da Cúria Arquidiocesa de Salvador - Livro de assentamento de batizados - Curato da Sé - Período de 1829 a 1853 - fl. 24.
"Aos trinta de Dezembro de mil oitocentos e trinta e dous, nesta Igreja da Sé oRveren.do Coadjutor Antonio Eleuterio de Araujo Lima pos os Santos Oleos á Antonio, branco, nascido atreze de Maio, filho legitimo do Doutor João Baptista dos Anjos, e Dona Maria Magdalena de Almeida. Padrinho Sebastião José da Freguezia de Santa Anna e sua mulher Dona Gertrude Valeria de Almeida. Do que fiz este assento, que assinei.
O Cura Encomd.º João Thomaz de Sz.ª" (31).
Cf. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador — Livro de assentamento de batizados - Curato da Sé - Período de 1829 a 1853 — Fl. 56.
Observe-se neste assentamento os registros discordantes e desconexos feitos pelo cura Encomendado respeitantes ao nome da esposa do conselheiro Baptista.
Dando seguimento a sua dissertação, o lente Domingos Rodrigues Seixas tece considerações em derredor da vida profissional do ilustre biografado:
"... o Dr. Baptista dos Anjos, cuja intelligencia sempre inspirou-se na fé, conhecendo a necessidade de ampliar seus estudos, viajou á Europa: frequentou os melhores hospitaes, e dedicando-se mais positivamente as molestias dos olhos, e ás operações reclamadas por toda sorte de enfermidades do importante apparelho da visão, voltou á esta Provincia mais seguro de suas habilitações, e por tal modo demonstrou a instrucção e practica que bebera naquelle grande mundo da ilustração e do saber, que gosou de geral aceitação, e tornou-se nessa especialidade um medico distincto.
Já muito conhecido então por suas luzes, e pela pericia com que exercia a profissão em varios ramos, foi um clinico de primeira plana, e sua opinião nas conferencias, era pelos seos collegas respeitada pela segurança de seo juiso a cabeceira do enfermo.
Emquanto o Dr. João Baptista ganhava aura com os de mais de seo tempo, partião das altas regiões do poder os echos vagos de uma reforma no antigo Collegio Medico cirurgico, reforma que mais tarde effectuou-se, e em virtude da qual foi indeclinavel a admissão do Dr. João Baptista dos Anjos, uma das melhores illustrações medicas daquella epoca.
De feito: foi nomeado lente da cadeira de Hygiene, a qual servio de mais nobre incentivo para tornar patente suas habilitações e profundo saber, por meio de lições oraes, reunindo ao estylo facil e correcto, a palavra clara e concisa.
Nós que fomos seo discipulo, sentimos subido prazer ao offerecer-se esta occasião de dar mais um publico testimunho de nosso reconhecimento á esse ilustrado mestre.
Nessa honrosa missão do magisterio, por penosa e fatigante que fosse, nesse continuo caminhar de lucubrações e afans, o nosso benemerito da sciencia jamais encostou o bordão do cansaço. Sempre o mesmo, apezar de velho, sempre forte e dedicado no seo posto de honra, parecia disposto a todo trabalho que a sciencia, e o paiz delle exigissem".
Na qualidade de lente, o conselheiro João Baptista dos Anjos teve honrosa e histórica participação, ao lado dos seus ilustres pares, na transferência do Colégio Médico-Cirúrgico, que funcionava na Casa da Santa Misericórdia, para, já como Faculdade de Medicina da Bahia, em razão da Lei de 3 de outubro de 1832, ocupar as instalações do antigo "Real Hospital Militar", sita ao Terreiro de Jesus, que retornou ao outeiro de Nossa Senhora da Palma, tornando a funcionar nas primitivas instalações do Hospício de Nossa Senhora da Palma.
É o que exibe a cópia da documentação original, manuscrita:
"Illmo e Ex.mo Snrs
Devendo a Escola de Medicina desta Cidade ser transferida da Caza da Misericordia em que existe para outro edificio muito mais amplo e espaçoso, por não haver alli os precisos commodos para o estabelecimento das Aulas, Biblioteca, laboratorio Chimico, Gabinete de Phisica, de Anatomia, e de Materia Medica, Secretaria, e outros arranjos, conforme a Lei de Outubro do anno proximo passado; tendo o Governo Central concedido á Escola do Rio de Janeiro todo o edificio que servira de Hospital Militar; e existem desocupada, nesta Cidade, a Caza de propriedade nacional, que outrora tivera igual emprego, e onde bem se realizão as condições do artigo 16 da mencionada Lei: a Faculdade de Medicina indigita á V Ex.ª a referida casa para o fim exposto, pedindo somente o andar de cima, a Botica com a casa que lhe pertence, e a Enfermaria denominada d'Assumpção com os quatro pequenos quartos que lhe são annexos.
Deos guarde a V Ex.ª Bahia 12 de Março de 1833.
Ill.mo e Ex.mo Presidente desta Provincia
D.r Jozé Avellino Barboza
João Baptista dos Anjos
João Antunes d'Azevedo Chaves
D.r Francisco Marcellino Gesteira
Fortunato Candido da Costa Dormund
D.r Jonathas Abbott
Francisco de Paula de Araujo e Almeida" (32).
Sofreu o conselheiro João Baptista dos Anjos apreciável abalo nos "bens móveis" com a fuga de um escravo de sua propriedade. Assim é que, no dia 14 de julho de 1836, desapareceu um seu escravo "ladino, nagô", de nome Estácio, pertencente em outro tempo a Mathias Baptista de Carvalho. O dito escravo era muito moço, bastante alto e carregador de cadeira. Quando deu às de vila-diogo, usava uma camisa de brim, calça de aninhagem, e "vestia de pano azul". Quem o capturasse, deveria entregá-lo ao conselheiro Baptista, na casa de residência no Cruzeiro de São Francisco, na Freguesia da Sé, ou a Jeronimo José Barata, "com Botica ao Terreiro". Seria recompensado com 50 $ Rs. (33).
O Conselho de Salubridade Pública, criado pela lei provincial nº 73, de 15 de junho de 1838, sendo presidente da província o conselheiro Thomaz Xavier Garcia d'Almeida, iniciou suas atividades rotineiras a partir de 15 de fevereiro de 1840, teve, como um dos seus mais preclares membros, o conselheiro Baptista, em 1841, conforme está exarado no seguinte documento:
"Ill.mo e Ex.mo Snr.
O Conselho de Salubridade, em virtude do Art. 3º da lei de sua creação, sujeita á approvação de V Exª a nomeação que fez para Membros correspondentes dos individuos Seg.es
D.r Fortunato Candido da Costa Dormund - Medico
D.r João Baptista dos Anjos "
D.r Vicente Ferreira de Mag.es "
D.r João Antunes de Azevedo Chaves "
D.r Prudencio Jozé de Souza Brito Cotigipe "
D.r Manoel Ladisláo Aranha Dantas "
D.r Elias Jozé Pedroza "
D.r Jozé de Goes Siqueira "
D.r Mathias Mor.ª Sampaio "
D.r Raphael Pilate Baggi "
D.r Hahnemann "
D.r Roberto Dundás "
Manoel Roiz' da Silva Pharmaceutico.
D.s guarde a V. Ex.ª Bahia 4de Outubro de1841
Ill.mo e Ex.mo Senr' Presidente da Provincia
Justiniano da Silva Gomes
V. P. do Conselho de Salubrie" (34).
A 28 de abril de 1841, o governo imperial concedeu ao doutor João Baptista dos Anjos seis meses de licença para tratar da sua saúde no Velho Mundo, consoante está registrado no seguinte manuscrito:
"Ill.mo e Ex.mo Snr.
Sua Magestade o Imperador Attendendo ao que lhe representou o Doutor João Baptista dos Anjos, Lente da Escola de Medicina da Capital d'essa Provincia Houve por bem, por Portaria d'esta data, Conceder-lhe seis mezes de licença a contar do dia em que d'ella participar e utilizar-se, com os respectivos vencimentos na forma da Lei; a fim de ir á Europa tratar de sua saúde, O que participo a V. Ex.ª para sua intteligencia e em resposta ao seu Officio de 3 do corrente mez sobre este objecto.
Deus Guarde a V. Ex.ª - Palacio do Rio de Janeiro em 28 de Abril de 1841.
Candido Jozé de Araujo Viana
Sñr. Presidente da Provincia da Bahia" (35).
A dita licença foi prorrogada por mais três meses, com metade dos vencimentos, através de portaria datada de 16 de dezembro de 1841, conforme se lê no aviso recebido pelo presidente da província da Bahia, emitido pelo Ministério do Império (originais):
"Ill.mo e Ex.mo Sñ.r
Sua Magestade o Imperador, Attendendo ao que lhe representou o Doutor João Baptista dos Anjos, Lente da Escola de Medicina da Capital d'essa Provincia: Houve por bem por Portaria d'esta data, Prorogar por tres meses com metade dos seus vencimentos a licença que por seis meses lhe foi concedida por Portaria de 28 de Abril do corrente anno, para tratar da sua saúde na Europa, O que participo a V. Ex.ª. Palacio do Rio de Janeiro em 16 de Dezembro de 1841.
Candido Jozé de Araujo Viana
Sñr Presidente da Provincia da Bahia". (36).
Expectativa, curiosidade e suspeição tomam conta da Faculdade de Medicina da Bahia, em decorrência da assaz prolongada licença para tratamento da saúde, requerida em 1841 pelo doutor João Baptista dos Anjos, conforme se observa ao exame dos seguintes documentos:
"Ex.mo Snr.' Presidente
Diz João Baptista dos Anjos, Doutor em Medicina, e Lente na Escolla, por seo Procurador o Ten.e Manoel Francisco Serapião, que tendo-se-lhe finalizado a licença de hum mez por V. Ex.ª concedida em 8br.º do anno passado, e como lhe não tenha chegado o Aviso da licença que requereo a S.M.I., vem requerer a V. Ex.ª lhe conceda mais trez mezes de licença com metade dos seos vencim.tos, visto que na Orbita das attribuiçoens de V. Ex.ª, concedida pela Ley, está o poder prorrogal-a, e conceder em cada anno a qual quer empregado tres mezes de licença; portanto
P. a V. Ex.ª se digne assim lhe conceder pelo que espera
E. R. M.
Procurador Manoel Franc.º Serap.m" (37).
No frontispício deste documento e na sua margem estão registrados os seguintes despachos:
No frontispício: "Remettido ao Snr.' Director da Faculdade de Medicina para informar com o que se lhe offerecer acerca do que pretende o Supp.e neste requerimento. B.ª 13 de Janr.º de 1833"
Ainda no frontispício: "Passe Portaria p.ª tres meses de licença;
req.r sem ordenado. B.ª 16 de Janr.º de 1844"
Na margem do documento: "P. P. em 31 de Janr.º — Off.º ao Director da Faculd.e e ao Intend.e da Mar.ª"
Conclui-se, ainda, que pelo despacho exarado no documento de petição, não datado pelo procurador Manoel Francisco Serapião, que o conselheiro Batista já era, na época, médico da Armada Imperial, como veremos adiante.
Eis a resposta do Diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, doutor Francisco de Paula Araujo e Almeida, ao despacho do presidente da província, exarado no dito requerimento:
"Ill.mo e Ex.mo Senr.'
Em conformidade do despacho de V. Ex.ª exarado no requerimento, que devolvo, cumpre informar, que me consta por pessoa fidedigna existente em Paris, que o Doutor João Baptista dos Anjos ali se achava em Agosto do anno passado tratando da sua saúde; e que, comquanto melhorado, não estava todavia ainda restabelecido da enfermidade, que o obrigára a emprehender aquella viagem. A isto devo acrescentar, que a ausencia d'aquelle honrado e illustrado Lentre não causa presentemente prejuizo algum á Eschola de Medicina, visto achar-se ella em ferias; e que portanto me parece estar no caso de obter a licença, que requer.
Deos guarde a V. Ex.ª Bahia 15 de Janeiro de 1844 -
Ill.mo e Ex.mo Presidente da Provincia
Francisco de Paula Araujo e Almeida
Director da Faculdade de Medicina" (38).
Mais uma vez, o procurador Manuel Francisco Serapião enviou ao presidente da província, sem data, um novo requerimento de prorrogação por mais quatro meses de licença, sem vencimentos, para tratamento, na Europa, da saúde do conselheiro Baptista.
Eis o teor:
"Ex.mo Snr.' Presidente
Diz João Baptista dos Anjos, Doutor em Medicina, e Lente na Escholla, por seo Procurador o Ten.e Manoel Francisco Serapião, que tendo finalisado a licença de tres meses, sem vencimento, concedida por S. M. I., para na Europa tratar de sua saude, e não tendo ainda chegado a prorogação de mais tres meses, que a S. M. I. requereo; e para que não lhe sirva de prejuiso ao seo emprego a falta de licença, vem supplicar a V. Ex.ª, lhe conceda a prorogação de mais quatro meses de licença sem vencimento algum, tempo este, que tem o Supp.e calculado ser sufficiente para regressar e achar-se nesta Provincia, e Imperio: portt.º
P.a V.Ex.ª se digne differir-lhe na conformidade,
do q.to requerido tem, o que espera
E. R. M.
Procurador Manoel Franc.º Serapião" (39).
Estão exarados os seguintes despachos:
No frontispício: "Remettido ao Snr.' D.r Director da Faculd.e de Medicina p.ª informar com o que se lhe offerecer sobre o que req.r o Supp.e. Bahia 5 de Julho de 1844".
Ainda no frontispício lê-se o despacho: "Passe Portaria p.r mais tres meses de licença sem ordenado, pagos os dir.tos; ficando porem dependente a ref.da licença da approvação do Gov.º Imp.al, a quemse vai dar conta, na conformidade"
E na margem: "P. P. em 15 de Julho dito".
Eis a resposta do diretor da Faculdade de Medicina, doutor João Francisco de Almeida, ao despacho do presidente da província:
"Ill.mo e Ex.mo Snr.'
Em observancia ao despacho de V. Ex.ª exarado no requerimento do D.r João Baptista dos Anjos, que devolvo a V. Ex.ª, tenho a dizer que se acha finalisado o prazo da ultima prorogação da licença com que se acha na Europa tratando da sua saude, que pelas noticias dadas pelo D.r Justiniano da S.ª Gomes, chegado ultimamente de Pariz, elle ficava quasi restabelecido, e apromptando-se para regressar a esta Cidade, e que devendo-se suppôr, segundo o seo bom comportamento, que essa demora provenha de motivos mui ponderosos, pois já se acha sem vencimentos, não julgo fora de proposito sua pretenção: V. Ex.ª porem fará o que for de justiça.
D.s G.e a V. Ex.ª. Bahia 10 de Julho de 1844
Ill.mo e Ex.mo Snr.' Prezidente da Provincia
João Francisco de Almeida
Director" (40).
No frontispício do sobredito documento estava exarado: "Off.os p.ª os Senr.s Ministros do Imperio, e Mar.ª em 13 de Julho de 1844"
Às informações do diretor da Faculdade de Medicina, oficiou o presidente da província da Bahia nos seguintes termos:
"O Presidente da Provincia attendendo ao que lhe requereu o D.r João Baptista dos Anjos, Lente da Faculdade de Medicina d'esta Cidade, lhe concede tres mezes de licença sem ordenado, ficando porem dependente esta licença da approvação do Governo Imperial. Esta se passou, depois de pagos os respectivos direitos. e será apresentada na thesouraria da Fazenda, e na Intendencia da Marinha, para os devidos assentamentos - Palacio do Governo da Bahia 15 de Julho de 1844 -
Joaquim José Pinheiro de Vasc.os" (41).
A dilação da licença para tratamento da saúde do conselheiro Baptista continuou, consoante o requerimento do lente da Faculdade de Medicina da Bahia, desta vez firmado por um novo procurador, João Antonio Pimenta, sem data, como de costume, concluindo-se, ter sido emitida em outubro de 1844, pelo exame das datas dos despachos exarados no dito documento.
"Snr' Presidente
Diz João Baptista dos Anjos, Doutor em Medicina, e Lente na Escolla por seo Procurador João Antonio Pimenta, que tendo-se finalisado a licença de dous mezes, concedida pelo antecessor de V. Ex.ª para elle tractar de sua saude na Europa, onde se acha, no ultimo do proximo passado mez, e não lhe tendo ainda chegado a de seis mezes, q' á S. M. I. impetrou, e para que não fique elle sem licença, e por falta della prejudicado no seu direito acerca da Cadeira que ensina na dita Escolla de Medicina, e Hospital da Marinha, vem requerer a V Ex.ª a prorogação de mais trez mezes de licença sem vencimento algum visto estar elle, segundo as cartas dirigidas a dias a sua mulher, prestes a chegar: portanto
P. a V Ex.ª seja servido conceder-lhe
a referida licença de trez mezes,
q' espera
E R Mce
João Ant.º Pimenta" (42).
Estavam exarados no frontispício do requerimento os seguintes despachos:
"Inf.e o Senr.' D.or Director
da Faculd.e de Medicina com o que
se lhe offerecer sobre o q. pretende
o Supp.e B.ª 24 de 8br.º de 1844
Leão"
"Passe Portaria p.ª tres mezes de licença sem ordenado, pagos os respectivos dir.tos, ficando elle depend.e da approvação do Gov.º Imp.al, a quem se vai dar conta. B.ª 29 de 8br.º de 1844
Leão"
Na margem: "P. P. 30 8br.º 1844
Pg. 3$000 de Direitos Prov.es - B.ª 30 de 8br.º de 1844
(Rubricas)"
O diretor da Faculdade de Medicina, doutor João Francisco de Almeida, informou a respeito do despacho do presidente da província:
"Ill.mo e Ex.mo Snr'
Devendo em observancia do despacho de V. Ex.ª de 24 do corrente informar sobre o requerimento, que a essa Prezidencia dirige por seo Procurador o D.r João Baptista dos Anjos, Lente d'essa Eschola actualmente na Europa a tratar de sua saude com licença do Governo de Sua Magestade o Imperador; que sendo finalizada foi prorogada pelo antecessôr de V Ex.ª; tenho a dizer que se acha finalizado o prazo da ultima prorogação, e que segundo as informações obtidas pelo D.r Justiniano da Silva Gomes, chegado de Paris no primeiro de Junho do corrente anno, elle ficava apromptando-se para regressar a Bahia por todo Setembro; e assim ou elle deve estar em viagem e prestes a chegar, conforme me informa o seo Correspondente e Procurador, ou então algum motivo forte e ponderozo he causa de sua doença, pois que a vista de seo sempre mais louvavel comportamento, se não pode supor outra cousa; por tanto não julgo injusta sua pretenção á que V. Ex.ª deffinirá como achar de justiça.
D.s G.e a V. Ex.ª Bahia e Eschola de Medicina 26 de Outubro de 1844
Ill.mo e Ex.mo Snr.' Presidente da Provincia
João Francisco de Almeida
Director da Faculdade" (43).
No frontispício:
"Off.º p.ª o Ministerio do Imperio em 29 de 8br.º de 1844"
Não encontrei documentos indicando a data do retorno do conselheiro Baptista, todavia à luz dos expedientes por mim encontrados, transcritos a seguir, faz-se supor que o lente Baptista já se encontrava nesta cidade no mês de dezembro de 1844, face as informações do diretor da Faculdade ao presidente da província afirmando que nenhum empregado da Faculdade de Medicina se encontrava, naquela época, em gozo de licença.
Por outro lado, coincidentemente com as contínuas dilações da licença solicitada pelo conselheiro para tratamento da sua saúde na Europa, o Secretário de Estado dos Negócios do Império, por Aviso de 30 de novembro de 1844, disciplinou por ordem do imperador, e especificamente para a Faculdade de Medicina da Bahia, a concessão de licenças aos lentes daquela instituição.
É o que está exarado nos documentos transcritos a seguir:
"Ill.mo e Ex.mo Snr.'
Tendo recebido com o officio, que V. Ex.ª me dirigio em data de 14 do corrente para ser prezente a esta Faculdade a copia do Avizo da Secretaria d'Estado dos Negocios do Imperio de 30 de Novembro, em que S. M. o Imperador ordena que quando por esta Provincia se houver de conceder licenças aos Lentes desta Eschola, se lhes marque prazo, fóra do qual ellas não possam mais servir e isto por ter constado ao Governo de S. M. I., que alguns Lentes e Empregados com motivos justificados obtinhão licenças e que as guardavão para aprezentarem quando lhes era conveniente em prejuizo do ensino publico; tenho a honra de asseverar a V. Ex.ª que ainda de tal procedimento não teve lugar por esta repartição, e isso desde o tempo de sua criação, pois que bem poucos Lentes tem requerido e obtido licenças; e então ellas tem sido aprezentadas e gozadas em seo tempo devido.
D.s G.e a V. Ex.ª Bahia 19 de Dezembro de 1844
Ill.mo e Ex.mo Presidente da Provincia
João Francisco de Almeida
Director" (44)
"Ill.mo e Ex.mo Senr.'
Respondendo ao officio, que V Ex.ª me dirigio em 20 do corrente exigindo uma relação dos empregados desta repartição que estejão ao prezente no gozo de licenças com declaração do tempo total, principio e fim dellas: cumpre-me dizer que nenhum empregado desta repartição se acha ao prezente no gôzo de licenças.
Deos guarde a V. Ex.ª. Bahia 23 de Dezembro de 1844
Ill.mo e Ex.mo Senr' Tenente General
Presidente da Provincia
João Francisco de Almeida
Director da Faculdade de Medicina" (45)
A "Academia de Sciencias Medicas da Bahia", fundada a 26 de março de 1848 e solenemente instalada à 1 hora da tarde de 5 de abril do mesmo ano, "no salão dos doctoramentos da Faculdade de Medicina", teve como seu primeiro presidente, o "Senr. D.or João Baptista dos Anjos e V. P. Man.l Ladisláo Aranha Dantas", preexistindo, por conseguinte, historicamente, à atual Academia de Medicina da Bahia, fundada a 10 de julho de 1958. (46).
Retornando ao panegírico elaborado pelo lente Domingos Rodrigues Seixas, vamos saber da sua atuação como médico da Marinha Imperial:
"No exercicio da nobre profissão médica, o illustre finado teve muitas occasiões de ufanar-se, reconhecendo que a humanidade bem dizia, com justa razão, de seo acreditado nome.
Muitos são os factos: porém citaremos os mais salientes, afim de justificarmos os relevantes serviços prestados pelo distincto conselheiro.
O hospital de marinha desta cidade, confiado por muitos annos a sua direcção, é uma eterna lembrança do acrisolado disvelo, com que o Dr. Baptista dos Anjos cuidou dos enfermos da armada brazileira, os quaes erão e são ainda, alli recolhidos, para receberem todo zelo e protecção dignos de louvor e da civilisação do paiz.
Nessa immensa eschola de observações, o incansavel conselheiro era por demais dedicado, incumbindo-se não só da parte therapeutica, como da parte cirurgica, praticando todas as operações reclamadas pela natureza das lesões.
Seos serviços forão de tal ordem, que apesar da creação do quadro da armada, do qual não era possivel excluir um pratico consumado e por tantos annos habituado a medicar os enfermos maritimos, foi elle conservado, por execepção gloriosa, até que por fim, faltando-lhe já forças para dedicar-se, como lhe cumpria e havendo numero sufficiente de medicos, encarregados pela lei de servir no mesmo hospital, pedio sua exoneração, e obteve-a do Governo Imperial".
Relativamente à sua brilhante passagem como médico da marinha brasileira, encontrei documentos dando conta de alguns episódios de sua vida naquela instituição.
Em 1850, o doutor João Baptista dos Anjos requereu que seus vencimentos fossem igualados aos percebidos pelos primeiros-cirurgiões do hospital de marinha da corte, cuja resposta foi exarada nos seguintes termos:
"Havendo Sua Magestade O Imperador Indeferido o requerimento que V. Ex.ª me remetteo com officio n.º 180, de 22 do mez proximo preterito, e em que o D.or João Baptista dos Anjos, medico do Hospital de Marinha d'essa Provincia, pede ser igualado em vencimentos dos primeiros Cirurgiões do Numero empregados no Hospital de Marinha d'esta Corte, assim o communico a V Ex.ª, para seo conhecimento, e para o fazer constar ao supplicante. Deos Guarde a V. Ex.ª. Palacio do Rio de Janeiro em 20 de Julho de 1850
Manoel Vieira Costa
(Ao) V. Prezidente da Prov.ª da Bahia". (47).
O sobredito documento refere-se a aviso recebido do Ministério da Marinha pelo presidente da província.
Em 1852, o presidente da província da Bahia, Francisco Gonçalves Martins, recebeu do Ministério da Marinha o seguinte aviso:
"Respondendo ao Officio que V. Ex.ª me dirigio, com data de 24 de Outubro do anno proximo findo sob n.º 15, acerca da pretenção dos Doutores João Baptista dos Anjos e Manoel Ezequiel de Almeida; tenho de significar a V. Ex.ª que Sua Magestade O Imperador, a vista das informações que a tal respeito d'evão o Contador Geral em 9 do corrente, sob n.º 442, e o Auditor Geral da Marinha, com data de 24 d'este mez, não Houve por bem Deferir a semelhante pretenção.
Deos Guarde a V. Ex.ª. Palacio do Rio de Janeiro em 27 de Fevereiro de 1852.
Manoel Vieira Costa
Senr. Francisco Gonçalves Martins". (48).
Consultei um documento que mostra o doutor João Baptista dos Anjos em atividade como médico da marinha, encaminhando expediente ao presidente da província:
"Tenho a honra de devolver a V. Ex.ª o requerimento do Segundo Tem.e da Armada, Domingos Joaq. da Fonseca com o Parecer Medico exigido pelo despacho do m.mo requerimento -
Deos Guarde a V. Ex.ª. Bahia 15 de Dezembro de 1852.
Ill.mo e Ex.mo Snr Vice - Presidente da Provincia
D.r João Baptista dos Anjos
Medico do Hosp.al de Mar.ª" (49).
Interessante manuscrito revela que o Governo mandou ressarcir o conselheiro Baptista do dinheiro por este pago a um colega que o substituiu no serviço do hospital da marinha, enquanto esteve na Europa.
Ei-lo, na íntegra:
“Decreto n.º 879 de 17 de Setembro de 1856
Autorisa o Governo a mandar pagar ao Doutor João Baptista dos Anjos a quantia de um conto duzentos e dez mil trezentos e sessenta e nove reis. Hei por bem por bem Sancionar e Mandar que se execute a seguinte Resolução da Assemblea Geral Legislativa:
Artigo Único. O Governo é authorisado a mandar pagar ao Doutor João Baptista dos Anjos a quantia de um conto duzentos e dez mil trezentos e sessenta e nove reis, que pagou ao Facultativo que o substituiu no serviço do Hospital da Marinha da Provincia da Bahia, durante a sua estada na Europa de mil oitocentos e quarenta e um a mil oitocentos e quarenta e quatro, ficando-lhe para este fim aberto o competente credito e revogadas as disposições em contrario. João Mauricio Wanderley, do Meo Conselho. ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Marinha, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em dezesete de Setembro de mil oitocentos e cinquenta e seis, trigesimo quinto da Independencia do Imperio. Com a rubrica de Sua Magestado O Imperador, João Mauricio Wanderley. Cumpra-se e registre-se. Palacio do Rio de Janeiro em 16 de Setembro de 1856. Wanderley, Secretario de Estado dos Negocios da Marinha em 23 de Setembro de 1856.
Fran.co H.er Bomtempo” (50).
Belíssima demonstração da valorosa tenacidade e do invulgar prestígio do preclaro conselheiro João Baptista dos Anjos!
O decreto acima serve para esclarecer o período de licença do doutor Baptista, enquanto esteve na Europa: quatro anos!!!
O notável decreto foi encaminhado ao presidente da província da Bahia, através de seguinte expediente:
“Rio de Janeiro – Ministerio dos Negocios da Marinha em 23 de Setembro de 1856
Ill.mo e Ex.mo S.r
Transmito a V. Ex.ª, por copia, para sua intelligencia o Decreto N.º 879 de 17 do corrente, autorisando o Governo a mandar pagar ao Doutor João Baptista dos Anjos a quantia de um conto duzentos e dez mil tresentos sessenta e nove reis e previno a V. Ex.ª de que era officio do Ministerio da Fazenda, para effectuar-se semelhante pagamento: o que V. Ex.ª para constar ao referido Doutor.
Deos Guarde a V. Ex.ª
João Mauricio Wanderley
Snr. Presidente da Provincia da Bahia”. (51).
Perlustrei o aviso emitido pelo Ministério da Marinha ao presidente da província da Bahia, com data de 3 de Janeiro de 1860, evidenciando o pedido de demissão do doutor Baptista do lugar de 2º cirurgião do Corpo de Saúde da Armada.
Ei-lo:
“Rio de Janeiro – Ministerio dos Negocios da Marinha em 3 de Janeiro de 1860
Ill.mo e Ex.mo Sr
Por Aviso desta data foi approvado a proposta apresentada pelo Cirurgião Mór da Armada para que o 1.º Cirurgião D.or João José Damaz.º passe a servir no Hospital da Marinha dessa Provincia em substituição ao Conselheiro D.or João Baptista dos Anjos, aquem por Decreto de 15 do mez ultimo se concedeu a demissão que pedio do Lugar de 2.º Cirurgião do Corpo de Saude da Armada. Nesta conformidade V. Ex.ª expedirá as convenientes ordens.
Aproveito a opportunidade para renovar a V. Ex.ª os meus protestos de estima e consideração.
Francisco Xavier Paes Barreto
A S. Ex.ª o Sn.r Presidente da Provincia da Bahia” (52).
A sobredita correspondência revela que, em 1860, o doutor Baptista já havia recebido o título de Conselheiro, como veremos adiante:
Voltando ao necrológio obrado pelo lente Seixas, informações são fornecidas em torno da atuação do doutor Baptista dos Anjos no enfrentamento das epidemias que flegelaram a província da Bahia no meado do século XIX:
“No anno de 1849, quando sobre esta provincia esvoaçou o anjo exterminador das populações, trasendo-nos a febre amarella, que atacou o ancoradouro, e estendeo-se a capital e ao interior, produzindo na nossa provincia desimações horriveis, obrigando o Governo provincial a empregar medidas que servissem de obice a continuação do flagello, e nomear medicos, que pelas freguezias se prestassem ao tractamento dos infelizes attacados, foi o conselheiro Baptista dos Anjos um dos mais afamosos no desempenho dessa nobre missão, tão árdua, quanto perigosa. Depois de alguns annos, observou o Governo, em vista das reclamações dos medicos, as quaes darão logar a correspondencia official da presidencia com as competentes auctoridades, que a epidemia de variola, annualmente, quer na capital, quer no centro da Provincia, augmentava a mortandade, sem que o precioso preservativo, a vaccina, obstasse o desenvolvimento e a marcha dessa epidemia funestissima.
O mao estado da vaccinação no interior da Provincia, o descuido dos vaccinadores, o deleixo de algumas auctoridades em velar sobre a conservação do humor vaccinico, os prejuisos populares da gente ignorante nos lugares pouco civilisados, onde se preferia a inoculação do virus variolico a do puz vaccinico; e finalmente a dificuldade de encontrar o cowpox, fonte verdadeira da propagação da vaccina, erão cousas, que actuavão sobre a natureza do preservativo, cujo estado precisava ser confiado a um medico de alta illustração e criterio, o qual depois de trabalhos experimentaes, da rigorosa observação dos factos, e do aprofundado estudo, podesse esclarecer o Governo em questão tão difficil como melindrosa.
Pois bem: o Governo da Provincia designou o ilustre conselheiro, de cujas luzes esperava a solução desse importante problema, afim de poder deliberar sobre um assumpto que disia respeito ao bem geral da população.
Com effeito, o conselheiro Baptista dos Anjos, produsio um trabalho digno delle e da sciencia, patenteando subidos conhecimentos, e firmando mais uma vez a gloria de sua reputação”.
Em 1855, o presidente da província da Bahia, Alvaro Tiberio de Moncorvo e Lima adotou rígidas medidas sanitarias mercê dos funéros sucessos que ocorreram na província, desde que o vapor “Imperatriz”, procedente da província do Pará, desembarcou, a 20 de julho de 1855, um colérico na povoação do Rio Vermelho, dando início, destarte, ao flagelo da cólera-morbo, enfermidade de “mau caráter” que dizimou considerável parcela da população provincial.
Para implementação das enérgicas e precisas providências, o presidente da província, amparando-se na douta Comissão Central de Higiene Pública, sucessora do antigo Conselho de Salubridade Pública, determinou, entre outras medidas, a instalação de postos de socorros nas freguesias atingidas pela epidemia colérica, além de prover visitas domiciliares às pessoas pobres acometidas da grave enfermidade.
O doutor Baptista dos Anjos foi convocado, segundo mostra as circulares:
“Circular aos Drs. e’ Medicina abaixo declarados:
ll.mos Snr.s De ordem de S. Ex.ª o S.r Vice-Presid.e da Provincia, convido V. S.ª para que haja de comparecer hoje em Palacio do Governo pelas 3 horas da tarde, para termos conferencia sobre negocio concernente a salubridade publica. Deus Guarde a V. S.ª Secretaria do Governo da Bahia 24 de julho de 1855 = L. M. A. F. Munis Barretto
Illmmos Snrs D.rs” (53).
(Segue-se relação nominal dos mais notáveis médicos daquele tempo. Além do lente doutor João Baptista dos Anjos, foram convocados expressivos representantes da ciência e medicina da Bahia, tais como: doutores Antonio José Alves, Domingos Rodrigues Seixas, José Francisco de Almeida, José Antonio Paraiso de Moura, Pedro Antonio de Oliveira Botelho, Antonio José Osório, Manuel Mauricio Rebouças, Prudencio de Souza Britto Cotegipe, Luís Álvares dos Santos, Luís Lopes Batista dos Anjos, Manuel Ezequiel de Almeida, Demetrio Ciriaco Tourinho, Joaquim de Sousa Velho, Salustiano Ferreira Soute, Elias José Pedroza, Policarpo Cabral, Jonathas Abbott, Januario de Faria, Cirilo José Pereira de Albuquerque, Augusto Vitorino do Sacramento Blake e outros).
No dia seguinte, 26 de julho, o presidente da província, Alvaro Tiberio de Moncorvo e Lima, enviou circular aos médicos determinando que se leve a efeito visitas às pessoas pobres moradoras das mesmas freguesias, onde os médicos comissionados para cuidar dos enfermos desvalidos têm casa de residência.
“Circular aos medicos commissionados para cuidar dos doentes pobres por Freguesias.
Cumprindo socorrer a população necessitada quando accomettida de enfermidades, q’ não sendo prompta e dividamente combatida podem por seus resultados fazer crer a existencia de alguma epidemia, que he mister ao mesmo tempo observar, para que conhecida a epoca da sua invasão se providencie adequadamente, tenho resolvido nomear a V. S.ª e e aos D.rs F F... para, segundo entre si determinarem, visitarem todas as moradas pelas manhãns das pessoas pobres das Freguezias..., indagando do estado da saude de cada huma, offerecendo seus cuidados aos doentes, e ministrando-lhes gratuitamente os remedios necessarios, que serão fornecidos por qualquer botica á que forem enviadas as receitas com declaração de serem por conta do Governo, do nome dos doentes, e da rua, e o numero da Casa, e comunicando a V. S.ª fica-me a certêza, de que nos limites dessa Comissão não será V. S.ª menos cuidadoso do que tem por costume ser com o geral dessa classe desvalida. Deus Guarde a V. S.ª Palacio de Governo da Bahia – 26 de Julho de 1855 — A. T. de M. e Lima”
“Relação a que se refere o officio supra
Curato da Sé
João Baptista dos Anjos
Elias José Pedrosa — 20 de Agosto
Demetrio Ciriaco Tourinho
Pedro Antonio de Oliveira Botelho
Ascanio Ferraz da Motta” (54).
O conselheiro João Baptista dos Anjos solicitou ao presidente da província dispensá-lo da constituição da comissão médica em tela:
“S.r D.r João Baptista dos Anjos
Attendendo as justas rasões por V. mce ponderadas em seu officio de 22 do corr.e, o dispenso de fazer parte da Comissão Medica encarregada do tratam.to das pessoas pobres attacadas da epidemia reinante no Curato da Sé, nomeando para o substituir ao D.r Joaquim de Sousa Velho – Deus G.e a V.mce Palacio do Governo da Bahia 23 de Setembro de 1855 – A. T. de M. e Lima” (55).
Como já vimos, o doutor Seixas conta que o conselheiro João Baptista dos Anjos e sua digníssima consorte, D. Maria Magdalena Alvares Baptista, tiveram dois filhos: João Baptista dos Anjos e Antonio Baptista dos Anjos.
Como acadêmico de medicina, os jovens estudantes exibiram destacada atuação, auxiliando nas medidas sanitárias levadas a efeito para combater a epidemia da cólera morbo que flagelava a província da Bahia em 1855.
É o que podemos ver na leitura dos documentos por mim pesquisados:
“A Commissão encarregada de destribuir socorros ás pessôas necessitadas do Curato da Sé, em virtude do officio de V. Ex.ª de do corr.e, de accordo com a maior parte dos Medicos a cujo cuidado se acha o curativo dos pobres do m.mo Curato, julgou conven.e destribuir as visitas domiciliares com os Academicos do 6.º anno João Fran.co d’Almeida Fernandes Antonio Alv. da S.ª, e Jaime Silvestre Dormund; do 5.º João Baptista dos Anjos F.º, e Joaquim da Costa Chastinet; do 4.º Antonio Baptista dos Anjos; do 3.º Jesuino Augusto dos Santos Mello; e Severiano Braulio Montr.º, do 2.º Augusto José Novis e Joaq.m Augusto Munis Barretto; tendo cada um á sua conta os Quarteirões, q.’ V. Ex.ª verá da relação junta.
A Commissão julga de necessed.e ter em poder do Membro da mesma o Negoc.e José Manoel d’Amorim 50 cobertores de baêta, 50 lenções, 50 camisas, 50 carapuças, e 4 duzias de meias de lãn para ir destribuir-se á proporção, q.’ for apparecendo quem estes objectos precisar com aquella promptidão, que requer a enfermid.e reinante; e bem assim 100 ou 200$000 r.s para a compra da galinha e de quaesquer outros objectos, q. sejão precisos comprar, e mesmo desinfectantes, e caiação das habitações, onde morrerem os infelizes, pois q.’ um só Medico, á quem este encargo está recomendado, não o poderá fazer com a precisão, q.’ é mister.
Si V. Ex.ª julgar acertado este pensam.to da Commissão, digne-se dar suas ordens, p.ª q.’ pelo Commissariado respectivo sejão ministrados os objectos requeridos ao indicado Membro da Commissão, a qual procurará desempenhar as obrigações a seo cargo com a melhor vontade, e dedicação, como é de seo dever, e mesmo porq. m.to se honrou com a confiança, q. V. Ex.ª depositou em seos Membros.
Deos G.e a V. Ex.ª - Bahia e Curato da Sé 14 de Septembro de 1855.
Ill.mo e Ex.mo Snr. Presidente da Provincia
O Conego Cura João José de Miranda – M.el Dom.es Lopes – Amorim – Joaquim Antonio Moutinho – Antonio José Paula Ribeiro” (56).
Ajuntada à correspondência transcrita anteriormente, estava a relação dos quarteirões do curato da Sé que seriam visitados pelos acadêmicos de medicina já mencionados:
“Relação dos Quarteirões do Curato da Sé, que foram destinados aos Academicos, para faserem as visitas domociliares dos mesmos
Academicos do 6.º anno –
João Fran.co d’Almeida Fernandes - Quarteirões 14, 15 e 16
Antonio Alves da Silva D.os 4, 5 e 6
Jaime Silvestre Dormund D.os 17, 18 e 19
Ditos do 5.º anno
João Baptista dos Anjos filho D.os 7 e 8
Joaquim da Costa Chastinet D.os 11. 12 e 13
Dito do 4.º anno
Antonio Baptista dos Anjos - D.os 9 e 10
Ditos do 3.º anno
Jesuino Augusto dos Santos Mello D.os 22 e 23
Severiano Braulio Monteiro D.os 24, 25 e 26
Ditos do 2.º anno
Augusto José Novis D.os 20 e 21
Joaquim Augusto Munis Barreto D.os 1, 2 e 3
O Conego Cura João José de Miranda
M.el Dom.es Lopes
(Rubrica ilegível) Amorim
Joaquim Antonio Moutinho
Antonio J.e Paula Ribr.º” (57).
A 18 de outubro de 1855, a comissão de socorros no curato da Sé comunicou ao presidente da província, Alvaro Tibério de Moncorvo e Lima, as atividades dos irmãos João e Antonio Baptista dos Anjos nos auxílios às pessoas necessitadas no referido curato:
“Ill.mo e Ex.mo Snr.
A Comissão de Socorros no Curato da Sé tem a honra de informar a V. Ex.ª, que os Academicos João e Antonio Baptista dos Anjos derão principio como alegão as visitas domiciliares no dia dezeseis de Septembro, e as findarão em cinco do corrente, por assim o ter determinado V. Ex.ª.
Deos Guarde a V. Ex.ª. Bahia e Curato da Sé 18 de Outubro de 1855.
Ill.mo e Ex.mo Snr.’ D.r Alvaro Tiberio de Moncorvo Lima
Presidente da Provincia
M.el Dom.es Lopes
O Conego Cura João J.e de Miranda
(Rubrica ilegível) Amorim
Antonio Jozé Paula Ribr.º
Joaquim Antonio Moutinho” (58).
O moço João Baptista dos Anjos Junior recebeu o laurel de doutor em medicina a 12 de dezembro de 1856.
Defendeu tese a 25 de novembro de 1856, que versou sobre as cadeiras de Fisiologia, Higiene, Clínica Cirúrgica e Química.
As dissertações sobre os 4 pontos dados foram as seguintes:
“1º “Influencia da quantidade dos alimentos sobre o organismo”.
2º “Influencia dos diversos modos de uso do tabaco”.
3º “Apreciação dos meios hemostaticos cirurgicos”.
4º “O que é affinidade?”.
Bahia – Typographia Epifanio Pedrosa
1856”.
Foram as seguintes as observações sobre a referida tese:
“1º ponto – Dissertação – Sciencias Medicas
2º ponto – Proposições – Sciencias Medicas
3º ponto – Proposições – Sciencias Cirurgicas
4º ponto – Proposições – Sciencias Accessorias
Approvado plenamente – P. Azevedo Chaves – Souza Velho – Aranha Dantas – Antº J.e Alves – J. Faria” (59).
O jovem estudante Antonio Baptista dos Anjos completou o seu tirocínio acadêmico a 5 de dezembro de 1857, tendo sustentado tese a 25 de novembro de 1857 em derredor das cadeiras de Higiene, Patologia Geral e Anatomia Patológica e Terapêutica.
As dissertações da tese dicorreram acerca dos 4 pontos dados:
“1º “Influencia dos effluvios pantanosos”.
2º Proposições “Terminações da inflammação”.
3º “Que é ferimento grave?”.
4º Dissertação = “Em que casos convem a medicação evacuante?”.
Foi aprovada plenamente: Azevedo Chaves – Aranha Dantas – Roiz Seixas – Adriano Gordilho
Bahia – “Typographia Epifanio Pedrosa
1857”
Foram aplicadas as seguintes observações: “A dissertação é o ponto 4” — Sciencias Medicas
1º Proposições - Sciencias Medicas
2º “ - Sciencias Cirurgicas
3º “ - Sciencias Accessorias” (60).
Lamentavelmente não foi possível localizar as duas teses em referência na Faculdade de Medicina, no Terreiro de Jesus. Certamente foram consumidas pelo grande incêndio ocorrido em a noite de 2 de março de 1905.
Reportando-se aos jovens filhos do conselheiro Baptista, assim escreve o doutor Domingos Rodrigues Seixas: “Essas duas flores, de que fallei, ou antes esses dous praseres, mais tarde converterão-se em duas amarguras, que por muito tempo torturarão o coração do Dr. João Baptista dos Anjos.
Um delles, o de nome Antonio Baptista dos Anjos, morreo victima de molestia cerebral da ordem da idiotia; o outro de nome João Baptista dos Anjos, falleceo de tuberculos pulmonares”’.
Pesquisando os livros de óbitos do Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador, perlustrei, com incontida emoção, o assentamento do óbito de Antonio Baptista dos Anjos, exarado nos termos seguintes:
“Aos trinta de Outubro de 1858 falleceo de thisica, tendo recebido os Sacramentos Antonio Baptista dos Anjos, branco, solteiro, com idade de vinte e sete annos, Doutor em Medicina, morador ao Cruzeiro de S. Francisco – Foi condusido para o Cemiterio de Quintas.
Do que fis este assento e assignei.
O Conego Cura João José de Miranda” (61).
Como se observa, mais uma vez os dados fornecidos pelo biógrafo do conselheiro João Baptista conflitam com os dados por mim colhidos em arquivos. No caso em tela, o doutor Antonio Baptista dos Anjos faleceu vitimado pela tuberculose e não pela “molestia cerebral da ordem da idiotia”.
Na condição de membro da congregação da Faculdade de Medicina da Bahia, o conselheiro Baptista dos Anjos destacou-se sobremaneira mercê de judiciosas e ponderosas intervenções.
Apreciemos, doravante, alguns episódios da atuação do doutor Baptista dos Anjos perante a colenda congregação.
Na sessão de 4 de agosto de 1855, retirou-se, na congregação, o artigo 4º pelo seu autor e “foi substituido pelo seguinte aprezentado pelo D.r Baptista = Que se concluisse quanto antes o muro que deve circundar o Cemiterio da Quinta dos Lazaros para ahi serem tão bem enterrados cadaveres = Foi approvado o art. 5º, isto é, uma linha de arvores deve ser plantada em toda a extensão desse Cemiterio ao lado da cidade”. (62).
Toda a família do conselheiro Baptista dos Anjos foi inumada na sobredita necrópole.
Sessão de 9 de fevereiro de 1856
Leu-se o expediente: “um Aviso da Secretaria d’Estado dos Negocios do Imperio de 18 de Dezembro communicando ter sido deferido favoravelmente o requerimento do D.r Baptista dos Anjos, pedindo as vantagens que lhe são concedidas nos art.os 54 e 187 dos Estatutos, visto ter completado 25 annos de serviço no magisterio” (63).
Iniciava-se assim o processo para a sua honrosa jubilação.
Ressaltando, no seu panegírico, a indicação do conselheiro Baptista para diretor da Faculdade de Medicina, assim se expressa o lente doutor Seixas: “O Governo Imperial, conscio da aptidão do distincto professor, nomeou-o director da Faculdade de Medicina desta provincia, outhorgando-lhe então o titulo do conselho.
Eis ahi o que demonstra evidentemente a grandeza do homem, que se eleva pela escada do merecimento por confiar em sua intelligencia e na justiça dos contemporaneos.
O porteiro do antigo Collegio medico cirurgico, morreo director da Faculdade de Medicina da Bahia!
A maior parte dos grandes homens, os grandes vultos da humanidade fazem-se do nada que forão.
“As espadas dos mais distinctos generaes tem sido conquistadas pela bayoneta do soldado”.”
Os preciosos manuscritos, a seguir transcritos, comoveram-me, deveras, ao encontrá-los e lê-los:
“Ill.mo e Ex.mo Snr
Tenho a honra de acusar recebido o officio de V. Ex.ª da data do mez proximo passado, no qual V. Ex.ª teve a bondade de communicar-me haver Sua Magestade Imperial Nomeado por Decreto de 1.º daquelle mez o Conselheiro Doutor João Baptista dos Anjos Director desta Faculdade; e fico certo de cumprir religiosamente as determinações, que a tal respeito a Lei me impoem.
Deos Guarde a V. Ex.ª
Faculdade de Medicina da Bahia 2 de Janeiro de 1858
Ill.mo e Ex.mo V.e Presidente da Provincia
O Director Interino
D.r Jonathas Abbott” (64).
“Faculdade de Medicina da Bahia 3 de Fevereiro de 1858
Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Ex.ª que nesta data tomei posse do cargo de Director da Faculdade de Medicina desta Cidade, para o qual Sua Magestade o Imperador Houve por bem nomear-me por Decreto de 1.º de Dezembro do anno proximo findo.
Deos Guarde a V. Ex.ª
Ill.mo e Ex.mo Snr’ Prezidente da Provincia
D.r João Baptista dos Anjos
Director” (65).
Respeitante à atuação do conselheiro Baptista dos Anjos como diretor, escreve o lente doutor Domingos Rodrigues Seixas:
“Sendo summamente arduos os trabalhos da directoria, os quaes devião subtrahir todo tempo ao illustre conselheiro director, privando-o desta arte de bem exercer a cadeira a seo cargo, solicitou elle sua jubilação, e obteve-a.
É azada a occasião de dizer duas palavras sobre o modo por que o illustre director desempenhou esse encargo penoso, em virtude do qual teve por vezes de lutar com os membros da Congregação da Faculdade.
Era tal o receio de errar, e o escrupulo de desagradar ao Governo Imperial, de quem o digno director recebia ordens, que nem sempre confiava no alheio juizo, e punha-se a disposição de suas conjecturas, e de seo modo de considerar as cousas por um prisma, que algumas vezes não era talvez luminoso.
Quem lhe não conhecesse o fundo d’alma, poderia suppor que ele appreciava os factos com mais amargor de que reflexão; e que, com suas singulares apprehensões, attrahia a si a animadversão de alguns, e tornava-se de alguma sorte o inimigo pessoal dos que se collocavão em vereda hostil.
Diante de mil difficuldades com que arcava o illustre director, adstricto á lei, por desejo somente de destruir os vicios da lei organica, e de achar o verdadeiro pensamento do legislador, a juizos de certa rigidez moral, um pouco estreita e exclusiva, de sorte que arriscava-se a parecer que era mais honesto do que justo.
Entretanto os actos do conselheiro director procedião da firmeza de seo caracter, tinhão sua origem nos mais nobres sentimentos. Elle preferiu o erro, a censura e o odio á frouxidão e condescendencia”.
Anelisemos, à luz de alguns episódios da ação do diretor conselheiro Baptista dos Anjos, registrados nas “actas” das sessões da congregação da Faculdade de Medicina, o perfil administrativo como diretor.
Sessão de 3 de Maio de 1857
“O D.r Goes pedindo de novo a palavra, disse, que constando-lhe, ha dias, que o D.r Director havia ordenado aos Continuos ou Bedeis, que marcassem as faltas dos Lentes, e bem assim a hora em que entravão e sahião das suas aulas, e que não encontrando na Lei artigo algum, q. o ordenasse, desejava que o D.r Director lhe fizesse ver isso, e qual a causa, não por que temesse cousa alguma, pois era pontual no cumprimento de seus deveres porem sim por não se querer ver rebaixado de sua dignidade, visto que a Lei ordenava, que tais faltas fossem abonadas pelo secretario e não pelos continuos, á vista do que protestava contra semelhante ordem: ao que respondeu o D.r Director que não tinha dado tal ordem, e somente recomendado aos continuos as horas em que entravão e sahião os Lentes de suas respectivas lições, visto como marcando a lei tempo determinado para ellas, desejava saber se isso se cumpria, o que não podia chegar ao secretario, que era só obrigado á notar se o Lente comparecia ou não; e que á vista disto não exhorbitava das suas attribuições, antes cumpria a Lei litteralmente”. (66).
Sessão de 7 de março de 1858
Leu-se o expediente “de 29 pedindo para designar d’entre os membros da Faculd.e u’a comissão dos mais versados nas sciencias naturais afim de assistirem no dia 30 as experiencias que vae fazer o Americano Frederico Southworth da extracção de gaz para illuminação d’esta cidade, remettendo-lhe seo parecer não só em relação a qualidade de luz, como sobre suas condições hygienicas, á vista do que o D.r Director nomeou os Dr.s Magalhães, Faria, Souto, Cerqueira e Rodrigues”. (67).
Detectei a correspondencia do diretor conselheiro Baptista ao presidente da província respeitante à experiência do norte-americano Southworth com o gás de iluminação:
“Ill.mo e Ex.mo Senhor
Satisfazendo a requisição de V. Excel. exarada em seo officio de data de hoje, tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Excel. que acabo de nomear a Comissão dos Dr.s Vicente Ferreira Magalhães, Antonio Cerqueira Pinto, Salustiano Ferreira Souto, Antonio Januario de Faria, Francisco Rodrigues da Silva para que assistindo amanhã ás experiencias que vae fazer o Subdito Norte-Americano Southworth da extracção de gaz para a illuminação d’esta Capital, haja de dar á V. Excel. o seo parecer tanto em relação a qualidade da luz, seo brilho e intensidade, como sobre suas condições hygienicas. D.s G.e a V. Excel. Bahia e Faculdade de Medicina 29 d’Abril de 1858
Ill.mo e Ex.mo Senhor Presidente d’esta Provincia
D.r João Baptista dos Anjos” (68).
Assim escreveu a respeito da experiência de Southworth, a renomada historiadora baiana Anna Amélia Vieira Nascimento: “A precariedade da iluminação da cidade com o emprego do azeite de peixe fez com que os governantes da Bahia aceitassem novas idéias para iluminá-la. Um americano, Frederico Southworth ofereceu-se para usar nos lampiões o gás de hidrogênio carbonetado, retirado de resinas e substâncias oleosas. A matéria-prima utilizada seria a mamona, não só a semente, como o próprio arbusto. Também poderiam ser usadas as sementes de algodão, ossos e outros materiais. Entre as muito vantagens que oferecia o novo invento, estava a de não poluir as casas, as ruas e os próprios lampiões, o que seria certo com a iluminação do gás retirado do carvão de pedra. O oferecimento de Southworth, embora sendo de cogitação e acatamento do governo da Província, não foi levado a termo, e a iluminação da cidade ainda continuou por algum tempo à luz de azeite de peixe, cujo contrato com o comerciante Joaquim Pereira Marinho ainda não havia terminado”. (69).
A jubilação do conselheiro-diretor Baptista dos Anjos foi comunicada na sessão da congregação da Faculdade de Medicina de 3 de novembro de 1858:
“Leo-se o expediente:... de 9 de (de outubro) communicando que por Decreto da mesma data foi concedida a jubilação que pedio o D.r Director João Baptista dos Anjos no lugar de Lente da Cadeira de Hygiene e Historia da Medicina”. (70).
Sessão da congregação da Faculdade de Medicina em 9 de novembro de 1858: “... o D.r Director declarou que havia convocado a Congregação extraordinariamente para communicar o facto escandaloso que acabava de ser practicado na Secretaria da Faculdade em sua presença, e perante m.tos Lentes, o Secretario, Bedeis e Continuos, pelo estud.e do 3.º anno Medico José Cardoso d’Oliveira Guimarães Junior, que no dia antecedente havia sido reprovado no exame das respectivas materias, e vinha a ser = Que entrando na Secretaria, o referido estud.e a pretexto de tirar u’a certidão do exame, logo que ella lhe foi entregue pelo Secretario, dirigio-se ao D.r Antonio José Alves d’entro da mesma Secretaria, e depois de insultal-o com palavras injuriosas, passou á vias de facto, amarrotando a certidão em sua presença, fazendo gestos de arremeçar-lhe a face, pondo-lhe mãos violentas, e travando luta com o mesmo Pharmaceutico, digo Professor, que felizmente pôde repellil-o até que foi separado do seo brutal aggressor pelos Collegas, que se achavão presentes. O D.r Director communicou igualmente que de todo o occorrido já havia participado ao Presidente da Provincia e Chefe de Policia, tendo requisitado á este para mandar pôr diariamente a sua disposição u’a força de policia sufficiente para impôr o preciso respeito. A vista do exposto a Congregação depois de maduramente refectir, reconheceo unanimemente que o facto em questão achava-se comprehendido na 2.ª parte do art.º 162 dos Estatutos e que assim sentenciava o referido estud.e, condemnando-o como incurso no dito art.º com a exclusão dos estudos em qualquer das Faculdades do Imperio, não excluindo aquellas penas em que incorreo o delinquente segundo a legislação geral, ordenando que se fizesse a competente queixa ás Authoridades, e de todo o ocorrido se desse parte circunstanciadam.e ao Governo Imperial. Levantou-se a sessão”. (71).
Na sessão de 10 de Novembro de 1858, a congregação da Faculdade de Medicina sentencia o estudante José Cardoso d’Oliveira Guimarães Junior:
“... o D.r Director apresentou o termo annexo do facto escandaloso occorrido hontem na Secretaria da Faculdade afim de que a Congregação o houvesse de tomar na devida consideração. Sendo elle lido, e depois de maduras reflexões passou a Congregação a sentenciar o estud.e José Cardoso d’Oliveira Guimarães Junior condemnando-o por unanimidade de votos como incurso no artigo 162 dos estatutos com a exclusão dos estudos em qualquer das Faculdades, não excluindo aquellas penas em que tambem incorreo o delinquente segundo a legislação geral; pelo que ordenou que se fizesse a competente queixas ás Authoridades, e de tudo se desse parte ao Governo Imperial. Levantou-se a sessão". (72).
As competentes comunicações do incidente foram feitas nas datas de 9 de novembro, 15 de novembro e 21 de dezembro de 1858 por intermédio do conselheiro-diretor João Baptista ao presidente da província, solicitando inclusive “uma guarda de tropa de primeira linha sufficientemente forte para impôr o necessario respeito, seja posta diariamente no edificio da Faculdade á minha disposição ás nove horas, durante todo o tempo que for necessario, e até que se concluam todos os actos escholares”.
As sobreditas correspondências foram publicadas na íntegra no “Jornal do CREMEB” – abril de 1993 – Nº 46. (73).
Sessão de 3 de março de 1859
“... o D.r Director fazendo ver á Congregação que á vista do Aviso da Secretaria d’Estado dos Negocios do Imperio de 11 de Janeiro, cumprir que elle houvesse de formular e submeter á decisão do Governo Imperial as medidas que julgasse convenientes para reprimir ou obstar qualquer tentativa criminosa aos actos da Faculdade commetido pelos estudantes, toda ella votou que se louvasse no que fizesse o D.r Director que tão zelosamente desejava ver a Faculdade o mais respeitada possivel”. (74).
Sessão de 9 de junho de 1859
“... o Conselheiro Director pedio á Congregação authorisação para mandar fazer mais u’a mesa para dissecções, visto que as duas existentes erão insufficientes para o trabalho, e ella unanimemente accordou”. (75).
Sessão de 20 de setembro de 1859
“... o orador eleito para o discurso de felicitação ao Monarcha, a Congregação unanimemente accordou que fosse o Cons.º Director seo chefe”. (77).
Sessão de 30 de setembro de 1959
“Finda a leitura do expediente o Cons.º Director expoz qual o objecto da reunião, dizendo, que tendo sido designado pela Congregação para ser o Orador da felicitação que se teve de dirigir a S. M. o Imperador em nome da Faculdade, que por deferencia aos seos Collegas os tinha convocado para ouvirem a leitura do discurso que havia formulado, e lhes pedia que com toda a franqueza houvessem de notar e corrigir-lhe os erros; lido elle, que he o seguinte = Senhor. A Faculdade de Medicina desta Cidade, apreciando como lhe cumpre o faustissimo acontecimento de ter-se V. M. I. e sua Augusta Consorte dignado visitar esta Provincia, vem cheia de júbilo apresentar a V. M. I. a homenagem de seo profundo acatamento, e manifestar do modo o mais explicito o reconhecimento e a gratidão de que se acha possuida por esta prova tão assinalada de amor e solicitude com que V. M. I. trata esta importante porção da grande familia Brasileira. Procedendo desta arte a Faculdade de Medicina do passo que satisfaz á um dever dos mais gratos e sagrados tão bem obedece aos sentimentos de alta estima e subida affeição que nutre pela Augusta Pessoa de V. M. I., exultando de poder gozar da veneranda prezença do Monarcha eximio, que a tantos titulos de gloria que lhe conferem suas egregias qualidades e brilhantes virtudes, reune o de Protector das Letras e das Sciencias de que é cultor infatigavel, distinguindo com especial favor aquelle que se occupa com a vida e saude do homem. Tão bem o passo eminentem.e politico e providente que V. M. I. acaba de dar, sendo mais um testemunho da bondade e sabedoria de V. M. I., he igualmente um motivo do mais vivo prazer para a corporação scientifica esse nome de quem fallo, por que neste passo depara ella com a segura esperança de que V. M. I. solicita como é pelo progresso do ensino Medico, prestar-lhe-ha os meios que faltão para desempenhar proficua e plenamente a nobre missão de que está encarregada. A Faculdade de Medicina finalmente comprehendendo a magnitude do acto practicado por V. M. I. a bem desta porção fiel de seos subditos e a fertilidade de suas consequencias, rende graças ao Supremo Arbitro do Universo por haver dotado o Brazil de um Soberano, que cogitando sempre nos meios de engrandece-lo procura eleva-lo ao gráo de ventura e prosperidade de que é susceptivel, e faz sinceros e ardentes votos para que a preciosa vida e saude de V. M. I. e a de sua Augusta Familia sejão conservadas por longos annos. Taes são Senhor os sentimentos que animão a Faculdade de Medicina desta Cidade. Ella ter-se-ha por muito ditosa, se V. M. I. se dignar accolhel-os, Benignos com a expressão fiel do amor e dedicação que tributa a sagrada Pessoa de V. M. I. = Foi pela Congregação bem acolhido, e unanimemente approvado; e pedindo a palavra por esta occasião o D.r Rodrigues apresentou a seguinte proposta = Proponho que se inscreva na acta um voto de agradecimento da Faculdade de Medicina ao Ex.mo Sn.r Cons.º Director pela deferencia que teve para com ella submettendo a sua apreciação a felicitação, que em nome da mesma Faculdade tem de dirigir a S. M. I., e submetendo o Cons.º Director a discussão, depois de encerrada ella, retirando-se elle da sala e passando-se a proceder a votação tomando a cadeira da Directoria o Cons.º Antunes, foi approvada contra os votos dos D.rs Freitas, Seixas, Goes, Pedroza e Velho”. (77).
Honra e glória para aquele que, outrora, humilde e idealista porteiro do antigo Colégio Médico-Cirúrgico, alcançou pelos inexcedíveis méritos o título de conselheiro e o cargo de diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, e teve o privilégio e subida distinção de saudar, em nome da mesma Faculdade, o excelso imperador D. Pedro II !!
D. Pedro II, acompanhado da Imperatriz Teresa Cristina, chegava a Salvador a 6 de outubro de 1859.
No mesmo dia, às 10 horas e trinta minutos, o vapor “Apa” fundeou 40 “braças” distante do Arsenal da Marinha, conduzindo os augustos visitantes (78).
Na mesma noite, na sala particular de S.S.M.M., no antigo Palácio dos Governadores, sito à “Praça de Palácio”, S. M. ofereceu um jantar de 200 talheres, sendo convidados os senadores e deputados, chefes de repartições, presidentes da Assembléia, da Câmara, da Relação, do Tribunal do Comércio e representantes da sociedade mais “raffinee” da Bahia. Entre os convidados, o conselheiro doutor João Baptista dos Anjos e sua virtuosa consorte, D. Maria Magdalena Alves Baptista.
Assim escreveu D. Pedro II, no seu precioso diário, sobre a conversa, no jantar de gala, com o conselheiro Baptista dos Anjos: “Acabado o jantar conversei com diversas pessoas, dizendo o diretor da Escola de Medicina, que havia assiduidade nos lentes, severidade no 1º anno escolar, dando-se também nos passados exames preparatórios. Mas que os estatutos tinham inconvenientes, principalmente nas penas de prisão e repreensão, por inexequíveis ou pouco eficazes e que o laboratório de química, apesar de nova obra, ainda estava mal acomodado. Ficou de vir cá um dia para falar-me especialmente a respeito das necessidades da Escola”. (79).
No dia 12 de outubro, está anotado assim no diário de S. M. I.: “Ontem de noite o Dr. João Batista dos Anjos, além do que já indiquei, falou-me da necessidade de um horto botânico que não se estabeleceu no sítio dos Barris perto do dique, lugar apropriado, porque o terreno importaria em 8 contos. Falou-me com vantagem do substituto Faria, e não pareceu concordar com o Abreu a respeito do Bonfim; julga desfavoravelmente o opositor Alves dos Santos”. (80).
O conselheiro doutor João Baptista dos Anjos recebeu, finda a viagem imperial, a comenda de Cristo.
No seu monumental trabalho “O Ensino da Clínica Obstétrica na Universidade da Bahia” (81), o meu particular amigo, mestre e sempre pranteado professor J. Adeodato Filho, elaborou um alentado levantamento histórico em derredor do início dos cursos de medicina e da clínica obstétrica na Bahia. Omitiu, todavia, no seu arrazoado, o desempenho do conselheiro João Baptista dos Anjos objetivando criar uma “caza de maternidade”, porquanto os estudantes de medicina “frequentão o 4.º anno medico, acabão o seo curriculo e sahem sem uma só idea pratica das materias que theoricamente aprenderão”.
Vejamos, a seguir, as intervenções do conselheiro Baptista dos Anjos na congregação da Faculdade de Medicina da Bahia, empenhando-se para que os estudantes de medicina se habilitassem na sublime arte de partejar:
Sessão de 17 de março de 1860
“O cons.º Director fazendo ver a Congregação que sendo uma das couzas mais necessarias para o progresso da Faculdade uma caza de maternidade, lhe pedia que a vista da Lei houvesse de fazer uma proposta ao Governo Imperial, requisitando a compra da caza proxima, onde não só pudera collocar este estabelecimento, como tão bem outros muitos,...” (82).
Sessão de 24 de março de 1860
“O Cons.º Director tendo-se incumbido de fazer a proposta ao Governo a pedido da Congregação sobre o cumprimento de varios art.os des Estatutos passou a lel-a pedindo previamente a Congregação lhe houvesse de desculpar as lacunas que encontrasse, filhas certamente do seo mao estado de saude, por que os seos pela prosperidade da Faculdade erão illimitados = Ill.mo e Ex.mo Sn.r A Faculdade de Medicina da Bahia conscia da importancia dos conhecimentos praticos ao estudo dos diversos ramos do ensino desta sciencia para formar medicos que honrem o paiz e sejão proficuos a humanidade, e certo do apoio e favor que o Governo Imperial ha sempre prestado a tudo quanto pode melhorar tal ensino, vem cheio de esperança manifestar a V. Ex.ª as necessidades que este experimenta e fundada nos diferentes art.os de seos Estatutos propor as medidas que julga insispensaveis para satisfazel-as, esperando que, tomadas por V. Ex.ª sob sua alta proteção se digne apresental-as e deffendel-as perante a Assemblea Geral Legislativa, a quem compete authorizar as dispensas á que são dependentes não tendo o curso obstetrico, de que trata o art.º 8 dos Estatutos competido desde que estes regulão, senão em lições oraes meramente theoricas, feitas sobre partos, molestias de mulheres pejadas e de meninos recem=nascidos por quanto nem ao menos se tem podido verificar os exercicios clinicos ordenados no mesmo art.º, por não haver no hospital da St.ª Caza da Misericordia, enfermaria especial para elles nem espaço para organizar uma com as condições de salubridade que lhe devem ser inherentes, resulta que frequentão o 4.º anno medico acabão o seo curriculo e sahem sem uma só idea pratica das materias que theoricamente aprenderão. A Faculdade pois desejando de acordo com a Lei remediar um tal estado de cousas, e conhecendo que o único meio por este offerecido é a creação de casas de maternidade indicada no predicto art.º, tem a honra de propol-a a V. Ex.ª, e para tornar esta providencia realizavel informa que contiguo ao edificio da mesma Faculdade existe felizmente um predio adaptavel ao fim proposto que o Governo Imperial pode haver por compra ou desapropriação, onde feitas as modificações architetonicas convenientes, é possivel estabelecer além das referidas casas de maternidade, o museo de Historia Natural no art.º 9 dos citados Estatutos, e observatorio para as averiguações meteorológicas...” (83).
Somente em 1875, a provedoria da Casa da Santa Misericordia instalou em uma sala do Hospital de S. Cristovão uma enfermaria de partos, sendo o professor da cadeira o Barão de Itapoan. (84).
As Memórias Históricas das Faculdades de Medicina do País, foram instituídas em virtude da reforma do ensino de 1854, mediante o decreto nº 1387 de 28 de abril do referido ano, rezando assim o artigo 197: “Na sessão de encerramento a Congregação encarregará a hum dos seus membros de apresentar, na primeira sessão do anno seguinte, uma memoria histórica em que se relatem os acontecimentos notaveis do anno findo”.
Foram escritas, sem interrupção, a partir de 1854, sendo o lente Malaquias Alvares dos Santos o primeiro a escrevê-las. O professor João Américo Garcez Fróes, em 1915, foi o último a apresentar as memórias, seqüenciandas desde 1854.
O ilustrado doutor Gonçalo Moniz Sodré de Aragão, professor catedrático de Patologia Geral, reativou a publicação das Memórias Históricas da Faculdade de Medicina da Bahia, publicando em 1940, as relativas ao ano de 1924.
Finalmente, a excelsa Academia de Medicina da Bahia, em louvável iniciativa do mestre Geraldo Milton da Silveira, com o importante apoio da Universidade Federal da Bahia e da Federação das Indústrias do Estado da Bahia, deu a lume a extraordinária obra concernente ao ano de 1942, escrita pelo preclaro mestre Eduardo de Sá Oliveira, professor catedrático de Cínica Cirúrgica da Faculdade de Medicina da Bahia*
Na memória concernente ao ano de 1855, elaborada pelo lente Manoel Ladiláo Aranha Dantas, é feita a seguinte referência relativa ao conselheiro Baptista dos Anjos: “Em sessão de 28 de Abril foi o S.r D.r João Baptista dos Anjos nomeado membro honorario da Junta Vaccinica na forma do art.º 4.º do regulamento de 21 de Fevereiro de 1855, remetido officialmente pelo Governo da Provincia a esta Faculdade afim de proceder ella a essa nomeação”. (85).
O lente José de Góes Sequeira, autor da memória referente ao ano de 1858, assim escreve a respeito do conselheiro Baptista:
“S. M. Imperial — por Decreto do 1.º de Dezembro de 1857 — Houve por bem Nomear — Director ao Snr. Conselheiro D.r João Baptista dos Anjos, — em cujo cargo foi empossado á 7 de Fevereiro de 1858 — na ordem chronologica — é este um dos mais notaveis acontecimentos do anno findo — O Snr. Conselheiro João Baptista dos Anjos, entrando na directoria da Faculdade cuidou desde logo de executar os Estatutos e regula muito — como era do seu dever; e se o pouco tempo tempo de sua administração — pode já fornecer-nos alguns lados em favor da utilidade e vantagens resultantes da reforma, de certo — que havemos colhido uma somma sufficiente de provas — que abonão o criterio e illustração do Ministerio reorganisador do ensino de 1854”. (86).
E mais adiante: “... render uma homenagem aos illustrados e conspicuos Snrs. Professores... e particularmente ao Snr. Conselheiro João Baptista dos Anjos, o qual como Chefe da Faculdade — com o seu exemplo, com o seu saber e circunspecção — tem invidado esforços para bem encaminhal-a, desejando assentar em seus eixos a maquina — que existia desmontada, procurando regularisar seus movimentos, e d’estarte encetando a obra de regeneração, por de ha muito ambicionavamos, — pois era para lamentar, que o primeiro e mais importante Estabelecimento de instrucção superior — que tem sua sede na Provincia — nutrisse em seu seio um mal, que incessantemente o corroia, que entorpecia e paralysava o seu desenvolvimento”.
E além: “Tendo sido jubilado — por Decreto de 9 de Outubro — o Snr. Conselheiro D.r João Baptista dos Anjos, pelo que ficou vaga a Cadeira de Hygiene e Historia da Medicina, — foi — como Substituto mais antigo da Secção Medica — aprezentada ao Governo Imperial — o Snr. D.r Domingos Rodrigues Seixas, o que por Decreto de 9 de Novembro obteve n’ella ser provido”.
O lente substituto da Faculdade de Medicina da Bahia, doutor Antonio Januario de Faria, na sua Memória Histórica da Faculdade referente ao ano de 1859, faz as seguintes referências ao conselheiro Baptista:
“Ao zelo e intelligencia do actual Director da Faculdade, o S.r Conselheiro João Baptista dos Anjos, se deve incontestavelmente a remoção de muitas dessas causas que prejudicavam o progresso do ensino”. (87).
E acrescenta referindo-se à visita do imperador D. Pedro II à Faculdade de Medicina: “Foi a 10 de Outubro o primeiro em que os Paços da Faculdade forão honrados pela Augusta Presença de Nosso Soberano, o Qual a 8 horas da manhã já se achava entre nós a percorrer a enfermaria de Cirurgia, onde assistiu a visita da Clinica, demorando-se junto ao leito de cada enfermo...”.
“... Em sessão da Congregação foi decidido por unanimidade que numa Acta especial fosse lavrada, afim de commemorar um facto de tanta importancia e honra para a Faculdade, assim como ahi ficasse registrada a Resposta com que S. M. o Imperador se dignou agradecer o Discurso congratulatorio que por occasião da feliz chegada de S. S. M. M. Imperiais a esta Provincia proferira em sua Augusta presença o S.r Conselheiro Director como orgão da Faculdade, o que effectivamente se realisou”.
Referentemente ao Conselho de Salubridade, o conselheiro Baptista dos Anjos assumiu, por duas oportunidades a vice-presidência daquele órgão:
“Ill.mo e Ex.mo Snr.’
Em virtude do art.º 6.º do Regulamento interno do Conselho de Salubridade, tenho a honra de participar á V. Ex.ª que elle procedeo á eleição de seus funcionarios para o anno corrente, e foi eleito Presidente o Conselheiro D.r Jonathas Abbott, Secretario e D.r Filippe da Silva Barauna, Thesour.º o Conselheiro D.r Conselheiro Joaquim de Souza Velho, Vice-Presid.e o Conselheiro João Baptista dos Anjos, e Vice-Secretario o D.r Antonio Januario de Faria.
Deus guarde a V. Ex.ª Bahia 18 de Abril de 1859
Ill.mo e Ex.mo Snr’ D.r Francisco Xavier Paes Barreto
Presid.e da Provincia
D.r Jonathas Abbott
Presidente do Conselho” (88).
“Ill.mo e Ex.mo Snr.’
Em virtude do art. 6.º do Regulamento interno do Conselho de Salubridade vou levar ao conhecimento de V. Ex.ª, q.’ elle procedeo a eleição de seus funcionarios para o anno corrente, e foi eleito Presidente o Conselheiro Jonathas Abbott, Secretr.º o D.r Barauna, Thezour.º o Conselheiro Joaq.m de Sousa Velho, Vice-Presid.e o Conselheiro João Baptista dos Anjos, e Vice-Secretr.º o D.r Ant.º Januario de Faria.
Deus G.e a V. Ex.ª. Bahia 11 de julho de 1860
Illm.º e Ex.mo Snr.’ Desembargador
Presidente d’esta Provincia
D.r Jonathas Abbott
Presidente do Conselho” (89).
Enquanto diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, o conselheiro João Baptista dos Anjos desempenhou suas funções com inexcedível brilhantismo e invulgar zelo.
Catadupas de documentos, todos originais e inéditos, foram por mim perlustrados, permitindo, destarte, ter uma nítida visão da profícua administração do diretor da Faculdade, que outrora laborava como probo e cuidadoso porteiro do antigo Colégio Médico-Cirúrgico.
Impossível citá-los e transcrevê-los todos. Todavia, um dos expedientes manuscritos será reproduzido, porquanto será de interesse, creio, para os estudiosos da Faculdade de Medicina da Bahia no século XIX.
É por demais conhecida uma pintura belíssima do vetusto terreiro de Jesus, reproduzindo o velho largo, a catedral e as feições arquitetônicas coloniais e acanhadas da antiga Faculdade de Medicina. Na harmoniosa obra pictórica, observa-se na fachada da Faculdade, contígua à catedral, um grande alpendre.
Achei interessante manuscrito que trata da demolição do sobredito alpendre. Ei-lo:
“Faculdade de Medicina da Bahia 9 de Setembro de 1864
Ill.mo e Ex.mo Snr.’
Tendo-se desmoronado e cahido o alpendre que existia collocado na entrada do edifício desta Faculdade, ficando ainda de pé duas columnas de marmore inteiriças que dizem ser de qualidade rara, e não havendo necessidade de reconstruil-o, vou rogar a V. Ex.ª se sirva dar suas ordens a fim de que não só se removão taes columnas do lugar em que se achão collocadas com as necessarias cautelas para que se não quebrem, e guardadas em parte donde possão ser tiradas para o adorno de algum edificio publico que dellas haja mister, mas tãobem se regularize o chão lageado que era coberto pelo mesmo alpendre, e a parede correspondente do frontispicio do edificio da mesma Faculdade mediante a obra ou trabalho necessario.
Deos Guarde a V. Ex.ª
Ill.mo e Ex.mo Snr. Dez. Presidente da Provincia
O Director
João Baptista dos Anjos” (90).
Médico muito conceituado pela comprovada sapiência e perícia e assaz requestado pelos enfermos da capital da província e mormente do sertão baiano, o conselheiro Baptista dos Anjos prestou seus serviços profissionais a uma airosa adolescente, nascida a 31 de janeiro de 1843, na fazenda Retiro, termo da vila de Itapicuru, filha de Mathias de Araujo Góes e D Anna Maria da Annunciação Ribeiro Góes, que viria a ser a primeira romancista do Brasil: dona Anna Ribeiro de Góes Bittencourt.
A jovem Anna, enfermada por severa moléstia de olhos desde a idade de três ou quatro anos, tinha viajado desde Catu com seus pais até a capital em busca de tratamento para a afecção ocular.
Dias após a sua chegada à cidade da Bahia, a menina Anna deslocou-se com seu pai, utilizando uma cadeira de arruar e seguiu “para a casa das Monteiro, onde devia ser apresentada ao médico”.
E escreve a douta memorialista: “Ali fiquei muito à vontade, enquanto meu pai foi se entender com o médico. Chegando meu tio com o Dr. Batista dos Anjos, lente da Academia, este, depois de me examinar os olhos, fez algumas perguntas a meu pai e disse que não era preciso me submeter a tratamento, que estava perto da época em que se dá uma grande evolução no organismo da mulher e era de esperar que eu melhorasse ou talvez desaparecesse o mal. Muito abalada com a presença do médico, senti um grande alívio com tal diagnóstico”. (91).
Sofre o conselheiro João Baptista dos Anjos doloroso golpe com o falecimento de sua esposa, D. Maria Magdalena Alvares Baptista, sepultada a 19 de novembro de 1863, no cemitério da Quinta dos Lázaros. Tinha 55 anos de idade e faleceu de “lichenagrius”. (92).
O “lichenagrius”, consoante definição emitida no século XIX, é uma “maladie aiguë très voisine de l’eczéma, s’accompagnant de démangeaisons, d’où par le grattage formation de croùtes et de petites ulcérations”. (93).
No dia 23 de novembro de 1863, o conselheiro Batista dos Anjos, agradecia “cordealmente” a todas as pessoas que se dignaram acompanhar o “cadaver de sua mui prezada consorte a egreja de S. Francisco, e d’ahi ao cemiterio da Quinta dos Lazaros, e forão presentes ao seu funeral” e pedia-lhes “o piedoso obsequio de assistirem a missa que por sua alma manda celebrar na egreja da Mizericordia a mesa administrativa desta Santa Casa, no dia 25 do corrente as 8 horas”. (94).
Voltemos, mais uma vez, ao panegírico do lente Domingos Rodrigues Seixas: “Agora surge uma nova epocha na vida do conselheiro Baptista dos Anjos.
Apezar de velho, havia no seu coração tanto amor, que mais uma vez entendeo respirar uma flor, cujo aroma transcedente embalsamou-lhe a athmosphera da vida até seos ultimos dias.
Julgando a mulher o anjo predestinado á grandes designios na esphera da humanidade, dedicou affectos á aquella que escolheo depois para espôsa, a Exma. Sra. D. Maria Josephina de Jesus Baptista, de cujo consorcio teve tambem dous filhos, penhores que ficarão para perpetuar a memoria de seo illustre pai.
Estes dous fructos de seo casamento, Fabricio Baptista dos Anjos e Antonino Baptista dos Anjos, constituirão a sua maior felicidade, e devião ser primorosos, porque a seo casamento não assistio algum sentimento frio como a morte, nem o amor que tinha devotado na mocidade á sua primeira mulher, havia-se consumido todo no culto que seo coração creou para aquella.
Ao lado da segunda esposa, abraçado com seos innocentes filhinhos, sentia no fóco domestico tão agradáveis e deleitosas impressões, que dentro delle firmou ainda toda sua ventura.
Sua querida esposa lhe suavisava a existencia com a brandura angelica de certas almas nascidas para promover a concordia, e robustecer a amisade, humilhadas pelo respeito e pelo amor de que era merecedor aquelle á quem, até o ultimo momento, dedicou extremosos cuidados de que fomos testimunha”.
O momento de suprema felicidade e emoção do segundo himeneu do conselheiro Baptista dos Anjos foi por mim captado ao perlustrar o livro de assentamento de casamentos realizados na freguesia de São Pedro — período de 1844 a 1910 — do acervo do Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador. Vejamos:
“D.r João Baptista dos Anjos com D. Maria Josephina dos Anjos
Aos dous de Junho de mil oito centos e sessenta e seis, dispensados os Nubentes das Proclamas do estilo e com licença para se receberem na casa de sua residencia – no Areial de Cima – como concidera S, Ex.ma Revma, de licença minha, o Revendo. P. M.e Pregador Imp.al Frei Raimundo Nonato de Madre de Deus Pontes – religioso franciscano – assistio ao casamento do Conselheiro Doutor João Baptista dos Anjos com D. Maria Josephina dos Anjos, brancos, parochianos desta Freg.ª sendo aquelle, maior de cincoenta annos, e viuvo de D. Maria Magdalena Alves. Forão testemunhas do mesmo casamento o Doutor Sebastião Pinto de Carvalho, branco, solteiro, parochiano do Curato da Sé, Francisco Gonçalves Meirelles Bastos, cazado, e D. Maria Carolina de Miranda tambem cazada, Receberão as Bençãos Nupciais, na forma prescripta pela Santa Egreja de Roma; para tudo constar fiz este assento, que assignei.
Vigr.º Dr. Raym.do J.e de Mattos” (95).
A seguir, transcrevo o assentamento dos batizados dos filhos Antonino e Fabricio, ambos batizados na freguesia de São Pedro, evidenciando a mudança de residência do conselheiro Baptista, da freguesia da Sé para a freguesia de São Pedro, mais precisamente do Cruzeiro de São Francisco para o Areial de Cima.
“Aos vinte quatro de Junho de mil oito centos e sessenta e seis, o Reverendo Padre Mestre Frei Raimundo Nonato de Madre Deus Pontes – com as respectivas licenças, baptisou, em Oratorio privado, á Antonino, branco, nascido em vinte dous de Abril do corrente anno, filho legitimo do Conselheiro João Baptista dos Anjos e D. Maria Josefina dos Anjos. Forão padrinhos, Thomaz José de Miranda, sua mulher, D. Maria Carolina de Miranda. E para constar fiz este assento, que assignei; Vigr.º Dr. Raym.do J.e de Mattos”. (96).
“Aos vinte quatro de Junho do corr.te anno (1869), com authorização de S. Ex.ª Rev.ª na casa de residencia do Conselhr.º João Bapt.ª dos Anjos -, ao Areial de Cima, o Coadjutor P.e Suetonio Zeferino Nazareno deitou os Santos Oleos em Fabricio, branco, baptizado em perigo de vida p.lo mesmo Sacerdote, filho legitimo do Conselhr.º D.r João Bapt.ª dos Anjos e D.ª Maria Josephina de Jesús Baptista, nascido em sete de Outubro do anno passado; e foram padr.os os D.rs Sebastião Pinto Pinto de Carvalho e Americo de Souza Gomes – brancos, aq.le paroch.º do Curato da Sé; e este – da Freg.ª de de S.ta do Sacramento. Vigr.º D.r Raym.do J.e de Mattos”. (97).
No dia oito de abril de de mil oitocentos e sessenta e nove, nesta cidade da Bahia, o conselheiro João Baptista dos Anjos, achando-se em perfeita saúde e no uso integral de suas faculdades mentais, mas receiando morrer, redigiu do próprio punho o seu testamento, evitando ditá-lo para terceiros, como era costume na época.
Manancial de fidedígnas e vastas informações concernentes à vida do testador, inclusive nos aspectos mais íntimos e mais particulares, o testamento, que fascina a quem o lê, ao lado do inventário, permite ao pesquisador e historiador beber de uma fonte quase que inesgotável de dados e conhecimentos.
É o que acontece ao perlustrar o testamento do conselheiro João Baptista. Ei-lo:
“Em nome de Deos – Amen.
Eu o Doutor João Baptista dos Anjos, achando-me com perfeita saúde, e no uso integral de minhas faculdades intellectuaes, mas receiando morrer, deliberei fazer o meo testamento do modo seguinte — Declaro que sou Catholico Apostolico Romano, em cuja Religião nasci, fui educado e desejo morrer. —
Declaro que fui casado em primeiras nupcias com Dona Maria Magdalena Alves Baptista e tive deste consorcio dois filhos a saber: o Doutor Antonio Baptista dos Anjos e o Doutor João Baptista dos Anjos, ambos fallecidos — Declaro que sou casado em segundas nupcias com a Senhora Dona Maria Josephina de Jesus Baptista com quem me recebi em solemne matrimonio no dia dois de Junho de mil oitocentos sessenta e seis, e tenho deste segundo consorcio dois filhos, a saber: Antonino nascido a vinte dois de Abril do dito anno de mil oitocentos sessenta e seis e baptisado a vinte quatro de Junho desse mesmo anno, e por isso um filho legitimo pelo subsequente matrimonio; e Fabricio nascido em sete de Outubro de mil oitocentos sessenta e oito, e baptisado em perigo de vida, quando nasceo, sendo minha intenção que tome os Santos Oleos no dia vinte quatro de Junho do corrente anno, se por motivo inesperado não for necessario empregar antes d’essa epocha esse Santo Sacramento.
Declaro que nomeio para meos testamenteiros em primeiro lugar a minha mulher a Senhora Dona Maria Josephina de Jesus Baptista, em segundo lugar ao meo particular amigo e compadre o Senhor Thomaz Jozé de Miranda, em terceiro logar o meo particular amigo e compadre o Senhor Doutor Sebastião Pinto de Carvalho, e em quarto logar o meo amigo o Senhor Doutor Americo de Souza Gomes, dos quaes espero que acceitem este encargo, que lhes confio como prova da minha illimitada confiança e grande amisade, e como uma obra de caridade para com a minha alma. — Declaro que nomeio para tutora de meos filhos e legitimos herdeiros Antonino e Fabricio, e de quaes quer outros que possão sobrevir de um consorcio, em primeiro lugar a minha mulher a Senhora Dona Maria Josephina de Jesus Baptista, em segundo lugar a meo particular amigo e compadre o Senhor Thomaz Jozé de Miranda, em terceiro lugar a meo particular amigo e Compadre o Senhor Doutor Sebastião Pinto de Carvalho, em quarto logar a meo amigo o Senhor Doutor Americo de Souza Gomes, na convicção de que meos filhos encontrarão em qualquer desses Senhores um Pai extremoso e desvelado — Declaro que sou contribuinte do Monte Pio dos Servidores do Estado na razão de capital de um conto e duzentos mil reis, cujas prestações são por mim pontualmente pagas. — Declaro que desejo ser sepultado, como irmão confrade que sou da Ordem Serafica do Glorioso São Francisco de Assis em uma carneira dos Religiosos na Quinta dos Lazaros, e peço que se faça o meo enterro sem luxo, mas de modo que á minha mulher e ao meo primeiro testamenteiro parecer mais conveniente. — Declaro que além de Irmão Confrade da Ordem Serafica do Patriarcha São Francisco de Assis, sou irmão das Veneraveis Ordens Terceiras do mesmo Patriarcha São Francisco e de Nossa Senhora do Monte do Carmo, da Santa Misericordia, do Senhor Bom Jesus dos Passos, do Senhor dos Martyrios da Barroquinha e do Senhor da Cruz da Palma. — Declaro que deixo de esmola ao Convento do Serafico Patriarcha São Francisco a quantia de cem mil reis, que meo testamenteiro entregará no prazo de trinta dias do meo fallecimento. — Declaro que minha mulher de accordo com o meo testamenteiro mandará dizer por minha alma as Missas que julgar convenientes — Por ultimo rogo á minha mulher, em quem muito confio que se guie nos negocios do casal sobre a educação de nossos filhos, enfim sobre qualquer negocio ou resolução, pelos conselhos de meos amigos e testamenteiros os Senhores Thomaz Jozé de Miranda, e aos Doutores Sebastião Pinto de Carvalho e Americo de Souza Gomes, a quem deverá sempre ouvir e conselhar, na certeza de que será sempre bem dirigida, por serem elles meos verdadeiros amigos e sinceramente interessados por seo bem estar e de nossos filhos. E por esta forma tenho feito e concluido este meo testamento que está por mim escripto e assignado, muito de minha livre e espontanea vontade. Bahia oito de Abril de mil oito centos sessenta e nove. João Baptista dos Anjos”. (98).
A análise destes documentos transcritos revela que, mais uma vez, o doutor Domingos Rodrigues Seixas, enganou-se ao referir-se ao primeiro filho do segundo casamento do conselheiro Baptista como Antonio, quando na realidade chamava-se Antonino.
Verifica-se, por outro lado, o assentamento confuso do nome da ilustre consorte do conselheiro Baptista no livro de registro de batizados das duas crianças: no assentamento do batizado de Antonino está consignado o nome D. Maria Josefina dos Anjos, e no registro do batizado de Fabricio lê-se D. Maria Josephina de Jesús Baptista.
De imediato, no mesmo dia em que redigiu e assinou o seu testamento, a 8 de abril de 1869, o conselheiro Baptista dos Anjos compareceu ao escritório do doutor Sebastião Pinto de Carvalho, à rua Direita do Palácio, freguesia da Sé, estando presente o tabelião Alvaro Lopes da Silva, que aprovou o testamento, perante as testemunhas conselheiro Elias José Pedrosa, doutor Cincinato Pinto da Silva, conselheiro Manoel Ladisláo Aranha Dantas, doutor Mathias Moreira Sampaio e doutor José Affonso Paraiso Moura, os quais também assinaram, junto com o testador, a aprovação do documento. (99).
Os bens do conselheiro João Baptista dos Anjos consistiam de móveis diversos, incluindo duas cadeiras de arruar com cortinas de meio carro azul, avaliadas ambas em sessenta mil reis, sendo estimados todos os móveis em novecentos e oitenta e sete mil seiscentos e quarenta reis. (100).
Bens semoventes
Escravos
“Miguel, Africano, maior de cincoenta annos, do serviço de carregador de cadeira, avaliado em trezentos mil reis...........300$000
Jeronima, crioila, de vinte e oito annos, do serviço domestico, avaliada em hum conto de reis.............................................1000$000
Paulina, parda, de idade de vinte annos, do serviço domestico e engomadeira, avaliada em hum conto e duzentos mil reis...1200$000
Elpidio, pardo, de idade de treze annos, sem officio, avaliado em hum conto de reis...........................................................1000$000
Virgilio, pardo, de idade de dez annos, sem molestia, avaliado em oitocentos mil reis............................................................800$000”
(101).
Bens de raiz
“Huma propriedade de caza terrea na rua da Conceição do Boqueirão, Freguesia de Sancto Antonio alem do Carmo, defronte da Igreja edificada em terreno foreiro ao Convento do Carmo, com vinte cinco palmos de frente, composta de entrada e duas janellas, sendo as duas frentes de paredes dobradas, e no fundo huma porta e janella, tenda a casa de cumprimento da frente da rua até o quintal sessenta e seis palmos, sendo as duas lateraes de frontal de tijollos, e proprias; a sala da frente com dezeseis palmos de largura, e vinte quatro de cumprimento com dois quartos, cuzinha que serve de sala de jantar; as devisões vão até o engradamento, a casa ladrilhada de tijollos estragados, toda telha vãn; o quintal tem cento e trinta e hum palmos de cumprimento de quarenta e vinte e oito de largura, sendo o muro do lado do norte proprio até o cumprimento de quarenta e oito palmos, e para adiante he de quem direito tiver ao do lado do Sul, que pertence a outro proprietario, a a casa precisa de muitos reparos, e á vista do seo estado avaliada em dois contos de reis.............2.000$000” (102).
Livros
“..., os livros constantes de folhas vinte e uma a folhas vinte e sete, todas na importancia de cento e oitenta e quatro mil e quatro centos reis. 184$400”
Contabilizei um total de 477 livros, guardados em duas estantes.
São livros de afamados autores tais como “Therapeutica” de Trousseau, em 2 volumes; “Syphilides” de Bazen; “Molestias dos Olhos” de Desmarres; “Compendio de Pharmacia” de Dechamps; “Electricidade Medica” de Holobech; “Chirurgia Operatoria” de Guerin; “Molestia da Pelle” de Wilson; “Hygiene” de Bequerel; “Annuario de literatura medica de 1857 a 1861” de Noirot; “Molestias do Utero” de Nonat; “Febre Typhoide” de Huss; “Molestias Articulares” de Bonnet; “Molestias Venereas” de Vidal; “Statistica Medica” de Gararret; “Estreitamentos da Uretra” de Benique; “Epedemias” de Marchal; “Exploração do Olho” de Follin; “Physica” de Bequerel; “Cataratas” de Sanson; “Cynonymus” de Lisfranc; “Medicina Forence” de Ferr.ª Borges; “Retenção de Urina” de Benique; “Medicina Legal” de Bayard; “Loucura da Mulher Pejada” de Mare; “Applicação da Ellectricidade” de Bequerel; “Pharmacologia” de Gomes; “Anatomia Discr.ª e G.al” de Tardieu e muitos outros volumes. (103.
Ferramentas
“... as ferramentas cirúrgicas, Constante a folhas vinte sete na importancia de trinta mil reis 30$000” (104).
Joias
“... as joias Constantes as folhas quinze e folhas dezesete, todas na importancia de um conto cento essenta e um mil oitocentos e noventa reis 1:161$890” (105).
Reportando-se ao extremado desvelo e carinhoso cuidado da excelentíssima consorte do conselheiro Batista dos Anjos e narrando os seus ultimos momentos, epilogando o comovente panegírico, escreve o lente Domingos Rodrigues Seixas: “Na hora do perigo, na crise tormentosa da molestia, quando a enfermidade lhe ia apagando os tremulos lampejos da luz vital, vimol-a suffocada na mais desolante dor.
No momento em que os raios da esperança despontarão, trazendo a melhora de enfermo, vimol-a então, no enthusiasmo de seu prazer, orgulhosa dessa feliz mudança”.
“Não será fora de proposito avivar o nosso quadro com a narração do que então observamos no leito do conselheiro Baptista dos Anjos, narração que mais abona os sentimentos de seo elevado coração, e de sua subida intelligencia.
Por mais de tres vezes, já quando todos os da familia consideravão-no salvo, occupou se elle exclusivamente, durante as nossas visitas, da sciencia em geral, e da medicina em particular.
Discorria sobre a etiologia das molestias epidemicas, fallava do tratamento destas, propunha medidas sanitarias, e fazia considerações sobre as classes infelizes, ceifadas pelo flagello, que elle dizia reinava, attacando a todos; e imitando a bella imaginação de Sismondi, figurava as sciencias humanas como sectores de circulos concentricos, cujo numero era infinito, e o homem collocado no centro via entre cada raio uma sciencia, e descobria o encadeamento e as relações de umas com as outras, e quanto mais a sciencia se apartava de sua vista, mais ella se estendia e se alargava.
Nesses discursos, cheios de estylo e de illustração, embora pronunciados em voz debil, notamos o desmando e a desordem cerebral; visto como, depois dessas brilhantes reflexões, dizia elle que o iodo era o agente athmospherico que estava affectando é elle e a todos, e as commissões nomeadas pelo governo aos differentes fócos epidemicos não cumprião com o seu dever, apartando essa causa!
Era o delirio do sábio! erão os ultimos lampejos do luminoso facho da medicina, que fulgurava ainda em seo espirito.
Um vulto eminente, um dos grandes convivas da terra, no dia 4 de Janeiro de 1871 tornou-se hospede da morte, e lá foi discerrar as cortinas do céo!
Dessa dolorosa passagem os hymnos da despedida inda murmurão!
“Todo sol tem seo oriente e seo ocaso, todo homem tem um berço e seu tumulo”.
Foi cumprindo essa irremissivel sentença do Creador, que João Baptista dos Anjos, doutor em Medicina, Conselheiro, Lente Jubilado da Faculdade de Medicina da Bahia, e Director da mesma, findou-se ao sopro do vento mysterioso da eternidade sobre a lampada ainda bruxuleante de uma existencia vigorosa, que já havia transposto o marco miliario dos 70 annos.
Acabou como o verdadeiro medico, impressionado pela causa da humanidade da qual fora sempre extrenuo defensor.
Ilustrando a sociedade em que viveo, gosou semore dos fóros de homem honesto e intelligente.
A classe medica respeitava suas luzes, e a Faculdade de Medicina, tributando respeito á sua idade e a seo saber; ha de sempre prestar em seo culto posthumo, uma homenagem sincera de além tumulo, que servirá de echo perenne de sua eterna saudade”.
No frontispício do seu elogio fúnebre, o ilustrado lente Domingos Rodrigues Seixas ornou a sua brilhante obra com o pensamento:
“Combien la nature est feconde
En plaisirs, ainsi qu’en douleurs!”
(Beranger)
Debruçado sobre volumosos e empoados maços de manuscritos inéditos, preciosos, corrompidos pelo perpassar implacável do tempo, em busca de um contacto mais íntimo e enternecedor com o conselheiro João Baptista dos Anjos, para fornecer achegas em derredor da sua fascinante e brilhante existência, sentia-me, de quando em vez, como se estivesse retirando o lutuoso véu de sua essa e afastando os funéreos crepes que faziam parte do sudário que envolveu, com a morte do ínclito conselheiro, a sua digníssima família e o mundo médico e científico da Bahia do século XIX.
E retirei, comovido, os últimos véus de funéreas sombras que envolviam o conselheiro João Baptista dos Anjos, no seu leito de morte, ressuscitando-o para viver na admiração da sociedade médica, cultural e científica da Bahia no ocaso do século XX.
Destarte, encontrei o assentamento do óbito do conselheiro Baptista dos Anjos e registro da ata da sessão especial da congregação da Faculdade de Medicina, a 13 de janeiro de 1871.
No livro para lançamentos dos assentamentos de óbitos da freguesia de S. Pedro Velho, nesta cidade, no período de 1865 a 1872, está exarado o óbito do conselheiro-diretor, nos seguintes termos:
“D.r J.º Bap.ta dos Anjos
Aos quatro de jan.ro do corr.te anno, falleceu de molestia int.ª, com os Sacram.tos precisos o Conselhr.º D.r João Baptista dos Anjos, br.co, nat.l da B.ª, com id.e de setenta e dous an.s, morador ao Areial de Cima, Prof.or aposentado da Eschola de Medicina desta Cap.al, casado com D.ª Maria Josephina dos Anjos; e foi encomend.º de Pluvial e Sachristan; acompanhd.º á Ordem Tercr.ª dos Revd.os Franciscanos onde foi sollenemente encomend.º e dahi a Q.ta dos Lazr.os, onde foisepultd.º.
Vigr.º Pe. Raymd.º J.e de Mattos” (106).
A última parcipação do conselheiro-diretor nas reuniões da congregação foi a 13 de outubro de 1870, quando a partir dessa data, as sessões foram conduzidas pelo vice-diretor, doutor Vicente Ferreira de Magalhães.
Nas “actas da Congregação” da Faculdade de Medicina da Bahia, período de 1865 a 1882, está lavrado o registro da sessão especial realizada a 13 de janeiro de 1871, em pesar pelo falecimento do conselheiro-diretor.
“Sessão Especial
Aos treze (13) dias do mez de Janeiro de mil oito centos e setenta e um reunida a Congregação da Faculdade composta do Cons.º Vice Director, Aranha, Sampaio, D.rs Goes, Cerqueira, Seixas, Freitas, Faria, Rodrigues, Bomfim, Gordilho, Demetrio, Luiz Alvares, Moura e Cunha, faltando em causa os D.rs Pedroza, Souto e Sodré, por dar pontos para o concurso de oppositor da secção de sciencias cirurgicas, o D.r Bomfim pela ordem pedio a palavra e apresentou o seguinte requerimento = Requeiro que a Congregação suspendendo por momentos estes seos trabalhos, estabeleça uma sessão especial em cuja acta manifeste o seo pezar pelo passamento do Cons.º D.r João Baptista dos Anjos, Director desta Faculdade e lente jubilado da cadeira de hygiene, o qual foi approvado, lavrando-se em consequencia d’elle a presente acta especial na qual a Faculdade com effeito manifesta o pezar pelo passamento do referido Cons.º. E para constar eu o D.r Thomaz d’Aquino Gaspar fiz a presente acta que assignei com o Cons.º Vice Director e outros presentes.
D.r Vicente Ferreira de Magalhães
Manoel Ladisláo Aranha Dantas
D.r Elias José Pedroza
D.r Mathias Mor.ª Sampaio
D.r A. Januario de Faria
D.r Francisco Rodrigues da Silva
D.r An.to Mariano do Bomfim
D.r Jeronymo Sodré Pereira
D.r Demetrio Cyriaco Tourinho
D.r Luiz Alvares dos Santos
D.r Salustiano Ferr. Souto
D.r Thomaz d’Aq.º Gaspar” (107).
Ao finar-se, o conselheiro João Baptista dos Anjos deixou viúva a virtuosa senhora D. Maria Josephina de Jesus Baptista e dois inocentes filhinhos: Antonino, com a idade de 5 anos e Fabricio “de 3 dittos”. (108).
O cortejo fúnebre conduzindo o corpo do distinto vulto da medicina baiana para a região dos finados na Quinta dos Lázaros, era composto de “1 carro fun.e e o cav.os, 1 carr.e a 1 d.os p.ª o Vigario e 9 carros a 4 d.os p.ª o acompanham.to”, alugados à Monteiro Carneiro & Azevedo, da “Sociedade em Commandita Vehiculos Economicos”, pagando a digna viúva pelo aluguel a importância de 350 mil réis. (109).
As despesas com as cerimônias do funeral, tais como a “salla forrada com chão e tecto”; “caixão de pano fino todo guarnecido de fitas pretas achamalotada, alças de trança tudo por dentro”; “eça de dous corpos com colluna e trez portas armadas no Convento dos Religiosos Franciscanos”; grinaldas etc., foram orçadas em quatrocentos mil e quinhentos réis. (110).
Pagou-se também a José Leandro Gama a “quantia de cecenta mil r.s proveniente da Musica q. fiz p.ª o recebim.to do seu finado Marido o Señr. Cons.º João Baptista dos Anjos”. (111).
O vigário da freguesia de São Pedro, D.r Raymundo José de Mattos recebeu a quantia de vinte e oito mil réis pelo “acompanham.to a Q.ta dos Laz.ros do finado Conselheiro D.r João Bap.ta dos Anjos, fallecido, hontem, nesta Freg.ª” (112).
Aos jornais “Jornal da Bahia” e “Diario da Bahia” pagou-se a importância de 1$500 e 1$000, respectivamente, pelos anúncios do falecimento e da missa de 7º dia. (113).
A excelentíssima senhora D. Maria Josephina de Jesus Baptista pagou pelo vestido de luto, a importância de 120$640 (cento e vinte mil seiscentos e quarenta réis), referente a compra de “33 covados d’alpaca fina; 2 pessas chita preta; 1 chale de merinó preto; 1 veo grande preto; 1 par de luvas preta; 2 apparelhos pretos de bufalo; 4 pares de argollas ord.; 1 par de botinas p.ª Snr.ª; 1 par de meias pretas; 3 chapeos p.º pretos”. (114).
A casa de residência onde faleceu o conselheiro João Baptista dos Anjos, no Areial de Cima, era de aluguel, conforme se verifica na leitura do seguinte recibo:
“Recebi da Exm.ª Snr.ª D. Maria Josephina de Jesus Baptista, viuva do finado D.or João Baptista dos Anjos aquantia de trezentos e setenta e cinco mil reis importancia do Aluguel de seis mezes da Caza que morou ao Areal de Cima, vencidos em 28 de Fevereiro pas.do Bahia 4 de Março de 1871.
p D. Maria Lina de Souza Magarão” (115).
A viúva D. Maria Josephina de Jesus Baptista assinou termo de tutoria dos menores Antonino e Fabricio, a 23 de fevereiro de 1871, no escritório do “Doutor Juis de Orphaons Manoel da Cunha Lopes Vasconcellos”, lavrado pelo “Escrivam” José Olympio Gomes de Souza, no livro, 5º pagina 139. (116).
Antonino Baptista dos Anjos, recebeu o grau de doutor em Medicina após sustentar tese perante a mesma Faculdade a 3 de dezembro de 1889, com a dissertação versando sobre o tema “Affecções cutaneas e de origem nervosa” sendo aprovada com distinção pelos lentes conselheiro José A. Paraizo de Moura, lente catedrático de Clínica Cirúrgica – 1ª cadeira, Manoel José de Araujo, lente catedrático de Fisiologia Teórica e Experimental e Alexandre E. de Castro Cerqueira, lente catedrático de Moléstias Cutâneas e Sifilíticas. (117).
Teve a sua tese publicada pela tipografia “Imprensa Economica” em 1889.
O sempre pranteado professor Eduardo de Sá Oliveira, em sua extraordinária Memória Histórica da Faculdade de Medicina da Bahia, concernente ao ano de 1942, e dada a lume em 1992, apresenta uma sinópse da biografia do ilustrado doutor Antonino Baptista dos Anjos: “Interno por concurso, da cadeira de Moléstias Cutâneas e Sifilíticas (1889); Preparador do Instituto Odontológico da Faculdade de Medicina da Bahia (1891); Professor substituto interino da 5ª Seção (1903) e efetivo, após concurso (1907); Professor de Patologia Cirúrgica (1909 a 1913); Professor ordinário da 1ª cadeira de Clínica Cirúrgica (1913 a 1915); Professor catedrático (1915 a 1920). Regeu, interinamente, a cadeira de Operações e Aparelhos, etc.
Delegado de Higiene do Estado; Médico da Penitenciária; Professor catedrático de Higiene, do Ginásio da Bahia (1915), tendo lecionado Inglês, Física e Química”. (118).
O doutor Antonino Baptista dos Anjos faleceu repentinamente ás 19 horas do dia 1º de abril de 1920, em sua residência, à rua Chile.
Contava 54 anos de idade e era casado com a senhora D. Rosa Baptista dos Anjos e deixou 5 filhos: doutor João Baptista dos Anjos e acadêmico Aloysio Baptista dos Anjos e as senhoras D. Antonina Baptista dos Anjos Casaes, cirurgiã-dentista e esposa do Sr. Arestides Casaes, D. Herminia Baptista dos Anjos Castello, esposa do doutor Waldemar W. Castello e senhorinha Durvalina Baptista dos Anjos.
Deixou, também, 7 netos.
O enterramento saiu às 16 horas, saindo o corpo para o cemitério do Campo Santo.
Era irmão da Santa Casa da Misericórdia e da Venerável Ordem Terceira de São Francisco, as quais mandaram celebrar missa e memento por sua alma no dia 4 de maio de 1920. (119).
Um dos seus filhos, o doutor João Baptista dos Anjos, médico veterinário do Serviço de Defesa Animal do Ministério da Agricultura, faleceu aos 47 anos de idade, a vinte e três de novembro de 1936, às 17 horas, em sua residência à avenida Sete de Setembro, nº 88, vítima de “colápso cardiaco, no curso de endocardite tóxica”. (120).
Um dos mais ínclitos descendentes do conselheiro-director doutor João Baptista dos Anjos é o seu bisneto Dr. Antonino Batista dos Anjos Casaes, que dignificou o município de Salvador como brilhante e zeloso vereador, de inexcedível proficiência e que tem casa de residência no bairro da Pituba, gozando os ócios de uma merecida aposentadoria, após porfiar pelo progresso da cidade do Salvador.
Ao eterno vereador Antonino Batista dos Anjos Casaes, o preito de minhas sinceras homenagens.
O vereador Antonino Batista dos Anjos Casaes é filho da excelentíssima senhora doutora Antonina Baptista dos Anjos Casaes e do senhor Arestides Casaes, aos quais é azado, neste trabalho, apresentar meus protestos de respeito e veneração às suas sagradas memórias.
Palavras do Fim
Certamente o jovem e idealista mancebo, João Baptista dos Anjos, jamais ouvira dos lábios paternos, palavras de encorajamento para levar a cabo o seu sublime desiderato: ser médico.
Decerto sem dobrar a cerviz pela mesquinhez intelectiva e idéias retrógradas de seu pai, o jovem porteiro do Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia e sacristão da catedral teria sido confortado e revigorado nas suas lides, provavelmente, pelas palavras do velho rei David, próximo a expirar, quando, ao lado do seu filho Salomão, disse-lhe: “Eis-me na barbacan da existência, na balisa da eternidade; alenta-te e sê homem: Ego ingredior viam universae terrae; confortare, et esto vir!” 1º Livro dos Reis – capítulo 2, versículo 2.
E o humilde porteiro da “Eschola” sepultou a pessoa anônima, comum, e ressuscitou plenamente em um homem egrégio e famoso entre os notáveis, imensurável entre os colossais, inexcedível entre os seus pares, respeitado no mundo da ciência médica e considerado com admiração e afeto pela sociedade baiana de antanho.
E a presente obra, incompleta, evidentemente, porém plena de achegas em derredor da existência do ilustre biografado, pretende eternizar a figura extraordinária do conselheiro diretor da Faculdade de Medicina da Bahia, doutor João Baptista dos Anjos: “Nomen ejus requiretur a generatione in generationem” “O seu nome será perpetuado passando de geração em geração” – Eclesiástico – capítulo 39, versículo 9b.
João Baptista dos Anjos, e o seu nome, não cristalizam tão-somente uma glória — estampam sobremaneira e pompeiam uma época.
O conselheiro doutor João Baptista dos Anjos é um homem épico — é um imortal.
BIBLIOGRAFIA
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Edição fac-similar – 5º volume – 1872 – 1º de de Agosto de 1871 a 31 de Julho de 1872 – N. 97 a 120.
(Fonte impressa).
2. “Gazeta Medica da Bahia – Anno V – Bahia – 15 de Outubro de 1871 – Nº 101 – Typographia de J. G. Tourinho – pp 68/70”.
Edição fac-similar – 5º volume – 1872 – 1º de Agosto de 1871 a 31 de Julho de 1872 – N. 97 a 120.
(Fonte impressa).
3. “Gazeta Medica da Bahia – Anno VI – Bahia – 30 de Setembro de 1872 – Nº 124 – Typographia de J. G. Tourinho – pp 49/50”.
Edição fac-similar – 6º volume – 1873 – 1º de Agosto de 1872 a 31 de Julho de 1873 – N. 121 a 144.
(Fonte impressa).
4. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial.
Caixa 1649 – maço nº 4046 – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia 1824/1832.
(Documentos manuscritos).
5. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Medico-Cirúrgico da Bahia – Colação de grau em formado em cirurgia – p. 57 – Memorial de Medicina da Bahia – Universidade Federal da Bahia – Acesso 04090840.
(Documentos manuscritos).
6. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador – Livro de assentamento de casamentos na freguesia de Santo Antonio Além do Carmo – 1816/1840 – pp 117/117-v.
(Documentos manuscritos).
7. Verger, Pierre. Notícias da Bahia – 1850. Editora Corrupio e Comércio Ltda. 1981 - p. 49.
(Fonte impressa).
8. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
9. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
10. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
11. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
12. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – 1º anno – p. 36/v – ibidem nº 5.
13. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – 2º anno – p. 42 – ibidem nº 5.
14. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – 3º anno – p. 45 – ibidem nº 5.
15. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Ciúrgico da Bahia – Chimica – p. 44 – ibidem nº 5.
16. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – 4º anno – p. 49-v – ibidem nº 5.
17. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – 4º anno – p. 49-v – ibidem nº 5.
18. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Pratica de operações – p. 52 – ibidem nº 5.
19. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Exame pratico de anatomia – p. 52-v – ibidem nº 5.
20. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Quarto anno de repetição – p. 53-v – ibidem nº 5.
21. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Colação de grau em formando em cirurgia – p. 57-v – ibidem nº 5.
22. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Quarto anno de repetição – p. 58 – ibidem nº 5.
23. “Termos de exames e actas – 1816/1847” – Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia – Quarto anno de repetição – p. 58-v – ibidem nº 5.
24. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
25. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
26. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
27. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
28. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 4.
29. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador – ibidem nº 6.
30. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador – Livro de assentamento de batizados na freguesia da Sé – 1829/1853 – p. 24.
31. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador – ibidem nº 30 – p. 56.
32. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – Caixa 1649 – maço nº 4046-1 – Faculdade de Medicina da Bahia 1832/1849.
(Documentos manuscritos).
33. Biblioteca Pública do Estado da Bahia.
“Diario da Bahia – volume I – nº 56 – sabbado – 16 de Julho de 1836”.
(Fonte impressa).
34. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – Maço nº 5315 – Conselho de Salubridade – 1846/1862.
(Documentos manuscritos).
35. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial 854 – Presidência da Província – Governo.
Avisos recebidos do Ministério do Império (originais) 1839/1844 – p. 22.
(Documentos manuscritos).
36. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 35 – p. 87.
37. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
38. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
39. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
40. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
41. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
42. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
43. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
44. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
45. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 32.
46. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Colonial e Provincial – Maço nº 4060.
47. Arquivo Público do Estado da Bahia.
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Avisos recebidos do Ministério da Marinha (Originais) – Documento 300 1846/1852 – p. 391.
(Documentos manuscritos).
48. Arquivo Público do Estado da Bahia.
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49. Arquivo Público do Estado da Bahia.
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(Documentos manuscritos).
50. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial 934 – Avisos recebidos do Ministério dos Negócios da Marinha 1856/1857 – p. 84.
(Documentos manuscritos).
51. Arquivo Público do Estado da Bahia.
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52. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial 937 – Presidência da Província – Governo.
Avisos recebidos do Ministério da Marinha (Originais) – 1860 – p. 18.
(Documentos manuscritos).
53. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial 1766 – Presidência da Província – Governo.
Registro de correspondência expedida. – 1855 – pp 1/3-v.
(Documentos manuscritos).
54. Arquivo Público do Estado da Bahia.
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55. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 53 – p. 56-v.
56. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – Maço nº 5361 – Presidência da Província – Série Saúde – Epidemia – 1855.
(Documentos manuscritos).
57. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 56.
58. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 56.
59. Bibliotheca da Faculdade de Medicina da Bahia.
“Relação das theses defendidas na Faculdade de Medicina da Bahia” – 1º volume – pp 23-v/24 – 24 de novembro de 1856.
(Documentos manuscritos).
60. Bibliotheca da Faculdade de Medicina da Bahia.
Ibidem nº 59 – pp 32-v/33 – 25 de novembro de 1857.
61. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador.
Livro de assentamento de óbitos na freguesia da Sé 1840/1862 – p. 342.
(Documentos manuscritos).
62. “Actas da Congregação” – Faculdade de Medicina da Bahia 1855/1865 – pp 3-v/4.
(Documentos manuscritos).
63. “Actas da Congregação” – Faculdade de Medicina da Bahia 1855/1865 – Sessão de 9 de Fevereiro de 1856 – p. 11-v.
64. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquuivo Colonial e Provincial – Caixa 1649 – maço nº 4047 – Faculdade de Medicina da Bahia 1830/1860.
(Documentos manuscritos).
65. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 64.
66. “Actas da Congregação” – Faculdade de Medicina da Bahia 1855/1865 – Sessão de 3 de Maio de 1857 – p. 4-v.
67. “Actas da Congregação”- 1855/1865 – Sessão de 7 de Março de 1858 – p. 41.
68. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 64.
(Documentos manuscritos).
69. Nascimento, Anna Amelia Vieira – Dez Freguesias da Cidade do Salvador – Fundação Cultural do Estado da Bahia – Empresa Gráfica da Bahia – 1986 – p. 47.
(Fonte impressa).
70. “Actas da Congregação” - 1855/1865 - Sessão de 3 de Novembro de 1858 – p. 48-v.
71. “Actas da Congregação” - 1855/1865 - Sessão de 9 de Novembro de 1858 – pp 49-v/50.
72. “Actas da Congregação” - 1855/1865 - Sessão de 10 de Novembro de 1858 – pp 50/50-v.
73. Britto, Antonio Carlos Nogueira – A impetuosidade dos jovens acadêmicos de medicina na Bahia do século XIX – “JORNAL DO CREMEB” – Nº 46 – Ano IX – abril de 1993 – p. 15.
(Fonte impressa).
74. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 3 de Março de 1859 – p. 54-v.
75. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 9 de Junho de 1859 – p. 65.
76. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 20 de Setembro de 1859 – p. 77-v.
77. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 30 de Setembro de 1859 – pp 77-v a 78/78-v.
(Documentos manuscritos).
78. Pedroza, Epiphanio – “VIAGEM IMPERIAL ou Narração dos Preparativos, Festejos e Felicitações que tiverão logar NA PROVINCIA DA BAHIA por occasião da visita que a mesma fiserão SS. MM. II em Outubro e Novembro do corrente anno – Bahia – Typ. e Livraria de Epiphanio Pedroza – Rua dos Capitães nº 49 – 1859” – p. 206.
Anexo ao Diário da Viagem ao Norte do Brasil – D. Pedro II – Livraria Progresso Editora – 1959.
79. D. Pedro II – Diário da Viagem ao Norte do Brasil – Livraria Progresso e Editora – 1959 – pp 44/45.
80. Ibidem nº 79 – pp 93/94.
(Fontes impressas).
81. Filho, J. Adeodato – O ensino da clínica obstétrica da Universidade da Bahia – Departamento Cultural da Reitoria da Universidade Federal da Bahia – Tipografia da Fundação Gonçalo Moniz – Salvador – Bahia – 1967.
(Fonte impressa).
82. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 17 de Março de 1860 – p. 92-v.
83. “Actas da Congregação” – 1855/1865 – Sessão de 24 de Março de 1860 – pp 94-v/95.
(Documentos manuscritos).
84. Filho, J. Adeodato – Ibidem nº 81 – p. 28.
85. Dantas, Manoel Ladisláo Aranha – “Memória histórica dos acontecimentos notáveis do anno de 1855 apresentada à Faculdade de Medicina da Bahia no dia 1º de Março de 1856 – Typographia e Livraria de E. Pedroza – Rua dos Capitães, nº 49 – Bahia – 1856 – p. 7”.
(Fonte impressa).
86. Sequeira, José de Goes – “Memória histórica dos acontecimentos relativos ao anno de 1858 apresentada a Congregação dos lentes da Faculdade de Medicina da Bahia no dia 1º de Março de 1859, em cumprimento do artigo 197 dos Estatutos – Typographia de Carlos Poggetti – Rua do Corpo Santo, nº 47 – Bahia – 1859 – pp 5, 10 e 13”.
(Fonte impressa).
87. Faria, Antonio Januario de – “Memória histórica dos principais acontecimentos da Faculdade de Medicina da Bahia durante o anno de 1859 apresentada á respectiva Congregação em cumprimento do artigo 197 dos Estatutos – Typographia do Diario – Rua das Vassouras – nº 15 – Bahia – 1860 – pp 3, 11, 12 e 13”.
(Fonte impressa).
88. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 34.
89. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – ibidem nº 34.
90. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Guia do Império da Seção de Arquivo Colonial e Provincial – Caixa 1650 – maço nº 4048 – Faculdade de Medicina da Bahia 1861/1869.
(Documentos manuscritos).
91. Bittencourt, Anna Ribeiro de Goes – Longos serões do campo – Volume 2 Infância e Juventude – Editora Nova Fronteira – Rio de Janeiro- 1992 – p. 123.
(Fonte impressa).
92. Littré, E. – Dictionnaire de Médecine, de Chirurgie, de Pharmacie, de l’art vétérinaire et des sciences qui s’y rapportent – Dix-septième édition – Paris – Librairie J.-B. Baillière et Fils – Rue Hautefeuille, 19, prés du boulevard Saint-Germain – 1893 – p. 905 (Acervo do Autor).
(Fonte impressa).
93. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Republicano – Diário da Bahia – Anno 8º - Segunda-feira – 30 de Novembro de 1863 – Nº 273.
94. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Republicano – “Diario da Bahia – Anno 8º - Segunda-feira – 23 de Novembro de 1863 – Nº 267.
(Fontes impressas).
95. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador.
Livro de assentamento de casamentos na freguesia de São Pedro Velho 1844/1910 – p. 92-v.
(Documentos manuscritos).
96. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador.
Livro de assentamento de batizados na freguesia de São Pedro Velho 1865/1872 – p. 17-v.
(Documentos manuscritos).
97. Arquivo da Cúria Arquidiocesana de Salvador.
Livro de assentamento de batizados na freguesia de São Pedro Velho 1865/1872 – p. 63/v.
98. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Judiciário.
Inventários e testamentos – Cidade do Salvador.
Testamento: 5/2156/2625/16 – Período: 1871/1871 – Número de folhas: 4.
99. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Judiciário.
Inventários e testamentos – Cidade do Salvador.
Inventários: 3/988/1457/1 – Período: 1871/1889 – Número de folhas: 596. Fls. 6/7-v.
100. Ibidem nº 99. Fls. 11-V/13-v.
101. Ibidem nº 99. Fl. 11.
102. Ibidem nº 99. Fls. 13-v/14.
103. Ibidem nº 99. Fls. 21/29-v.
104. Ibidem nº 99. Fl. 54.
105. Ibidem nº 99. Fl. 11-v.
106. Arquivo da Cúria Arquidiocesa de Salvador.
Livro de assentamento de óbitos na freguesia de São Pedro Velho 1865/1872 – p. 82-v.
107. “Actas da Congregação” - 1855/1885 – Sessão especial de 13 de Janeiro de 1871 – p. 51.
108. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 10-v.
109. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 37.
110. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 38.
111. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 39.
112. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 40.
113. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fls. 41/42.
114. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 43.
115. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 45.
116. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Ibidem nº 99 – Fl. 18.
117. “Bibliotheca da Faculdade de Medicina da Bahia
Relação das theses defendidas na Faculdade de Medicina da Bahia” – 2º volume – pp 8-v/9 – 3 de Dezembro de 1889.
(Documentos manuscritos).
118. Oliveira, Eduardo de Sá – Memória histórica da Faculdade de Medicina da Bahia concernente ao ano de 1942 – Universidade Federal da Bahia – Centro Editorial e Didático da UFBA – Gráfica Universitária – 1992 – pp 271/272.
(Fonte impressa).
119. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Republicano – O Imparcial – Anno 11 – N.º 583 – Sexta-feira – 2 de Abril de 1920.
Biblioteca Pública do Estado da Bahia.
“Diario de Noticias – Anno XLV – N.º 4877 – Sabbado – 3 de Abril de 1920”.
“Diario da Bahia – Sabbado – 10 de Maio de 1920”.
(Fonte impressa).
120. Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção de Arquivo Judiciário
Inventários e testamentos – Cidade do Salvador.
Inventário: 6/2443/2933/7 – Período: 1944/1944 – Número de folhas: 53.
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