CLEMENTINO DA ROCHA FRAGA
(CLMENTINO FRAGA)
Extraido de Clementino Fraga: Itinerário de uma vida. Livraria José Olympio Editora-
INL-MEC. Rio de Janeiro, 1980
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Nasceu em Muritiba, em 15 de setembro de 1880, sendo seus pais Clementino da Rocha Fraga e Córdula de Magalhães Fraga.
Após realizar os cursos primário e secundário, ingressou na Faculdade de Medicina da Bahia, pela qual colou o grau em Medicina, no ano de 1903.
Durante o curso secundário, foi aluno dileto de Carneiro Ribeiro, a quem deve os alicerces de sua vasta cultura literária e humanística.
Em 1904, foi Professor assistente de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Bahia. Em seguida, transferiu-se para o Rio de Janeiro, quando obteve, após brilhante concurso, o cargo de Inspetor Sanitário.
Em 1910, regressou para a Bahia e foi nomeado, depois de memorável concurso, Professor catedrático de Clínica Médica. Assim permanecendo até 1925, quando foi transferido para a Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil, no Rio de Janeiro.
Representou o Brasil no 17º Congresso Internacional de Medicina, reunido em Londres, e no Congresso Internacional de Tisiologia, realizado em Córdoba, na Argentina.
Atendendo convite do Presidente Washington Luis, chefiou, na capital do país, a campanha contra a febre amarela, doença que se manifestou, de forma preocupante, em vários estados do Brasil, especialmente no Rio de Janeiro.
Em 1930, fundou o Curso de Aperfeiçoamento em Tuberculose.
De 1937 a 1940, exerceu o cargo de Secretário Geral de Saúde, do Distrito Federal, quando se destacou de modo admirável, merecendo homenagens e elogios por parte das maiores autoridades do país.
Nesta altura Clementino Fraga já era Professor Emérito da Universidade do Brasil e da Faculdade de Medicina da Bahia.
Pertenceu a inúmeras instituições científicas e culturais do Brasil e do exterior, destacando-se, dentre elas, a Academia de Medicina de Paris, a Academia de Medicina de Buenos Aires, a Academia de Ciências de Lisboa, a Academia de Letras da Bahia, a Academia Fluminense de Letras e a Academia Brasileira de Letras.
Sua produção científica e literária é de alto valor. “Em todas as suas obras há de notar o cuidado e a atenção com que tratava os temas, fosse científico ou literário. Seu estilo era atiço, mostrando a sua intimidade com os clássicos. Foi, certamente, na mais legítima acepção da palavra, um humanista” (4).
Quanto à medicina, profissão que ele exerceu de modo verdadeiramente invejável, advertiu: “A Medicina dos nossos dias ameaça verdadeiro perigo social,carregada a culpa à conta da especialização precoce, motorizada e invasora” (1)
A respeito de Clementino Fraga, disse Loureiro de Souza: “Homem de ciência e homem de letras, foi uma das maiores figuras do seu tempo. Foi, em tudo e por tudo, um grande varão, desses que figuram na obra de Plutarco, não sendo poucos os que o consideram um sábio. E o era, na verdade” (4).
Faleceu, no Rio de Janeiro, em 8 de janeiro de 1971.
FONTES BIBLIOGRÁFICAS:
1. Benício dos Santos, Itazil. Itinerário de Ideais e Compromissos. Salvador, 1987.
2. Clementino da Rocha Fraga – Disponível em http://www.lcf.com.br/cont
udo/perfil/body_biografia.asp. Acesso em 24 de janeiro de 2009.
3. Clementino Fraga- Disponível em htp://www.academia.org.br. Acesso em
24 de janeiro de 2009.
4. Loureiro de Souza, Antônio – Baianos Ilustres. Salvador, 1973.
5. Sá Menezes, Jayme de – Palavras de Ontem e de Hoje. Salvador, 1993.
APÊNDICE I
DEPOIMENTO DE UM DISCÍPULO
(Extraído de Torres, Luís Pedreira, in Clementino Fraga, Itinerário de uma Vida.
Rio de Janeiro, 1980)
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“Clementino Fraga – como bem diz o seu “Ex- Libris” – “Suaviter in modo, Fortiter in re” – era suave nas maneiras, com a educação de um príncipe raro, solícito a mínimas atenções, inclusive e, especialmente, com os humildes, mas, duma invulgar firmeza de caráter. Com atitudes sempre definidas, impunha-se de tais e tantas maneiras ao apreço dos contemporâneos que, sobre eles, insensivelmente, exercia uma autoridade inconteste. E não era necessário muito tempo de convivência para que aquela nobre influência pessoal se estabelecesse, e se visse cercada, na maioioria das vezes, de verdadeira veneração.
Muitos ouvidas as suas palavras. Durante a minha primeira aula no Curso de Especialização em Tuberculose, no Hospital S. Sebastião do Rio de Janeiro, Mestre Fraga no decorrer da sua admirável exposição, lembrava episódios e casos clínicos, como ainda o comportamento terapêutico ministrado, cujo histórico, ao mesmo tempo que tornava a exposição ainda mais atraente e empolgante, trazia o dom de cristalizar, em suas memórias, as ocorrências e as suas nuanças, como os acertos e os erros narrados, para nunca mais esquecermos. Foi o caso clínico dum paciente que sofreu as conseqüências de orientação terapêutica condenável; após esclarecer o caminho certo a seguir, naquele episódio clínico, arrematou o assunto dizendo: o profissional que teve a infelicidade de aplicar tão desastrosa terapêutica usava um daqueles anéis caricaturais de medicina.
A aula era para algumas dezenas de médicos recém-formados, eu mesmo entre eles, o que não impedia de ali se acharem, também, ,muitos veteranos, alguns mesmo, repetidores daquele Curso, todos os anos para recolherem, com entusiasmo,ensinamentos cada vez mais renovados e brilhantes do Mestre.
Ao entrarmos para o salão onde iríamos ouvi-lo, tão ansiosamente, todos os companheiros da turma, inclusive o Quixadá Felício, do Ceará, uma das mais vigorosas inteligências, a serviço de invejável cultura, que passaram pela Faculdade de Medicina da Bahia – todos nós levávamos no dedo, o indefectível anel de esmeralda. Terminada a aula, sob aplausos, os anéis, discretamente, desapareceram de nossos dedos, inclusive o meu, escondidos que foram nos bolsos de nossos próprios paletós...
Alguém contou a passagem ao Mestre, que lamentou o “o prejuizo causdo à vaidade da juventude pela sua aula singela. Mas, uma coisa Clementino nunca soube: dois daqueles anéis , um dos quais com uma esmeralda muito rara, foram vendidos pelos próprios donos, e o dinheiro oferecido à Santa Casa de Misericórdia”.
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APÊNDICE II
DEPOIMENTO DE CÉSAR DE ARAÚJO
(Extraído de Peçanha Martins, Antônio Carlos – César de Araújo, o Médico, o Homem.
Salvador, 1994)
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“César de Araújo, ao ingressar na Faculdade de Medicina, em 1915, com menos de 17 anos de idade, já despontava nos bancos acadêmicos, como estudante caprichoso e aplicado, como demonstra o seu notável currículo escolar. Despertou, assim, a atenção do seu grande mestre, o eminente Prof. Clementino Fraga, a quem se referiu com emoção no seu discurso de agradecimento no banquete ocorrido por ocasião da sua aposentadoria: “o maior e o melhor dos meus mestres, em todos os campos, príncipe da medicina e príncipe das letras. A quem não sei mesmo o que devo porque a ele devo quase tudo do quase nada que sou na profissão”...
Quem teve como eu, a felicidade de acompanhá-lo no dia a dia da prática médica, embora nos seus derradeiros anos, visitando os pacientes internados, muitas vezes à noite, porque não dispúnhamos naquela época de emergência, pôde testemunhar o zelo sem exageros, a conduta eminentemente ética, no seu relacionamento com o paciente e sua família, a quem esclarecia sem causar drama que o supervalorizasse, o módico nos horários, levando sempre em consideração, o poder aquisitivo dos seus clientes.
Humano e generoso sem ser subserviente, discreto e humilde quando elogiado, e sóbrio em seus comentários, sem falar na sua competente e segura orientação. Relembro, com saudade e emoção, aquele convívio que me deu os ensinamentos necessários para exercer com dignidade a minha profissão. Jamais o esqueci, o que dizia Armando Sampaio Tavares: a licção damirável de como é bom...ser bom”!
Nunca em tão pouco tempo de convivência, em três anos de estudante e interno da terceira cadeira de Clínica Médica, passando depois a residente, para finalmente alcançar a honrosa indicação de ter sido o seu último assistente na Faculdade de Medicina, aprendi tanto, não apenas na área médica, mas no desejo de procurar saber mais e mais, não me desviando da leitura da fora da medicina, constituindo-se desse modo no melhor dos meus modestos títulos”
APÊNDICE III
DEPOIMENTO DE ITAZIL BENÍCIO DOS SANTOS
Extraído de Benício dos Santos, Itazil – Clementino Fraga. Sinópse Informativa. Ano II, No II. Outubro. Salvador, 1978.
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O serviço do Professor de medicina, em que ele apóia sua doutrina e os conceitos de sua lição, tão próximo dele como a própria sombra, há-de ser visto como o reflexo do homem que o encarna e personaliza, como uma extensão dele próprio, que o dirige e representa. Porque, ninguém se iluda, um Serviço, um Serviço de Medicina é um ente real, não é, apenas, o espaço físico, entre paredes, que o abriga. Um Serviço existe, sim, no sentido de que se o seu corpo é formado das condições materiais que possui, ou dos
aparelhos e dispositivos que o equipam, a sua alma é feita do seu préstimo, da sua utilidade, da sua serventia. E esta, sem dúvida alguma, quem a dá são os que lá mourejam, são os profissionais e docentes que o animam, é o chefe que o personifica e representa, nos aspectos intelectual, técnico-profissional e moral que envolve, repassados estes, enfim, de certa complacência e compassividade, para alcançar o Serviço os seus verdadeiros objetivos.
Entende-se, desse modo, que, no passado, o professor de medicina não só personificasse o seu serviço, mas, que a personalização fosse de lado a lado – princípios, doutrinas e idéias que o professor simbolizava, corporificavam-se no Serviço que ele chefiava e representava.
Assim foi o Prof. Clementino Fraga e o Serviço do Prof. Clementino Fraga, aqui ou no Rio, assim foi com o Prof. Miguel Couto e o Serviço do Prof. Miguel Couto, e tantos outros em nossa medicina, em suas respectivas épocas. Não é sem razão que a atividade docente de Clementino Fraga teve ressonância, encontrou eco entre os que à sua volta, compunham o seu Serviço, entre os jovens, desejosos de aprender, que o rodeavam. A lição do mestre continuaria, desdobrar-se-ia através da repercussão que encontrou entre contemporâneos, e alcançaria gerações futuras.
Sirva-nos o exemplo e modelo que foi o Prof. Clementino Fraga, nos dias de hoje, em que nem sempre se vive, com entusiasmo e espírito de doação, o próprio mister”
APÊNDICE IV
“PROFISSÃO E PERSONALIDADE”
(FRAGA, CLEMENTINO, in http://www.academia.org.br/cads/36/clement2.htm)
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“O médico moderno há de ser um representante da nata intelectual, formado no consenso das qualidades efetivas da apresentação e de personalidade. Não basta ser; é mister também parecer. Aliás, em nenhuma profissão a projeção individual é mais fragrante que na medicina, a considerar, como queria Nicolle que “a tendência do ser humano é defender a sua personalidade”. A própria educação médica, inspirada nas ciências biológicas, desenvolve no profissional uma segunda natureza, um tanto hipertrófica no sentido da individualização. E não há como a doença para revelar o aspecto pessoal em cada caso patológico; por outro lado a autoridade do clínico, sempre decisiva ou conselheira, socialmente, o destaca numa auréola de respeito e ascendência. Em alguns o individualismo transviado conduz ao espírito de suficiência, sobretudo sistemático em relação às normas terapêuticas. Será, talvez, o seu maior pecado. As coordenações biológicas que defendem o homem integral, na unidade do corpo e espírito, materializam o conceito da personalidade. Seria absurda a negação destas vantagens na formação intelectual e moral do médico, e neste caso, como conciliar a afirmação de individualidade com a medida rasa, niveladora, que caracteriza a medicina do Estado ? Onde a prevalência das qualidades sem os estímulos da liberdade de ação? Não se compreende a noção de responsabilidade imposta a doentes, que não elegeram o profissional nos anelos de sua confiança. E depois, pode-se admitir a despersonalização do médico no momento científico em que a medicina se orienta no sentido da personalidade do doente? Talvez tanto tivesse sido possível no domínio ditatorial das ciências analíticas; não será o Estado totalitário ou marxista, nas contingentes restrições á liberdade humana, que poderá sobrelevar às tendências científicas que noutros tempos germinaram a mentalidade antiga, qual se encontra no Diálogo sobre a Sabedoria, em que Sócrates doutrinava: “os bons médicos, quando um doente os procura para que lhes curem uma doença dos olhos, por exemplo, começam por declarar que não poderão curar somente os olhos, senão também a cabeça, e pretender curar a cabeça sem atender ao corpo inteiro é impossível. Tendo isso em conta prescrevem um regime para todo o organismo, cuidam e curam, assim, a parte em que a doença se manifesta. Porém do mesmo modo que os olhos não podem ser tratados sem a cabeça, e esta sem o corpo, também este não pode ser curado sem curar a alma, e, se os médicos gregos não são capazes de curar tais enfermidades, é que ignoram o conjunto do que devem tratar. Porém a alma, de onde brotam para todo o corpo todos os bens e males, pode ser tratada por meio de certos diálogos”.
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